“Poluição atmosférica severa” no Médio Oriente fortemente impulsionada pela ação humana e é “evitável”, revela estudo
A opinião dominante é de que a degradação da qualidade do ar na região do Médio Oriente se deve principalmente às poeiras desérticas que são transportadas por todo o mundo pelos ventos. No entanto, uma nova investigação desafia essa conceção, e aponta a responsabilidade à atividade humana pela “poluição atmosférica severa” registada nessa zona do planeta.
“Até agora, considerava-se que a qualidade do ar no Médio Oriente era principalmente afetada pelas grandes quantidades de poeira natural”. No entanto, com base em medições realizadas na Península Arábica, os cientistas descobriram que cerca de 90% das partículas finas que prejudicam a qualidade do ar nessa parte do globo têm “origem antropogénica” e são distintas das “menos prejudiciais partículas de poeira do deserto”.
“No Médio Oriente a poluição antropogénica do ar é o principal risco para a saúde e um importante fator climático”, indicam num estudo publicado na revista ‘Nature’.
“O Médio Oriente está localizado numa ‘cintura de pó’, e experiencia, em média, vinte grandes tempestades de poeira todos os anos”, explicam os cientistas, detalhando que, em grande medida devido à falta de chuva, “as concentrações elevadas de poeiras minerais têm um profundo impacto nos ecossistemas e na atividade humana e afetam o clima ao interagir com a radiação solar e terrestre”.
O artigo aponta que essa região do mundo, abrangendo cerca de 400 milhões de pessoas, é responsável por aproximadamente 7,5% das emissões globais de gases com efeito de estufa e por mais de 15% da poluição por dióxido de enxofre. Essas emissões são atribuídas à “produção de energia fóssil e à indústria petroquímica”, apontam os cientistas, que descrevem o Médio Oriente como “um dos maiores ‘pontos quentes’, a nível global, de emissões de SO2 [dióxido de enxofre]”.
O artigo indica que a acidificação, causada pela poluição do ar, é um dos principais motores da degradação dos ecossistemas no Médio Oriente, explicando que “as regiões costeiras são as mais intensamente expostas à deposição de enxofre” e identificando o Mar Vermelho, o Golfo Pérsico e as zonas costeiras da Península Arábica, bem como o Mediterrâneo oriental, como áreas “particularmente afetadas” por essa poluição.
A investigação revela que o nível de poluição no Médio Oriente, especialmente no que toca a partículas finas, ultrapassa, “por uma larga margem”, os níveis considerados seguros pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
As estimativas apontam que ao material particulado é responsável por entre 5,9% e 15,9% do excesso de mortalidade atribuível à poluição do ar, face os 3% registados nos Estados Unidos e aos 3,7% na Alemanha, o que evidencia “as condições desafiantes da qualidade do ar no Médio Oriente”, afirmam os cientistas.
Dessa forma, os especialistas destacam que os riscos para a saúde representados pela exposição à poluição do ar nessa região são semelhantes aos riscos representados pelo colesterol e uso de tabaco (fumado, mastigado ou inalação passiva).
Além disso, e para colocar as coisas numa perspetiva mais facilmente compreensível, os cientistas comparam as mortes por Covid-19 com as fatalidades derivadas da poluição por partículas finas e ozono.
“Embora não diretamente compatíveis (um sendo um risco para a saúde e outro uma doença), o excesso de mortalidade anual atribuído à fraca qualidade do ar (11,5% devido a partículas finas e O3) e à Covid-19 (7,6% em toda a região, e 10,3% excluindo o Egipto, a Síria e o Iémen) são semelhantes”. No entanto, sublinham que “os impactos da poluição do ar na saúde têm uma maior duração”.
Apesar de reconhecerem que cerca de 52% das partículas finas que degradam a qualidade do ar têm origem em poeiras dos desertos, alertam que “uma grande parte das partículas finas prejudiciais para a saúde são antropogénicas e evitáveis”, acrescentando que as concentrações dessas substâncias poluentes são mais elevadas em áreas densamente povoadas “devido à proximidade com fontes antropogénicas”.
Em países como o Kuwait, o Egipto, o Bahrain, o Iraque, Omã e a Arábia Saudita, “os efeitos adversos para a saúde derivados da poluição do ar (natural e antropogénica) são particularmente severos”.