“Portugal é um país com bastante recurso eólico e solar que pode ser combinado para obter uma produção quase permanente de hidrogénio”, João Amaral, Voltalia Portugal
Existe o objetivo de, já nesta década e até 2030, multiplicar a capacidade instalada de produção de eletricidade a partir de fontes renováveis, nomeadamente do Hidrogénio Verde.
A produção de Hidrogénio pode trazer diversos benefícios económicos e sociais para Portugal, considera João Amaral, Country Manager da Voltalia Portugal, que acrescenta que, para maximizar esses benefícios, é importante que o País desenvolva uma estratégia abrangente. O responsável destaca o papel importante do hidrogénio na estratégia de descarbonização, os desafios à sua implementação e fala sobre o desenvolvimento de projetos de produção de hidrogénio por parte da Voltalia.
Quais os benefícios e o impacto do hidrogénio na produção de energia?
A produção de Hidrogénio pode trazer diversos benefícios económicos e sociais para Portugal, uma vez que é um vetor de energia limpa e versátil que pode ser utilizado em vários setores da economia. Para maximizar esses benefícios, é importante que Portugal desenvolva uma estratégia abrangente para a produção, utilização e exportação de hidrogénio, em coordenação com os setores público e privado, bem como com parceiros internacionais. Além disso, o investimento em pesquisa e desenvolvimento para melhorar a eficiência e reduzir os custos da produção de hidrogénio, é fundamental para o sucesso a longo prazo desta aposta.
Em Portugal estabeleceu-se a Estratégia Nacional de Hidrogénio (EN-H2) e esta foi incluída na Resolução do Conselho de Ministros nº 63/2020, de 14/08/2020. Completamos três anos após esta resolução, já com alguns projetos. De facto, a geração de hidrogénio a partir da eletrólise da água e com fontes de energia renováveis pode ter vários impactos, dos quais se destacam: a criação de emprego; o desenvolvimento tecnológico e de infraestruturas; as exportações; uma importante contribuição para a redução das emissões de carbono; pode ter um papel importante quando integrado com energias renováveis para suprimir momentos em que não temos vento, sol ou chuva; pode alavancar a modernização da indústria e ainda contribuir para uma mobilidade mais sustentável. Todo este impacto pode trazer vantagens muito competitivas para Portugal.
O hidrogénio é uma fonte de energia incontornável na estratégia para alcançar os objetivos de descarbonização da economia e de transição energética?
O Hidrogénio desempenha um papel importante na estratégia de descarbonização da economia e transição energética, especialmente como uma alternativa aos combustíveis fósseis. Existe o objetivo de já nesta década e até 2030 – objetivo esse alinhado com a revisão do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) deste ano, por parte do Governo – de multiplicar a capacidade instalada de produção de eletricidade a partir de fontes renováveis, acelerando a descarbonização e dando resposta às necessidades dos novos investimentos industriais previstos para o nosso país, criadores de emprego verde e de valor acrescentado nacional. Neste sentido, acredito que a aposta no reforço das energias renováveis será muito significativa, promovendo- se a eletrificação e a diversificação de fontes de energia, incluindo a produção e o consumo de gases renováveis, como é o caso do Hidrogénio Verde.
Quais os maiores desafios para a sua implementação em Portugal?
Alguns dos principais desafios à implementação do hidrogénio em Portugal, passam pelo investimento em instalações de produção, armazenamento e distribuição de hidrogénio, bem como em estações de abastecimento para veículos movidos por esta via. A disponibilidade de equipamentos para a produção de hidrogénio pode ser um tema, levando em conta os vários projetos anunciados por diferentes países, sendo necessário o desenvolvimento de tecnologias eficientes, económicas e principalmente de novas unidades de fabrico de eletrolisadores.
Outro desafio relevante, é a competitividade de cada quilograma de hidrogénio verde produzido. Portugal é um país com bastante recurso eólico e solar que pode ser combinado para obter uma produção quase permanente de hidrogénio – e assim assumir a liderança dentro da União Europeia. No entanto, é importante manter em vista que outros países, particularmente na América Latina e África, irão dispor de condições porventura superiores nesta combinação de recursos eólico e solar, o que irá permitir um custo de quilograma de hidrogénio inferior, podendo aumentar os desafios de competitividade.
A falta de legislação e regulação gera incertezas no mercado e cria risco para o investimento?
