Ratinhos-ruivos sabem o que é seguro comer através do hálito de outros membros do grupo



Uma equipa de investigadoras portuguesas descobriu que o ratinho-ruivo (Mus spretus) aprende a identificar os alimentos que são seguros ingerir através do hálito de outros ratinhos da mesma espécie. Assim, pode alterar a composição da sua dieta sem correr riscos desnecessários.

O ratinho-ruivo é uma espécie comum em Portugal e nos países do Mediterrâneo. Pode ser encontrado em habitats naturais, mas também em zonas de agricultura, estufas, jardins e parques urbanos, alimentando-se sobretudo de vegetais, mas também de insetos e outros invertebrados.

Em laboratório, as cientistas formaram dois grupos de ratinhos: os ‘demostradores’ e os ‘observadores’. Aos primeiros foi oferecida ração polvilhada com canela, da qual se alimentaram, e depois os ‘demonstradores’ foram colocados junto dos ‘observadores’, onde puderam contactar uns com os outros.

O ratinho-ruivo (Mus spretus) é uma espécie comum em Portugal e nos países do Mediterrâneo, sendo encontrada sobretudo em zonas de agricultura, estufas, jardins e parques urbanos.
Foto: Ana M. Cerveira (coautora do artigo)

Passada cerca de meia hora, as investigadoras apresentaram aos ‘observadores’ duas opções: ração com canela e ração com cacau. A maioria dos ‘observadores’ escolheu a ração com canela, o que levou à conclusão de que a escolha dos ‘demonstradores’ influenciou a escolha dos outros ratinhos.

Susana Varela, do Instituto Gulbenkian para a Ciência e uma das autoras do artigo publicado na revista ‘Behavioural Processes’, explica, em comunicado, que “aprender o que comer por tentativa e erro demora tempo e pode ser arriscado, uma vez que pode levar a indisposições ou até mesmo à morte”.

Por isso, a cientista considera que este mecanismo de aprender o que é seguro comer com outros membros da mesma espécie é “muito vantajoso”.

Para verificar se a preferência alimentar os ratinhos-ruivos tinha realmente mudado, ou se se tratava de coisa passageira, as cientistas voltaram a avaliá-la um mês depois da primeira experiência. E perceberam que estes roedores continuavam a preferir a ração polvilhada com canela, ainda que não a tenham voltado a comer.

“Um mês pode não parecer muito tempo para um ser humano, mas estes ratinhos vivem apenas cerca de um ano e meio. Um mês nas suas vidas representa muito tempo, o equivalente a cerca de quatro anos na vida de uma pessoa”, refere Rita Andrade, doutoranda da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL) e primeira autora do artigo.

Ainda assim, os resultados mostraram que os ratinhos ‘observadores’ só adquiriam realmente uma nova preferência alimentar quando contactavam com os ‘demonstradores’ por períodos de tempo relativamente demorados.

Se o contacto entre ‘demostradores’ e ‘observadores’ era inferior a dois minutos, estes últimos tendiam a evitar a ração com canela, preferindo, ao invés, a ração com cacau. Embora desconheça, para já, a razão deste comportamento, a equipa sugere que poderá ter algo a ver com o estatuto social dos ratinhos, uma vez que a hierarquia dentro dos grupos influencia as dinâmicas internas.

Os ratinhos-ruivos, tal como outros animais, reconhecem sem grande dificuldade os membros mais dominantes do coletivo, através do cheiro e do comportamento. Por isso, para minimizarem a probabilidade de conflitos com os ratinhos mais agressivos, “tendem a evitar o contacto prolongado com indivíduos mais dominantes e com um estatuto social muito superior ao seu”, aponta Ana Cerveira, da Universidade de Aveiro e outra das autoras.

“Isso pode facilmente ter acontecido durante o nosso estudo”, salienta.

Além disso, se um ratinho tiver uma saúde mais debilitada, os outros normalmente preferem evitar passar muito tempo com ele, para evitarem contrair alguma doença ou parasita.

Assim, a transmissão de informação entre os ratinhos-ruivos, neste caso sobre se um alimento é ou não seguro para ingerir, tende a acontecer entre membros que estejam mais familiarizados uns com os outros, “condicionando assim a transmissão da informação entre os indivíduos”, dizem as investigadoras.

“Estudar estes fenómenos em animais selvagens é importante para percebermos como e com que eficácia é que a transmissão social de informação ocorre na natureza” diz Maria da Luz Matias, investigadora e professora na FCUL, que também assina este trabalho.





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