Pekka Saranpää: “Os países europeus deveriam aumentar o valor dos produtos florestais”



O chairman do próximo congresso da Divisão 5 da IUFRO (International Union of Forest Research Organizations), que se vai realizar entre 8 e 13 de Julho de 2012, no Estoril, explicou ao Green Savers a importância do sector florestal para o futuro do bem-estar mundial.

Num exclusivo Green Savers, Pekka Saranpää alertou para os principais desafios do sector florestal no curto prazo – aumento da população, o perigo da desflorestação e a cada vez maior procura da madeira para bioenergia – elogiou a inovação portuguesa na área da cortiça mas deixou um conselho para o sector florestal português: “Infelizmente, a comunidade internacional não conhece outra indústria florestal ou de construção em madeira” portuguesa.

Leia também a entrevista exclusiva do Green Savers a Helena Pereira, responsável portuguesa pelo congresso.

A conferência da Divisão 5 da IUFRO realiza-se em Julho, no Estoril. Que expectativas tem para o evento?

A colaboração internacional é muito importante para a IUFRO, e as conferências da Divisão 5 são organizadas para promover a ciência e pesquisa no campo dos produtos florestais. Acreditamos que será a maior reunião da Divisão 5 de sempre.

Porque escolheram Portugal?
As duas últimas conferências da Divisão 5 foram organizadas na Nova Zelândia e Taiwan, e desta vez quisemos dar uma oportunidade para os cientistas da Europa e países vizinhos inscreverem-se na iniciativa. Portugal e Estoril têm excelentes condições logísticas para organizar a conferência.

Por outro lado, a pegada ambiental das conferências internacionais está a ganhar cada vez mais atenção mundial, e esta conferência irá tentar reduzir o impacto ambiental directo e encorajar as pessoas a tomarem decisões responsáveis.

O Centro de Congressos do Estoril já recebeu a certificação da Green Globe International, um programa que reconhece o compromisso da União Europeia em atingir os mais altos standards ambientais no mundo. O edifício é também um excelente exemplo da utilização da madeira na construção.

O que pode dizer-nos da indústria de produtos florestais portuguesa? Como nos vêm aí fora?

Portugal é reconhecido pelos vários produtos de cortiça e pela inovação e pesquisa relacionada com a cortiça. Infelizmente, a comunidade internacional não conhece outra indústria florestal ou de construção em madeira portuguesa. Esta conferência será uma excelente oportunidade para as indústrias florestais portuguesas se apresentarem.

Em Portugal, a indústria florestal é olhada como um dos mais importantes sectores da economia portuguesa. Mas, quando vemos a estratégia social, económica e ambiental dos sucessivos Governos portugueses, sentimos sempre que não foi feito o suficiente para a sua promoção. Na sua opinião, porque razão os Governos, em vários países, simplesmente ignoram esta indústria?

Acho que os decisores estão a olhar cada vez mais para a indústria florestal. As florestas e os produtos florestais estão ligados à mudança global, mitigação do carbono e bioenergia, que são assuntos políticos muito importantes. A IUFRO, como entidade internacional, também vê a indústria da floresta como um grande contribuidor para o bem-estar global – não apenas na madeira mas também em produtos não relacionados com a floresta, fulcrais em muitos países em desenvolvimento e na protecção ambiental.

Quais os principais problemas que a indústria florestal mundial enfrentará nos próximos cinco a dez anos?

O aumento da população, o perigo da desflorestação e a cada vez maior procura da madeira para bioenergia são os principais desafios. Estima-se que cerca de 18% das emissões globais de gases com efeito de estufa estão relacionadas com a destruição de recursos florestais. A competição pelos preços será mais difícil e os países desenvolvidos da Europa deveriam aumentar o valor dos produtos florestais, dos serviços e criar novos e inovadores produtos, para manter os trabalhos no sector. A pesquisa irá, esperamos, ajudar a resolver os problemas.

E quais os principais desafios?

O sector de produtos florestais da Europa – e globalmente – oferece à sociedade uma vasta variedade de produtos e serviços, desde o papel, embalagens, lenços, mobília e materiais de construção feitos a partir de madeira sólida e painéis baseados em madeira, fibras têxteis, biocombustíveis, bioenergia e químicos específicos.

