Quando um lobo é morto por um humano, a sobrevivência da alcateia pode ficar em risco



Os lobos (Canis lupus) são animais extremamente sociais, cujos grupos, ou alcateias, são organizados numa estrutura hierárquica dominada pelo casal de alfas. Os líderes comandam os restantes membros na vida diária, mantêm a ordem interna e protegem o coletivo de ameaças externas, como outros grupos ou indivíduos.

Por isso, a unidade destes grupos é essencial para a sobrevivência dos lobos, especialmente em ambiente relativamente hostis, nos quais as condições de disponibilidade de presas e atmosféricas são determinantes para o sucesso, ou fracasso, dessas populações.

Alcateia de lobos no Parque Nacional de Voyageurs.
Fonte: Voyageurs Wolf Project

Para compreender mais aprofundadamente o funcionamento das alcateias, um grupo de investigadores estudou como as mortes de lobos causadas por humanos afetam a integridade e a sobrevivência dos agregados.

Recorrendo a dados recolhidos, sobretudo, em parques nacionais nos Estados Unidos, concluíram que os humanos são uma das principais causas de mortalidade dos lobos que vivem nessas áreas e que essas mortes “causam instabilidade nas alcateias”.

Ao invés de analisarem os impactos humanos sobre as populações, os cientistas quiseram olhar um pouco mais de perto, e por isso escolheram as alcateias, unidades mais pequenas, pois, como diz Kira Cassidy, investigadora no Parque Nacional de Yellowstone e principal autora do artigo publicado na revista ‘Frontiers in Ecology and the Environment’, “para os lobos, a unidade biológica é a alcateia ou a família”.

A investigação revelou que quando um dos membros do grupo é morto por um humano a probabilidade de a alcateia se manter junta até ao final do ano cai 27%, sendo que a capacidade de reprodução no ano seguinte é também reduzida em 22%.

O caso assume contornos ainda mais preocupantes quando é um dos líderes do grupo que é morto. Nessas circunstâncias, e dada a importância dos alfas para a organização e sobrevivência dos outros membros, existe uma probabilidade de 73% de o grupo se desintegrar até ao final do ano e uma redução de 49% na reprodução.

Os resultados levam os investigadores a concluírem que as mortes de lobos às mãos dos humanos transformam a ecologia das populações desses animais, mesmo que essa mortalidade possa não se refletir numa diminuição da dimensão dos grupos.

Lobo com coleira de geolocalização no Parque Nacional de Voyageurs.
Fonte: Voyageurs Wolf Project

Os autores argumentam, assim, que os humanos “são uma causa desproporcional de mortalidade para os lobos que vivem sobretudo em parques nacionais” e que “os lobos morrem mais frequentemente de causas relacionadas com os humanos do que seria de esperar”. Estes encontros entre humanos e lobos, que podem resultar no ferimento ou mesmo na morte de qualquer um dos dois, acontecem quando os animais vagueiam além dos limites dos parques onde residem.

Do conjunto de parques nacionais abrangidos, foi no Voyageurs National Park, no estado norte-americano do Minnesota, que foi identificado que os lobos passam mais tempo fora dos limites, cerca de 46% do seu tempo, pelo que 50% das mortes desses lobos foram causadas pelos humanos.

Thomas Gable, do projeto de investigação científica Voyageurs Wolf Project e outro dos autores, assinala que são poucos os lobos que vivem exclusivamente dentro dos limites desse parque, pelo que “quando os lobos deixam o parque, estão mais vulneráveis ao risco de serem mortos pelas pessoas”.

No entanto, o parque de Voyageurs não é caso único, sendo que foram registados elevados níveis de mortalidade de lobos às mãos dos humanos nos restantes quatro parque: Yellowstone, Parque e Reserva Nacional de Denali, Parque Nacional de Grand Teton e na Reserva Nacional de Yukon-Charley Rivers.

A caça e a colocação de armadilhas fora dos limites desses parques, ainda que legais em certas alturas do ano, são a causa de 53% das mortes anuais de lobos, calculam os cientistas, que defendem que é necessária uma melhor gestão da vida selvagem dentro e fora das áreas protegidas, porque “os lobos não sabem onde os parques começam e acabam”.

Os autores escrevem que os resultados são “preocupantes”, na medida em que a morte de lobos pelos humanos têm “efeitos prejudiciais ao nível dos processos biológicos das alcateias de lobos”, reduzindo o sucesso da reprodução, algo que poderá afetar a sustentabilidade e sobrevivência dos grupos.





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