Recifes de coral: Quanto mais fundo mergulhamos, maior é a poluição por plástico



Os recifes de coral são dos ecossistemas mais biologicamente diversos do planeta, suportando cerca de quatro mil espécies de peixes, 800 espécies de corais duros e inúmeras outras formas de vida. Além de serem refúgios para pequenos animais e plantas em desenvolvimento, fornecem proteção, tal como as florestas de mangue, contra a erosão costeira causada pelas ondas e ajudam a atenuar os efeitos de tempestades.

Apesar disso, são dos habitats marinhos mais afetados pela poluição por plástico e outros produtos derivados das atividades humanas. E quanto mais fundo mergulharmos, mais plástico encontraremos.

Nas Filipinas, um ouriço-do-mar da espécie Asthenosoma varium agarra-se a uma linha de pesca abandonada, coberto por um pedaço de plástico azulado.
Foto: Luiz Rocha / California Academy of Sciences

Uma investigação internacional que abrangeu 84 recifes de coral superficiais e mesofóticos (entre os 30 e os 150 metros de profundidade) em 14 países diferentes mostrou que a quantidade de resíduos de plástico aumenta com a profundidade. E os cientistas identificaram que a maioria do plástico que está a afetar esses recifes provem da pesca.

“Foi com surpresa que percebemos que os resíduos aumentavam com a profundidade, uma vez que os recifes mais profundos costumam, regra geral, estar mais afastados das fontes da poluição por plástico”, observa Luiz Rocha, ictiólogo da Academia de Ciências da Califórnia e um dos principais autores do artigo divulgado esta semana na revista ‘Nature’.

De todo o “lixo produzido pelos humanos” que os investigadores encontraram durante os seus mais de mil mergulhos nos oceanos Índico, Pacífico e Atlântico, 88% eram macroplásticos, com mais de cinco centímetros de comprimento. Acreditam que a deposição desses materiais nos recifes de coral de profundidade se deve à ação das ondas à superfície, que arrastam consigo os resíduos das zonas costeiras.

88% dos resíduos encontrados nos recifes de profundidade eram macroplásticos, com mais de cinco centímetros de comprimento, como garrafas e embalagens.
Foto: Luiz Rocha / California Academy of Sciences

Foram encontrados resíduos de plástico em quase todos os locais observados por esses cientistas, mesmo em zonas que se consideravam intocadas pelos humanos, como os recifes perto de ilhas desabitadas no Pacífico central, incluindo no arquipélago de São Paulo, ao largo da costa brasileira, e que se considera um dos grupos de ilhas mais isolados do mundo.

Nas Ilhas Marshall foi identificada a menor densidade de resíduos de plástico, com cerca de 580 itens por quilómetro quadrado. No extremo oposto do espectro, nas águas da União das Comores, um Estado insular no sul de África, foram encontrados, em média, perto de 84.500 resíduos de plástico por cada quilómetro quadrado.

Os cientistas dizem que por os recifes a maiores profundidades serem mais difíceis de estudar raramente são abrangidos por programas de conservação, apesar da imensa biodiversidade que albergam.

“Estes recifes enfrentam muitas das mesmas pressões da sociedade humana que afetam os recifes superficiais, e têm uma fauna única e pouco estudada”, salienta Bart Shepherd, outro dos autores. “Temos de proteger os recifes mais profundos e garantir que são incluídos nos debates sobre conservação”, reforça.

Os impactos da pesca e a poluição nas áreas marinhas protegidas

Embora tenham sido encontrados muitos resíduos como garrafas e embalagens de plástico, que em muitos outros ecossistemas são a principal fonte desse tipo de poluição, nos recifes mesofóticos quase três quartos do plástico encontrado pelos investigadores provinha de atividades relacionadas com a pesca, como linhas, redes e cordas.

Uma corda de nylon de uma âncora pende para as profundezas presa num recife de coral da zona mesofótica, perto de Palau, no oceano Pacífico.
Foto: Luiz Rocha / California Academy of Sciences

Lucy Woodall, da Universidade de Exeter, que também participou neste trabalho, aponta que as artes de pesca, que mesmo depois de indevidamente descartadas nas águas continuam a afetar a vida marinha, “parecem contribuir para uma grande porção do plástico visto nos recifes mesofóticos”.

Por isso, tendo em vista a redução desses fatores de ameaça à biodiversidade e saúde dos mares e oceanos, a cientista defende que devem ser tomadas medidas para incentivar o descarte adequado desses materiais, como a colocação de identificação dos pescadores nesses equipamentos ou a eliminação de taxas que tenham de ser pagas para a deposição de material danificado nos portos.

Além de aumentar com a profundidade, a poluição por plástico nos recifes é maior perto de áreas densamente povoadas e mesmo perto de áreas marinhas protegidas. Os investigadores argumentam que muitas dessas áreas permitem a pesca e podem apresentar altos níveis de atividade, devido à maior abundância de peixes e outros animais marinhos com valor comercial e para a alimentação humana.

Hudson Pinheiro, principal autor do artigo, alerta que “a poluição por plástico é um dos maiores problemas que afetam os ecossistemas oceânicos, e os recifes de coral não são exceção”.

Para o biólogo marinho da Universidade de São Paulo “à medida que os recursos marinhos se vão reduzindo por todo o mundo, os humanos que dependem desses recursos viram-se para habitats mais profundos e para aqueles que estão perto de áreas marinhas protegidas, onde os peixes se mantêm abundantes”.

No entanto, nem tudo parece estar perdido, pois estes cientistas acreditam que se agirmos agora e implementarmos soluções baseadas na Natureza é possível travar a poluição por plástico dos recifes de coral e até reverter os danos por eles sofridos devido à forma como os humanos têm tratado o planeta Terra.





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