O destruir de um mito: “Os pesticidas não garantem a segurança alimentar, são tóxicos para a saúde e para o ambiente”



A questão paira no ar há já vários anos: serão os pesticidas de facto seguros para a segurança alimentar? Trarão benefícios, ou pelo contrário, são bombas relógios tóxicas para a nossa saúde e ambiente? A resposta foi dada ontem pelo relator especial da ONU para o direito à alimentação e vem destruir o mito de que os pesticidas garantem a segurança alimentar do que comemos.

O relatório apresentado ontem no Conselho das Nações Unidas para os Direitos Humanos expõe os diferentes problemas relacionados com os pesticidas. Segundo o relator, os pesticidas são ineficazes para garantir a segurança alimentar, são tóxicos para a saúde humana e para o meio ambiente. Fazem igualmente parte de um modelo de agricultura que está desactualizado e apenas beneficia as multinacionais e a indústria, enquanto os agricultores da UE lutam para sobreviver.

Como explicar então a perpetuação deste modelo de produção alimentar? Para os responsáveis deste relatório a resposta é apenas uma: questões políticas. A associação ambientalista Quercus partilha desta ideia, alertando que a indústria dos pesticidas gasta milhões de euros a fazer lobby para a manutenção dos seus produtos tóxicos no mercado. “Muitas vezes, esta indústria apresenta informações falsas aos decisores políticos, assusta as pessoas com números alarmantes, como o de 85% de perdas se não usarem pesticidas e insiste em realçar o argumento do “medo da fome””, alerta a associação.

Nos últimos anos, cientistas independentes deixaram poucas dúvidas sobre a utilidade dos pesticidas para a humanidade. Segundo dados partilhados em comunicado pela Quercus, a diferença de rendimento entre a agricultura convencional e a agricultura biológica é de apenas 8 ou 9%, comparada com os mais de 30% do desperdício anual de alimentos. Além disso, verificou-se que o custo das externalidades ultrapassa os benefícios que os pesticidas possam implicar. A juntar a esta informação, surgem dados lançados recentemente por cientistas franceses do INRA (International Natural Rubber Agreement) que estimam que, sem introduzir alterações no sistema de cultivo, os agricultores franceses podem já reduzir em 30% o uso de pesticidas, sem qualquer perda de rendimento.

As reacções ao relatório das Nações Unidas não se fizeram esperar. Martin Dermine, da PAN Europe afirma que “os pesticidas servem para aumentar os lucros das multinacionais e para manter os nossos agricultores prisioneiros de um sistema altamente poluente que produz alimentos de baixa qualidade e intoxica os operadores, as pessoas que se encontrem nas proximidades, os consumidores e o ambiente”. Mas há mais. “Os pesticidas são apresentados como revolucionários e depois são banidos devido à sua toxicidade (…) Entretanto, os cidadãos da UE são diariamente expostos a estes químicos”, declarações partilhadas e defendidas igualmente pela Quercus.

A face mais visível e mediata do impacto dos pesticidas surge sob o nome de glifosato. Em 2015, a Agência Internacional de Investigação do Cancro classificou o glifosato como um potencial cancerígeno, tendo em conta a toxicidade do produto completo, incluindo coformulantes (Roundup). No mesmo ano, no entanto, a autoridade europeia para a segurança alimentar, ao avaliar apenas o ingrediente activo (glifosato), concluiu que a substância era segura. Como explicar então esta contradição?

Para esta agência ambiental portuguesa, a divulgação do relatório das Nações Unidas surge na altura certa, já que para os próximos tempos tem agendada várias acções de sensibilização, principalmente junto das autarquias, para a redução de uso de pesticidas e o abandono de herbicidas, nomeadamente com glifosato.

De relembrar que a Quercus juntou-se há pouco tempo a dezenas de organizações não governamentais de toda a União Europeia na divulgação de uma petição para banir o herbicida glifosato.

Foto: via Creative Commons 





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