Opinião, Cristina Santos Silva: “Entre o rural e o urbano”



“GOSTO DO CAMPO! GOSTO MESMO do campo a sério, do mundo rural, da província, da agricultura, dos camponeses, ou seja, não estou a falar de um resort ecológico no Alentejo (de que também gosto, é claro), mas da terra, das árvores, das montanhas, dos rios, das casas de pedra, das vacas, das ovelhas e dos burros. Gosto das aldeias recônditas do nosso país, quase desertas e de encontrar velhotes, quase com 100 anos, com quem invariavelmente acabo por falar, a tentar desvendar o passado do que foi aquele lugar…

Para este meu gosto deve ter contribuído o facto de ter raízes no campo e ter na minha árvore genealógica vários parentes que passaram a sua vida no mundo rural, o que teve como consequência que parte das minhas férias da infância tivessem sido passadas nesse campo agora tão distante! Mas este meu gosto vai para além dessas memórias e desse imaginário rural infantil, pois sinto-me bem em qualquer paisagem rural e ainda me lembro do quanto fiquei comovida aos vinte e poucos anos quando, na ilha Terceira, nos Açores, vi o verde dos vales cultivados e a força daquela paisagem rural.

Preciso, de tempos a tempos, de me enfiar na estrada, avançar para Norte e sentir a emoção de estar a caminhar para um território conhecido, familiar: o verde das árvores, as pedras na terra, as montanhas, os rios… Lentamente, começo a sentir-me em paz e a achar que finalmente estou em casa.

Não tenho ilusões sobre o que é a vida no campo pois, felizmente, tenho ainda muitos familiares na província que me permitem ter sempre presentes as dificuldades dessa vida de futuro incerto, principalmente para quem não teve oportunidade de aceder a um nível de vida mais favorecido e se manteve ligado a uma agricultura de subsistência e a períodos de imigração mais ou menos prolongados. Mais uma vez a educação é a principal arma para se conseguir qualidade de vida, quer seja no campo ou cidade, e o investimento tem sido sempre menor nas áreas rurais do país. Já para não falar noutros tipos de investimento…

Mesmo assim, acho que é possível viver bem no campo e ter uma qualidade de vida muito superior à que se tem nas cidades. Acho que podemos testar outros modos de vida, menos dependentes do consumo e das necessidades criadas pela vida urbana e ainda assim viver com o conforto a que estamos habituados em meio urbano. No fundo, acho que se pode levar uma vida muito mais sustentável, mais baseada em energias alternativas, em produtos biológicos, com maior prática ecológica e com grande respeito pela natureza…

Mas então porque é que não me mudo? Porque é que não vou viver para o campo? Porque me encontro numa encruzilhada entre o rural e o urbano! Porque também gosto das cidades, das suas zonas históricas, da arquitectura moderna das zonas novas, da inovação tecnológica, de lugares trendy e fashion, de museus de arte, de design, de casas clean, de restaurantes internacionais, enfim de coisas bonitas criadas pelo homem com a sua criatividade!

Por isso vou confessar-vos um segredo: acho que o que eu gosto mesmo é da beleza, de poder contemplar o belo em todas as suas formas, independentemente de ter sido o homem ou a natureza a criá-lo!”

Cristina Santos Silva

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Foto: Vilarinho de Samardã, Vila Real





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