Hoje, este sector contribui com 8% para o total de valor de fabrico acrescentado da União Europeia (EU) e a gestão sustentável da floresta cobre 35% da massa territorial da UE. Também proporciona rendimento para 16 milhões de detentores de floresta e é responsável por entre três a quatro milhões de empregos industriais nas áreas do transporte, maquinaria, construção, químicos e energia. O principal desafio é manter o sector competitivo e a utilização sustentável das florestas. A pesquisa e educação é muito importante para alcançar estes desafios.

O que acha das empresas portuguesas ligadas à indústria das florestas?

O principal desafio para a indústria florestal portuguesa é [gerir] os recursos de madeira. A gestão sustentável das florestas, plantações e prevenção dos fogos florestais é importante para melhorar uma indústria baseada na floresta e produção de madeira. A pesquisa e a educação têm um papel importante.

A bioenegia será um dos temas da conferência. O que nos pode dizer dela?

A IUFRO tem uma task force relacionada com a bioenergia da floresta. O principal objectivo desta task force é sintetizar e disseminar o conhecimento state-of-the-art e aumentar o diálogo entre os cientistas, empresas e outros stakeholders. Há um crescente interesse na utilização da biomassa florestal como energia (calor, energia e combustíveis) e produtos baseados no biológico.

A madeira é um recurso abundante e sustentável, que pode ajudar a criar um futuro energético mais estável. As florestas proporcionam produtos, serviços e valores: madeira, empregos, negócio e rendimento; qualidade da água e ar, abastecimento de água, habitat selvagem; oportunidades de lazer.

Os desafios existem nas tecnologias em desenvolvimento e nos processos que podem reduzir os custos e aumentar a eficiência da produção energética. Mas volto a frisar: a pesquisa e a educação são importantes.

Acredita que a utilização da madeira no sector da construção vai aumentar no curto prazo? Porquê?

A madeira é um material de construção ecológico e energeticamente eficiente. E tem muitas propriedades superiores: é leve mas resistente. É também um bom material para o isolamento.

A vasta gama de variedades de madeira torna possível utilizá-la para diversos fins, com simplicidade, elegância e intemporalidade. A construção em madeira respeita o ambiente, e por isso a indústria está a promover a madeira como um material de construção sustentável, estabelecendo um novo quadro europeu para a utilização da madeira para o desenvolvimento do mercado, para soluções de engenharia e arquitectónicas de qualidade.

A IUFRO tem nove divisões. Porque razão há tantas áreas e divisões dentro de uma entidade que, no fim de contas, quer promover a floresta?

A principal função de cada divisão é ajudar os pesquisadores no seu trabalho colaborativo e dar uma linha organizacional entre cada grupo de pesquisa e os respectivos grupos de trabalho. As nove divisões estão divididas entre Ciências Naturais e Ciências Sociais. Isto já demonstra muitas diferenças em relação a uma atitude perante a floresta.

Não estamos a falar apenas de gerir uma floresta ou a madeira, mas também de aspectos relacionados com as múltiplas utilizações da floreta e a relação entre estas e a saúde humana.

É verdade que a estrutura da IUFRO não é muito visível ou flexível, mas estas divisões serão muito importantes no futuro.

A divisão 5 da IUFRO apenas se encontra de cinco em cinco anos. Não é um período temporal excessivo entre cada conferência?

Cinco anos pode parecer muito tempo, mas a IUFRO tem também, a cada cinco anos, um congresso mundial, em que todas as divisões estão representadas. A divisão 5 está também envolvida noutras reuniões relacionadas com os produtos florestais e a ciência das floretas.

A internet tornou o contacto com outros cientistas e a partilha de informação mais fácil, mas o contacto pessoal continua a ser importante. A IUFRO promove a cooperação internacional e mantém o financiamento ao Programa de Assistência a Cientistas e o Programa para Jovens Cientistas, especialmente para participantes que vêm de países em desenvolvimento.

Irá coordenar um grupo de pesquisa na qualidade da madeira. Qual será a sua função neste grupo?
O coordenador é responsável pelo networking no grupo. Cada divisão da IUFRO está dividida em Grupos de Pesquisa (GP) e Grupos de Trabalho (GT). Todas as unidades são lideradas por um coordenador, assistido por um coordenador adjunto. A comunicação entre estas pessoas é crucial e permite à divisão funcionar na perfeição. Os workhsops e conferências representam muito trabalho voluntário para o coordenador, que tem de organizar a sessão técnica, convidar os oradores e membros da mesa.





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