Poderão os animais evoluir suficientemente depressa para lidar com os grandes fogos?

Numa análise publicada na revista Trends in Ecology & Evolution a 19 de julho, uma equipa multidisciplinar de especialistas em ecologia sugere que “podemos tentar aproveitar as formas como o fogo afeta os animais para proteger as espécies vulneráveis – trabalhando com a evolução em vez de contra ela”.

Em resposta às alterações climáticas e às mudanças no uso do solo, os regimes de incêndio – ou as características típicas do fogo num determinado local, incluindo a gravidade, dimensão, forma e frequência – estão a mudar rapidamente. “Cada centímetro de terra terrestre contendo vegetação e uma fonte de ignição tem um regime de fogo associado e, em muitos ecossistemas, o fogo é o principal agente de mudança da paisagem”, diz o autor principal Gavin Jones, um ecologista do Serviço Florestal do USDA, citado em comunicado divulgado no site “Scimex”.

Como resultado, escrevem os autores, os padrões de vegetação estão a mudar, os habitats estão a transformar-se e as espécies estão a enfrentar “eventos de mortalidade e dispersão em grande escala”, o que significa que os incêndios “estão a matar um grande número de indivíduos de cada vez e a levar os animais para novas regiões, por vezes separando os membros de uma população em grupos diferentes”.

Embora a investigação no terreno mostre muitos exemplos de evolução animal provocada pelos fogos que já ocorreram, a evolução animal em resposta ao fogo é geralmente menos bem compreendida do que a evolução sofrida pelas plantas. Jones e a sua equipa questionaram-se sobre o que se poderia aprender com a compilação do que sabemos sobre o impacto dos incêndios nos animais.

Para o descobrir, os autores analisaram cerca de 100 artigos para identificar exemplos de evolução animal em resposta ao fogo – e para analisar e categorizar as diferentes formas em que esta evolução pode ocorrer.

“Existe uma gama incrivelmente vasta de adaptações dos animais ao fogo. A evolução está a acontecer – e continuará a acontecer – mesmo à frente dos nossos olhos”, explica Jones. “Um dos meus exemplos preferidos é o dos escaravelhos, que desenvolveram fossas sensoriais de infravermelhos que lhes permitem detetar incêndios florestais e adotar comportamentos reprodutivos em segurança perto de incêndios ativos”, acrescenta.

Lagartixa australiana esconde-se nas árvores para escapar aos incêndios

Para além dos escaravelhos, Jones e os seus colegas também referem várias outras alterações observadas nas espécies em resposta ao fogo, que variam “substancialmente”. A lagartixa australiana, por exemplo, esconde-se nas árvores para escapar aos incêndios, o que é uma adaptação comportamental. Outras espécies, como um pássaro chamado Temminck’s courser, que põe ovos da cor do solo recentemente queimado, evoluíram “alterando as suas características biológicas básicas”.

“Diverti-me imenso a rever a literatura sobre as adaptações dos animais ao fogo e fiquei surpreendido e entusiasmado por ver a profundidade dessa literatura”, afirma Jones.

Para os autores, compreender a variação na forma como as espécies animais estão a evoluir é importante, porque “permitirá esforços de conservação mais eficazes”. Por exemplo, em alguns casos, a introdução artificial de fogo num ecossistema “pode ajudar a tornar as espécies mais resistentes”.

Num caso citado pelos autores, os conservacionistas estão a considerar a possibilidade de utilizar o fogo para ajudar populações separadas da borboleta azul de Boisduval no Parque Nacional de Yosemite, na Califórnia, a ficarem mais ligadas geneticamente, o que lhes poderia permitir reproduzir-se melhor e aumentar o número da sua população. Embora intervenções como estas possam ser eficazes para algumas espécies, “podem não funcionar bem para todos os animais”.

“Temos de reconhecer que o fogo não é apenas um processo que influenciou a evolução há muito tempo…”, acrescentam. “Vemos a necessidade de incorporar o pensamento evolutivo em abordagens para a conservação de populações sob regimes de fogo em mudança, incluindo a deteção de sintomas de ingenuidade do fogo e a identificação de potenciais traços de sabedoria do fogo que poderiam ser aproveitados para a conservação. Ao fazê-lo, será possível melhorar a eficácia da conservação no Piroceno”, concluem.