V Conferência da Green Savers: Acesso à água potável é um dos pontos mais críticos nos próximos 25 anos
A celebração do 4.º ano da revista Green Savers coincidiu este ano com a data da quinta conferência promovida pela marca. No espaço Montes Claros, em Monsanto, a manhã foi dedicada a pensar a Sustentabilidade numa perspetiva de 360 graus, isto é, como prática transversal a todas as áreas, da vida pessoal às políticas públicas, repensando, para isso, os hábitos de consumo e fortalecendo uma cultura de responsabilidade pelo meio ambiente.
Filipe Duarte Santos, presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável, abriu a sessão através de uma retrospetiva histórica sobre a evolução dos desafios ambientais e a forma como a ciência, a tecnologia e a sociedade têm procurado responder às consequências geradas pelas alterações climáticas, como a perda de biodiversidade, a poluição química, a acidificação dos oceanos, entre outras problemáticas.
O especialista destacou o acesso à água potável como um dos pontos mais críticos nos próximos 25 anos e deixou o alerta para que países economicamente mais avançados equilibrem a balança com mais conhecimento, consciência e capacidade de análise dos desafios contemporâneos e das complexidades que estes englobam, numa perspetiva de “who cares, wins”.
Seguiu-se o painel “Estratégias das Empresas para um Futuro Sustentável” onde se debateu o quão determinadas e convictas estão as organizações para se reposicionarem e fazerem a diferença na aplicação prática dos critérios de ESG. Para Filipa Pantaleão, secretária-geral do BCSD, “as empresas têm de mudar a sua relação com o ambiente e as comunidades, perceber que todos os recursos com o que estão a trabalhar são finitos e que a capacidade de regeneração já não é total, as matérias-primas vão acabar”.
O paradigma do consumo é outra questão crucial em cima da mesa, refere: “temos responsabilidade na forma como produzimos, consumimos e lidamos com o subproduto do consumo, todos os produtos e serviços têm impacto”, considerando mesmo que “nem devia haver outro conceito que não o da economia circular”.
Marta Neves, presidente da Comissão Executiva da Valorsul e Administradora da EGF, salienta, por um lado, a necessidade de mostrar às empresas que há vantagens em ser sustentável, e por outro, o trabalho de sensibilização dos consumidores para uma responsabilização individual que se reflita no coletivo, “todo o ecossistema tem de estar conjugado”.
Sobre se é possível uma relação saudável entre a sociedade, o ambiente e a forma como se faz negócio, Julieta Silva, business developer manager da Voltalia, é otimista, sublinhando os projetos relevantes que Portugal tem liderado na área das energias renováveis, apesar da lacuna que identifica quando se fala do envolvimento das populações nestas iniciativas “é preciso integrar as pessoas desde o início porque impacto zero não existe, ocupamos o espaço de determinada zona, fazemos modificações à paisagem. A solução é adaptar, estabelecer uma harmonia entre a sociedade, o negócio e o ambiente e fazer um trabalho entrosado”.
Relativamente ao que falta fazer no quadro empresarial em Portugal, Luís Almeida Capão, presidente do Conselho de Administração da Cascais Ambiente, aponta um grande desequilíbrio entre as cotadas, que têm feito um trabalho de responsabilidade corporativa mais musculado, com métricas específicas de concretização dos padrões ESG, e as PME, estrutura na qual assentam 99% das empresas nacionais, e que precisam de apoio na integração dos objetivos de desenvolvimento sustentável no seu tecido empresarial.
Carlos Gouveia apresentou o programa PME + Sustentável da Scoring cujo foco é ajudar as empresas a incorporar riscos, detetar oportunidades, delinear estratégias de gestão sustentáveis, aumentar o potencial de vendas e gerar confiança e motivação nas equipas para uma operacionalização mais eficaz e transparente.
As escolhas do consumidor estiveram em palco na conversa que se seguiu com José Borralho, CEO da ConsumerChoice, que falou sobre as tendências de consumo dos últimos anos, a valorização da qualidade face à quantidade e preço, o “boom” de segmentos de mercado como o do bem-estar e fitness, a valorização dos produtos locais, biológicos e sustentáveis, o incremento exponencial de vendas online e a economia da partilha.
Sobre se o greenwashing é ou não efeito colateral na corrida de mercado pela sustentabilidade, José Borralho considera que essas práticas muitas vezes servem para “esconder a dificuldade que as marcas têm em implementar políticas sustentáveis a sério, fazendo campanhas engraçadas com medidas superficiais”. Para o responsável, “as soluções de sustentabilidade estão diretamente associadas ao esforço de inovação, pensar na cadeia de fornecimento, na entrega do produto ou serviço, entre outros”.
O último painel do dia visou a proteção do Planeta para todos e com todos. Teresa Ferreira, presidente do Conselho de Coordenadores do Laboratório Associado TERRA, realçou o hiato entre os objetivos e timings que as empresas colocam no papel e o que efetivamente se passa no terreno.
A catedrática do Instituto Superior de Agronomia, considera que a ciência é muito ouvida, “mas aquilo que mostramos levaria a ações que são, tendencialmente, incómodas e inconvenientes”, e dá um exemplo: “incomoda que um ciclo de recuperação de um aquífero não seja feito no tempo que as políticas querem, andamos a transformar os ecossistemas há dois mil anos, é quase ridículo pensarmos em fasquias de 10, 20 anos para recuperação”.
Para Teresa Ferreira, um dos grandes objetivos é minorar lesões ambientais para as gerações futuras, “temos de conjugar as atividades humanas com os ciclos naturais dos ecossistemas”.
Ana Müller, projet and policy officer da ZERO, aponta incongruências no OE2025, que prevê um aumento do consumo de combustíveis fósseis, e o plano de energia e clima, além de lacunas nas políticas e medidas, muitas com linguagem vaga e prazos de execução demasiado longos para o que seria necessário.
Para José Carlos Ferreira, investigador do MARE, a solução é adaptar, “mitigar já não chega”, quando o que está em causa é o futuro da costa portuguesa, com a crescente erosão dos litorais, os riscos afetos à sobrevivência da fauna e da flora e ao sustento das próprias comunidades humanas. As más opções urbanísticas, a falta de ordenamento território, são outros fatores que José Carlos Ferreira aponta como fundamentais, além da crise climática.
Emília Alves, business coach, encerrou os trabalhos dizendo que informação e conhecimento, por si só, não têm poder. “O poder está na execução, no passar à ação, e sustentabilidade implica fazer coisas diferentes”.