Os genes abrem uma janela para o passado

A análise genética de ponta produziu provas de que ocorreram mudanças profundas nas comunidades de peixes de recife há cerca de 20 milhões de anos, reformulando a nossa compreensão da evolução dos recifes de coral.
O Professor Associado da Universidade James Cook e Cientista Principal e Curador da Biodiversidade Marinha do Museu de Queensland, Peter Cowman, foi um dos co-autores do estudo. Segundo o investigador, a diversidade marinha – a variedade de vida num oceano – está desproporcionadamente concentrada nos recifes de coral, o que torna fundamental a compreensão das suas origens.
“Investigar as origens desta diversidade excecional é crucial para prever a forma como os recifes responderão às perturbações atuais e futuras”, afirma Cowman.
Os cientistas utilizaram um conjunto de dados à escala do genoma para reconstruir a história evolutiva de alguns peixes. O estudo, publicado na revista Science Advances, fornece a árvore evolutiva mais detalhada deste grupo de peixes até à data.
“A família Labridae é um dos grupos de peixes marinhos vivos mais ricos em espécies e ecologicamente diversos e um componente importante da diversidade de vertebrados dos recifes”, afirma Cowman.
“Os seus papéis funcionais são extremamente importantes para a saúde dos recifes”, acrescenta.
“Um dos principais pontos fortes deste trabalho é a amplitude da nossa amostragem. Ao incluirmos quase 60% de todas as espécies de labrídeos conhecidas, conseguimos obter uma imagem muito mais completa da história evolutiva da família do que em estudos anteriores”, sublinha Cowman.
“Esta filogenia detalhada permite-nos explorar o momento das principais inovações neste grupo, como a evolução de estratégias de alimentação especializadas”, acrescenta.
O autor principal, Chase Brownstein, candidato a doutoramento no Departamento de Ecologia e Biologia Evolutiva da Universidade de Yale, explica que os conjuntos de dados à escala do genoma têm o poder de revelar segredos sobre os principais acontecimentos na evolução das linhagens de organismos vivos.
“Neste caso, utilizámos um conjunto de dados maciço de mais de 400 espécies para mostrar que os peixes sofreram uma explosão notável de diversificação com início há cerca de 20 milhões de anos, durante o Mioceno inicial”, diz Brownstein.
O Professor Thomas Near, da Universidade de Yale, coautor sénior do estudo, acrescena: “Estas descobertas reveem a nossa compreensão da cronologia da evolução dos peixes de recife. O Miocénico inicial parece ter sido um período crucial, com uma explosão de diversificação em várias linhagens de peixes de recife”.
Os investigadores ainda não têm a certeza da razão exata subjacente à explosão da diversidade, mas o estudo sugere que esta esteve ligada a grandes alterações ecológicas nos recifes. Alguns pensam que poderá estar ligada à tectónica de placas que alterou a disponibilidade e a configuração dos habitats marinhos e ao desenvolvimento do hotspot de biodiversidade do Indo-Pacífico após sucessivas colisões continentais.
Segundo Cowman, a compreensão da história evolutiva permite-nos apreciar as ligações intrincadas entre a diversidade dos peixes e a saúde dos recifes.
“A importância ecológica dos Labridae não pode ser exagerada. Contribuem para processos essenciais como a herbivoria, a predação, a simbiose de limpeza e a bioerosão, todos eles vitais para a resiliência e o funcionamento dos ecossistemas dos recifes de coral”, sublinha.
“A conservação destes peixes notáveis é crucial para salvaguardar o futuro dos recifes de coral”, conclui Cowman.