Wolfsburgo: o futebol no centro da sustentabilidade financeira (com VÍDEO)
Nos últimos 20 anos, sobretudo depois da criação das Sociedades Anónimas Desportivas (SAD), Benfica, Sporting e Porto e outros clubes portugueses acumularam passivos galopantes, tesouraria a crédito e gritantes erros de gestão.
À medida que uma nova era chega ao futebol português – consequência das inevitáveis mudanças resultantes da crise económica – e novos modelos de gestão entram em funcionamento, vale a pena olhar para um dos campeonatos de futebol mais bem estruturados e sustentáveis do mundo, o alemão.
Em Janeiro, a Liga alemã de futebol (DFL) anunciou que, pelo décimo ano consecutivo, as receitas atingiram números recorde: a liga arrecadou €2,45 mil milhões de receitas, mais 12,9% que na época anterior. O relatório, denominado Bundesliga Report, explica que 13 dos 18 clubes da Bundesliga conseguiram dar lucro no ano passado e, no total, 24 das 36 equipas das duas principais divisões estão financeiramente no bom caminho.
Os números da Bundesliga ainda não chegam à dimensão da Premier League, a liga britânica, que tem receitas de €3 mil milhões, mas ultrapassaram já os das ligas italiana, francesa ou espanhola. “A Alemanha é o único país europeu em que o desenvolvimento da selecção nacional e da liga se dá em paralelo”, explicou Christian Seifert, CEO da Bundesliga. E se a Alemanha é a actual campeã do mundo, quem sabe se, num futuro próximo, a Bundesliga ultrapassará a influência da liga inglesa?
Segundo Seifert, a grande evolução no futebol germânico nos últimos 15 anos – desde o Euro 2000 – tem como pano de fundo “as sólidas fundações financeiras, essenciais para a obtenção de resultados fantásticos”. Um exemplo: o número médio de espectadores por jogo, na Bundesliga, é de 42.609 – cerca de 90% da percentagem de capacidade dos estádios.
Por outro lado, o futebol alemão emprega hoje 48.830 pessoas – estando 17.228 vinculadas aos clubes e as restantes 31.602 às empresas que lhes prestam serviços. O futebol profissional alemão pagou ainda €875 milhões em impostos – e um total de €4 mil milhões nos últimos cinco anos. O estado alemão agradece
E o Wolfsburgo?
Quando esta noite subir ao relvado do Estádio Alvalade XXI, o Wolfsburgo trará ao peito o símbolo do seu proprietário, a Volkswagen, exemplificando uma série de clubes de futebol – empresa alemães, de que o Bayer Leverkusen (Bayer) e o Hoffenheim (SAP) já exemplos mais mediáticos.
Fundado em 1945 por um grupo de trabalhadores de Volkswagen, o Wolfsburgo é inteiramente detido pela Volkswagen – e joga no Volkswagen Arena – e é gerido como uma empresa.
Apesar de ser, como os outros dois clubes-empresa, das equipas com menos adeptos – e é compreensível que assim o seja – o Wolfsburgo é dos mais poderosos financeiramente. A mais recente contratação – André Schürrle, que veio do Chelsea em Janeiro por €30 milhões – é a prova deste poderio.
A Volkswagem já investiu €100 milhões no Wolfsburgo desde o início da década e, caso o clube chegue à Champions League, o que é previsível, deverá chegar aos €150 milhões em investimento nos próximos anos, de acordo com a ESPN.
A estratégia é elogiada, inclusive, pelos rivais. “É um clube com recursos infinitos e sempre disse que, quando a Volkswagen começar a levá-lo a sério, irá chegar mais longe”, explicou o CEO do Borussia Dortmund, Hans-Joachim Watzke. “[O clube] tem à frente pessoas que estão a fazer um excelente trabalho”, concluiu.
Fazer passar a mensagem
Com o Wolfsburgo nas bocas do mundo, a Volkswagen tem à sua disposição um meio de excelência para promover os seus produtos mas também a sua estratégia verde – que é, curiosamente, a cor do clube.
A empresa, que ainda recentemente anunciou um plano para poupar €5 mil milhões e tornar as suas marcas mais sustentáveis e eficientes, é uma das líderes globais em veículos eléctricos e lançou no ano passado, em Portugal, duas novas opções verdes: o e-Up! e o e-Golf.
“A Volkswagen raramente é a primeira [empresa] a propor uma inovação, mas é a primeira a democratizá-la”, explicou Ricardo Tomaz, director de marketing da Volkswagen em Agosto ao Green Savers.
“A Volkswagen entrou no mercado quando julgou que podia propor um veículo eléctrico que correspondesse às expectativas do mercado, sobretudo em termos de autonomia, a um preço muito competitivo”, continuou. “Não faz sentido que sejam os clientes a pagar o desenvolvimento tecnológico de uma inovação”.
Se conseguir conciliar a sua estratégia de inovação sustentável com o mediatismo do futebol, através do Wolfsburgo, a Volkswagen tem uma oportunidade muito interessante para ajudar a mudar mentalidades, sobretudo quando muitos dos mais jovens seguem os seus ídolos do futebol, como Schürrle, De Bruyne, Doost ou o português Vieirinha.
Caso siga este caminho, o Wolfsburgo irá unir-se a dois outros clubes da Bundesliga que levam a sustentabilidade – financeira e ambiental – a sério: o Werder Bremen e o Hoffenheim. Quando essa altura chegar, é o Planeta que agradece.
Foto: Ungry Young Man / Creative Commons