Como em tudo é necessário criar regras. Em tempos, disse que a melhor tecnologia é a regulamentação. A ausência de legislação ou uma regulação pouco transparente podem criar incertezas no mercado e afastar investidores que podem ainda olhar para este mercado como um risco. A existência de legislação, de regras claras e consistentes são essenciais para atrair investimentos para este mercado, já que estas serão garantia para um ambiente propício ao desenvolvimento de tecnologias de hidrogénio e de outras energias renováveis em Portugal.
O Plano Nacional do Hidrogénio, aprovado em Conselho de Ministros em 2020, prevê que até 2030 o hidrogénio represente 2% a 5% do consumo de energia na indústria, 1 a 5% no consumo de transportes rodoviários, 3 a 5% no transporte marítimo doméstico e 1,5% a 2% no consumo final de energia. Estas estimativas são realistas?
As estimativas do Plano Nacional do Hidrogénio podem ser alcançáveis considerando os vários investimentos previstos em pesquisa, desenvolvimento, infraestrutura e unidades de fabrico. No entanto, alcançar esses objetivos implica avultados investimentos e, além disto, dependerá de vários fatores, incluindo avanços tecnológicos, disponibilidade de financiamento e entendimento da tecnologia em causa, além da necessária cooperação entre os setores público e privado.
Segundo o Governo, a Estratégia Nacional do Hidrogénio será revista, mais do que duplicando a capacidade prevista de eletrolisadores até 2030 (de 2,5 GW para 5,5 GW), contribuindo assim para a segurança de abastecimentos no espaço europeu e permitindo: descarbonizar a indústria nacional; atrair novas indústrias que produzem derivados do hidrogénio verde; exportar hidrogénio verde para a União Europeia.
Acreditamos no potencial, vamos ver se Portugal tem a capacidade de concretização que estamos a ver noutros países, como é o caso de projetos que temos estado a desenvolver no Egito e no Brasil.
Como antecipam o futuro, a curto e médio prazo, da Voltalia ao nível de projetos orientados à produção de gases renováveis, predominantemente hidrogénio?
A Voltalia, como uma empresa que trabalha na produção de energias renováveis, provavelmente seguirá uma abordagem orientada pela evolução tecnológica e pelos requisitos e necessidades do mercado, considerando que a orientação às necessidades de um cliente e de um país são fundamentais para o sucesso do que fazemos diariamente. Sendo uma boa oportunidade o desenvolvimento de projetos de produção de hidrogénio tudo dependerá das condições económicas, regulatórias e tecnológicas, bem como das oportunidades de investimento em Portugal.
No Brasil, por exemplo, onde a Voltalia é um dos maiores investidores em energia limpa do Nordeste, a abertura ao potencial que existe na região é fundamental, e localmente o suporte regulatório e governamental para a produção e exportação de Hidrogénio Verde são igualmente notáveis, numa escala diferente da que podemos encontrar na Europa.
O que é que ainda falta fazer para desburocratizar as energias renováveis em Portugal?
Portugal antecipou em quatro anos a meta de incorporação de energias renováveis na produção de eletricidade. Assim, segundo o Governo e já a partir de 2026, 80% da energia produzida em território nacional será de origem renovável, uma meta que antes estava fixada para 2030. A revisão do PNEC aumentou a incorporação de renováveis, o que vai potencialmente fazer crescer este valor até 2030. Com isto, o país prepara-se para atingir a neutralidade climática em 2045. Hoje, observamos que Portugal continua a ser um país com vários organismos que têm de se relacionar em perfeita sintonia, para que um projeto possa acontecer.
Penso que a autorização de investimentos em plataformas digitais e a formação de pessoal nas entidades licenciadoras – que se pretende remunerado em linha com o setor – seriam medidas simples que se fossem aplicadas podiam tornar os processos bem mais céleres. Por fim, um acesso que seja mais facilitado à rede elétrica e ao mesmo tempo mais criterioso aos players do setor que, com provas dadas e contra as adversidades que abrangem todos, tomam a iniciativa de implementar os seus projetos. Precisamos, e não é só no setor da energia, de promover cada vez mais parcerias público-privadas para acelerar o desenvolvimento de infraestruturas e por fim a parte económica, uma vez que são necessários mais incentivos financeiros e fiscais para investimentos em projetos de energia renovável e possamos continuar a desenvolver mais tecnologia, mais armazenamento e conseguir fazer uma melhor distribuição.
O nosso país tem todas as condições para ser um gerador de excelência no que diz respeito às energias renováveis, nomeadamente ao hidrogénio, mas é preciso ter visão e permitir que quem quer e pode fazer, tenha as condições necessárias para concretizar.