Novo pavimento da A1 feito a partir de pneus usados de camiões
Se este Verão passou no sublanço da A1 entre Vila Franca de Xira e o Carregado, às portas de Lisboa, reparou certamente nas obras de beneficiação que decorriam. Estas obras, avaliadas em €3,2 milhões, não são uma mera manutenção rodoviária: elas representam uma das inovações sustentáveis mais em voga na reparação de pavimentos, através da inclusão, na sua composição, de pneus usados.
Sim, isso mesmo. Quando circular entre Vila Franca e o Carregado, a partir de agora, olhe bem para o piso: ele contribui para uma maior redução dos níveis do ruído, em relação ao anterior, dá-lhe uma maior segurança ao nível da condução automóvel e ficará em bom estado durante maior tempo.
“Embora apresente menores condicionamentos logísticos e temporais, [este piso assegura] uma maior segurança e durabilidade”, explicou ao Green Savers Conceição Magalhães, responsável de investimentos da Brisa Concessão Rodoviária, que assegurou a obra.
Esta utilização do betume modificado com borracha – tendo por base a reciclagem de pneus usados – não é nova em Portugal. A Brisa já tinha colocado o betume na A5 e na CREL, mas é a primeira vez que ele chega à principal auto-estrada portuguesa.
Segundo a Brisa, os pneus usados no pavimento são provenientes, sobretudo, de veículos pesados. Infelizmente, os veículos de origem portuguesa estão em minoria. “Recorremos a Espanha face à insuficiente quantidade disponível no mercado nacional”, explica Conceição Magalhães.
No piso da A5 e CREL, as misturas betuminosas aplicadas nas camadas de degaste dos pavimentos foram rugosas e abertas, fabricadas em central e cujo ligante foi um betume modificado com alta percentagem de borracha (BBA). Para o fabrico deste tipo de betumes utilizaram-se percentagens de granulado de borracha da ordem dos 19%, relativamente à massa total de ligante, tendo-se adoptado, no fabrico daquelas misturas, percentagens de betume da ordem dos 9 %.
Segundo a Brsisa, a diferença principal entre estas misturas residiu nos respectivos fusos granulométricos dos agregados, que apresentam contributos distintos no que respeita ao ruído. Por exibirem, ambas, elevadas percentagens de betume modificado com borracha, apresentam elevada resistência à fadiga (propagação de fendas), maior resistência ao envelhecimento e às deformações permanentes.
Assim, e em termos de processo de fabrico, estes betumes foram modificados por via “húmida”, ou seja, em central. Por seu lado, a empreitada na A1, recentemente concluída, utilizou um betume modificado com média percentagem de borracha ou seja, 10 a 15% de granulado de borracha, proveniente de refinaria.
Poupança ainda é incógnita
Com um investimento anual em manutenção na ordem dos €50 milhões, este investimento pode levar a Brisa a uma poupança, a médio e longo prazo, na beneficiação do piso das auto-estradas.
De acordo com a empresa, a borracha não possui ainda histórico suficiente para este tipo de pavimentos, pelo que será prematuro falar em números sobre poupança. Ainda assim, e segundo a bibliografia estrangeira, a sua maior resistência ao envelhecimento, deformações permanentes e ao fendilhamento por fadiga, conjugado com a sua menor sensibilidade à água, traduz-se num “acréscimo de durabilidade bastante superior às outras misturas betuminosas convencionais”. Será o comportamento exibido por estas misturas, a médio e longo prazo, que irá determinar as prováveis poupanças.
O futuro dos pavimentos rodoviários é verde
Conceição Magalhães identifica a Dinamarca, Reino Unido, Alemanha, Finlândia, Suécia e os Estados Unidos como líderes no desenvolvimento de inovações para os pavimentos rodoviários. Mas a evolução sente-se a cada dia que passa.
“Existe sempre uma procura de novos produtos que permitam melhorar o desempenho das misturas betuminosas, quanto à sua durabilidade mas também à sua sustentabilidade ambiental”, explica a responsável.
Há já vários trabalhos sobre o desenvolvimento de misturas betuminosas temperadas, as quais, de acordo com a bibliografia estrangeira, são responsáveis pela diminuição do consumo de combustíveis e pela redução das emissões de gases com efeitos de estufa.
Recentemente, por outro lado, desenvolveram-se diversas tecnologias para redução da temperatura de produção e aplicação em obra das misturas betuminosas existentes, que promoveram a produção de misturas betuminosas temperadas (MBT). “Os inúmeros benefícios obtidos na utilização das MBT têm potenciado o seu crescente desenvolvimento, destacando-se a redução das emissões de gases e da energia utilizada no seu fabrico, a redução do combustível gasto no aquecimento dos agregados nos queimadores, assim como na redução das emissões durante a produção e transporte”, avança Conceição Magalhães.
Na aplicação em obra, as MBT garantem um aumento da trabalhabilidade da mistura durante a sua aplicação e compactação, resultante das suas menores temperaturas de fabrico. Isto reduz a produção de fumos, possibilitando o transporte a longas distâncias e alargando a época de pavimentação.
Mas é na saúde e segurança dos trabalhadores que estas misturas assume uma “primordial importância”. “[Elas] propiciam reduções entre 30 a 50% à exposição aos fumos e compostos hidrocarbonados, por parte dos trabalhadores das centrais betuminosas e das equipas de pavimentação”, avança a responsável da Brisa.
A redução das emissões de gases nocivos para a atmosfera poderá permitir que as centrais de produção de misturas betuminosas se situem em áreas comuns, sem quaisquer restrições a nível ambiental.
Existe ainda uma vantagem adicional na utilização destas misturas, traduzida por um menor envelhecimento do ligante. Esta mais valia resulta, na prática, em mudanças do desempenho estrutural da mistura betuminosa, tais como a redução da sua susceptibilidade ao fendilhamento térmico e estrutural. No entanto, pelo mesmo motivo a resistência à deformação permanente também pode diminuir.
“A produção de misturas betuminosas temperadas permitirá também aos construtores dos países que ratificaram o protocolo de Quioto contribuírem para o seu cumprimento, uma vez que as empresas deverão desenvolver tecnologias inovadoras que permitam a produção de misturas betuminosas mais ecológicas, actualmente à disposição, e que possam contribuir para a protecção do meio ambiente”, conclui Conceição Magalhães