Portugal avança na transição energética, mas não está a aproveitar todo o potencial



Portugal tem feito progressos significativos na transição para uma economia mais sustentável, mas não tem conseguido traduzir essa vantagem na reindustrialização da sua economia. Assim o destaca o Índice de Industrialização e Transição Energética da McKinsey & Company, parte de uma iniciativa com o mesmo nome (IETI, na sigla em inglês) com o objetivo de garantir que Portugal e Espanha estão na linha da frente no plano para revitalizar a economia europeia.

De acordo com a análise, divulgada em comunicado, a resiliência industrial e energética constitui a base da competitividade futura. Portugal tem, como ponto de partida, uma vantagem estratégica que possibilita uma possível liderança na reindustrialização a nível europeu: a capacidade de produzir energia limpa, segura e de baixo custo, até 20% mais barata do que a média europeia. Aproveitar esta oportunidade pode representar o crescimento do PIB em cerca de 15% e a criação de milhares de postos de trabalho qualificados.

Portugal: um bom mix energético, uma aposta clara em tecnologias não poluentes e um custo competitivo da eletricidade, o que aponta para um bom progresso na transição energética

Globalmente, “Portugal está no bom caminho na transição energética” afirma Maria João Ribeirinho, sócia sénior da McKinsey. De facto, Portugal tem reduzido significativamente as suas emissões de gases com efeito de estufa (-38% em relação aos níveis de 2005) e integradas energias renováveis no seu sistema energético (35% de renováveis no consumo final de energia, principalmente impulsionado por solar e eólica, o sexto melhor país da UE). Esse investimento em renováveis, a par da redução de dependências por importações de gás, tem mantido os preços da eletricidade doméstica acessíveis e os preços da eletricidade para a indústria competitivos em relação à média europeia – estes últimos foram 50% mais baratos em 2023, a maior diferença da década.

“O investimento em energias renováveis é fundamental pois contribui para a eletrificação dos três setores com maiores emissões em Portugal: transportes (30% das emissões), indústria (25%) e produção de energia (17%); mantém os preços da eletricidade baixos; e viabiliza projetos com bastante valor para o país, como a produção de hidrogénio”, afirma Maria João Ribeirinho.

Efetivamente, 100 MW de capacidade de eletrolisadores para a produção de hidrogénio verde estão já em fase de construção. A lista de projetos anunciados supera os 4.000 MW. Portugal precisa de reforçar a sua capacidade para implementar projetos-chave. “É fundamental ter uma regulamentação estável, um licenciamento mais rápido, os incentivos certos e mais investimento na rede elétrica”, afirma Maria João Ribeirinho.

Também no que respeita à adoção de veículos elétricos, Portugal registou um progresso significativo: em 2023, veículos novos elétricos representaram 32% das vendas totais, 10 pontos percentuais acima da média da UE.

No entanto, Portugal está atrasado na produção e adoção de biocombustíveis e biometano. Os biocombustíveis estão aquém do mínimo estabelecido pela diretiva europeia. No caso do biometano, apesar do novo Plano de Ação, apenas se produziram 1,2 GWh, de um objetivo de 2.700 GWh em 2030 e de um potencial identificado de 6.900 GWh.

A indústria tem de aproveitar a oportunidade única: mais investimento em I&D e mais ambição para tirar partido dos baixos custos de energia

Os baixos custos da energia podem traduzir-se numa indústria mais competitiva – permitindo a descarbonização e o crescimento dos setores existentes, bem como a abertura de portas a novas indústrias e cadeias de valor, como as baterias ou o aço verde. Segundo André Anacleto, sócio da McKinsey, “uma indústria mais forte impulsionará a transição energética, e a transição energética é uma oportunidade para construir uma indústria mais forte em Portugal, bem como para tornar o país mais atrativo para o investimento das empresas do setor industrial.”

As indústrias existentes devem explorar estas novas oportunidades para crescerem. “Por exemplo, no setor automóvel, Portugal produz cerca de 320 mil veículos por ano, mas apenas 0,1% deles são elétricos, enquanto na Alemanha esse valor é de 30%”, reforça André Anacleto. No entanto, isto não se tem verificado. O peso da indústria na economia, 13.6% em 2023 (valor acrescentado bruto [VAB] da indústria transformadora no VAB total), é ainda significativamente mais de dois pontos percentuais inferior à média da UE e bastante longe dos 19% de 1996.

Em parte, este facto está relacionado com a falta de investimento em investigação e desenvolvimento (I&D), que é essencial para impulsionar a inovação e manter a competitividade da indústria a longo prazo. De facto, o Relatório Draghi atribui à falta de inovação o grande fosso de produtividade entre a Europa e os Estados Unidos e a China. Em Portugal, o investimento em I&D cresceu apenas 0,3 pontos percentuais na última década (alcançado os 1,7% do PIB em 2022) e continua aquém da meta europeia dos 3%. A Alemanha, por exemplo, já passou esse objetivo. Além de aumentar o investimento, Portugal deve também melhorar a sua capacidade de transferência da investigação e conhecimento para a inovação e criação de valor de mercado.

Verificou-se também a perda de relevância do emprego na indústria transformadora no total do emprego da economia, que continua em queda – 16,6% em 2023, quase um ponto percentual abaixo da média dos cinco anos anteriores à pandemia da COVID-19 (2014-2019). A atração de talento qualificado e mão de obra suficiente são fundamentais para o desenvolvimento da indústria.

Por outro lado, e em trajetória positiva, o investimento em ativos fixos industriais cresceu gradualmente desde 2013 e 14% só em 2022, atingindo os 12 mil milhões. No entanto, apesar do progresso positivo, este crescimento ainda não se refletiu em melhorias significativas, por exemplo ao nível do VAB ou do emprego.

 





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