Novo estudo revela história vulcânica e pistas sobre a vida antiga em Marte

Num estudo pioneiro, em coautoria com um cientista da Universidade A&M do Texas, os investigadores revelaram novos conhecimentos sobre a história geológica da cratera Jezero de Marte, o local de aterragem do rover Perseverance da NASA. As suas descobertas sugerem que o chão da cratera é composto por um conjunto diversificado de rochas vulcânicas ricas em ferro, proporcionando uma janela para o passado distante do planeta e a oportunidade mais próxima de descobrir sinais de vida antiga.
O investigador Michael Tice, que estuda geobiologia e geologia sedimentar no Texas A&M College of Arts and Sciences, faz parte de uma equipa internacional que explora a superfície de Marte. Ele e os seus co-autores publicaram as suas descobertas na revista Science Advances.
“Ao analisar estas diversas rochas vulcânicas, ganhámos conhecimentos valiosos sobre os processos que moldaram esta região de Marte”, diz Tice. “Isto aumenta a nossa compreensão da história geológica do planeta e do seu potencial para ter suportado vida”, acrescenta.
Tice e os seus co-autores analisaram as formações rochosas no interior da cratera para melhor compreender a história vulcânica e hidrológica de Marte. A equipa utilizou o Planetary Instrument for X-ray Lithochemistry (PIXL), um espetrómetro avançado, para analisar a composição química e as texturas das rochas da formação Máaz, uma área geológica chave na cratera Jezero. As capacidades de raios X de alta resolução do PIXL permitem um pormenor sem precedentes no estudo dos elementos das rochas.
Tice salientou a importância da tecnologia para revolucionar a exploração marciana. “Todos os rovers que já foram a Marte foram uma maravilha tecnológica, mas esta é a primeira vez que conseguimos analisar rochas com uma resolução tão elevada utilizando a fluorescência de raios X. Isto mudou completamente a forma como pensamos sobre a história das rochas em Marte”, afirma.
Desvendar os segredos de Marte com tecnologia inigualável
O Perseverance, o explorador robótico mais avançado da NASA, aterrou na cratera Jezero a 18 de fevereiro de 2021, no âmbito da missão Mars 2020, em busca de sinais de vida microbiana antiga no Planeta Vermelho. O rover está a recolher amostras de rocha marciana e regolito (rocha e solo partidos) para possível análise futura na Terra.
Entretanto, cientistas como Tice estão a usar as ferramentas de alta tecnologia do rover para analisar as rochas marcianas e determinar a sua composição química e detetar compostos que possam ser sinais de vida passada. O rover tem também um sistema de câmaras de alta resolução que fornece imagens detalhadas da textura e das estruturas das rochas. Mas Tice diz que a tecnologia é tão avançada em comparação com a dos rovers anteriores da NASA que estão a recolher novas informações a níveis sem precedentes.
“Não estamos apenas a ver imagens – estamos a obter dados químicos detalhados, composições minerais e até texturas microscópicas”, sublinha Tice explicando que “é como ter um laboratório móvel noutro planeta”.
O que revelam as rochas
A análise da equipa revelou dois tipos distintos de rochas vulcânicas. O primeiro tipo, de tom escuro e rico em ferro e magnésio, contém minerais entrelaçados, como piroxénio e feldspato plagioclásio, com indícios de olivina alterada. O segundo tipo, uma rocha de tom mais claro classificada como traquito-andesito, inclui cristais de plagioclásio numa massa de solo rica em potássio. Estas descobertas indicam uma história vulcânica complexa envolvendo múltiplos fluxos de lava com composições variadas.
Para determinar a forma como estas rochas se formaram, os investigadores efetuaram uma modelação termodinâmica – um método que simula as condições em que os minerais solidificaram. Os seus resultados sugerem que as composições únicas resultaram de uma cristalização fracionada de alto grau, um processo em que diferentes minerais se separam da rocha fundida à medida que esta arrefece. Também encontraram sinais de que a lava pode ter-se misturado com material rico em ferro da crosta de Marte, alterando ainda mais a composição das rochas.
“Os processos que vemos aqui – cristalização fracionada e assimilação da crosta – ocorrem em sistemas vulcânicos ativos na Terra”, diz Tice. “Isto sugere que esta parte de Marte pode ter tido uma atividade vulcânica prolongada, o que por sua vez poderia ter fornecido uma fonte sustentada de diferentes compostos usados pela vida”, adianta.
Esta descoberta é crucial para compreender a potencial habitabilidade de Marte. Se Marte teve um sistema vulcânico ativo durante um longo período de tempo, poderá ter mantido condições adequadas à vida durante longos períodos do início da história de Marte.
“Selecionámos cuidadosamente estas rochas porque contêm pistas sobre os ambientes passados de Marte”, explica Tice. “Quando as trouxermos de volta à Terra e as pudermos analisar com instrumentos de laboratório, poderemos fazer perguntas muito mais detalhadas sobre a sua história e potenciais assinaturas biológicas”, acrescenta.
A missão Mars Sample Return, um esforço de colaboração entre a NASA e a Agência Espacial Europeia, tem como objetivo trazer as amostras de volta na próxima década. Uma vez na Terra, os cientistas terão acesso a técnicas laboratoriais mais avançadas para as analisar com mais pormenor.
Tice diz que, dado o espantoso nível de tecnologia do Perseverance, mais descobertas estão para vir. “Alguns dos trabalhos mais interessantes ainda estão à nossa frente. Este estudo é apenas o início. Estamos a ver coisas que nunca esperámos e penso que nos próximos anos vamos poder aperfeiçoar a nossa compreensão da história geológica de Marte de formas que nunca imaginámos”, conclui.