Áreas marinhas protegidas podem ajudar a alcançar “múltiplos” Objetivos do Desenvolvimento Sustentável



No final do ano passado, os governos de quase todo o mundo, reunidos na cimeira global da Biodiversidade (COP15), no Canadá, assumiram o compromisso de proteger pelo menos 30% dos ecossistemas até 2030 para travar a perda alarmante e implacável de espécies e habitats.

Esses esforços passam pelo aumento do número de áreas marinhas protegidas, estimando-se que atualmente menos de 3% dos oceanos estejam, realmente, protegidos legalmente. A criação de áreas protegidas em meio marinho tem enfrentado alguns obstáculos, uma vez que algumas vozes apontam receios de que podem prejudicar a subsistência e bem-estar de comunidades costeiras que dependem fortemente dos recursos fornecidos pelos mares e oceanos.

Contudo, a conservação da biodiversidade marinha e a segurança alimentar desses grupos humanos não têm de ser mutuamente exclusivas. De acordo com uma investigação divulgada recentemente na ‘Nature Sustainability’, limitar a presença humana em determinadas porções marinhas não só ajuda a promover e proteger a saúde e biodiversidade desses habitats, como também assegura e fortalece a segurança alimentar das comunidades costeiras.

A equipa de cientistas, coordenada pelo Instituto Smithsonian (Estados Unidos da América), estudou os impactos das áreas marinhas protegidas na Barreira de Coral Mesoamericana, no mar das Caraíbas, e que abrange países como o México, o Belize, a Guatemala e as Honduras. De acordo com a WWF, o recife mesoamericano é a maior barreira de coral do hemisfério ocidental, albergando centenas de espécies de peixes, de tartarugas marinhas, de tubarões e de corais. Contudo, está ameaçado pelo desenvolvimento urbano na costa, por escoamentos agrícolas e, claro, pelos efeitos das alterações climáticas.

Os investigadores concluíram que mesmos as áreas marinhas com o maior grau de restrições às atividades humanas ajudam a aumentar o número de peixes e, assim, a reforçar as fontes de alimento e rendimento das comunidades da costa.

“O nosso estudo fornece provas de que [as áreas marinhas protegidas] na região do Recife Mesoamericano têm o potencial para beneficiar quer as pessoas quer a Natureza, ao mesmo tempo”, assegura Justin Nowakowski, primeiro autor do artigo.

O cientista acredita que “nas condições certas, intervenções de conservação”, como as áreas marinhas protegidas, “podem ser estratégias centrais para alcançar múltiplos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável”, como a proteção dos oceanos e da vida marinha (ODS 14) e a erradicação da pobreza (ODS 1) e da fome (ODS 2).

Outro dos investigadores, Steven Canty, explica que os dados recolhidos mostram que, se forem devidamente concebidas e geridas, as áreas marinhas protegidas, mesmo as que excluem totalmente a pesca , “ajudam a reconstituir as populações de peixes” das áreas circundantes e que “estas zonas estão associadas a um maior bem-estar das comunidades costeiras” que residem nas imediações desse recife.

Contas feitas, os cientistas estimam que as áreas marinhas protegidas com os mais altos níveis de proteção nessa região apresentavam, em média, 27% mais peixes do que as zonas desprotegidas em volta.

E acreditam que essas são evidências claras de que a proteção dos habitats marinhos é fundamental para ajudar as comunidades costeiras a alcançarem uma maior segurança alimentar, bem como fontes de rendimentos indispensáveis. Isto, porque, segundo os investigadores, o rendimento das comunidades costeiras perto de áreas marinhas protegidas é, em média, 33% superior.

Apesar dos resultados, a equipa, ainda assim, reconhece que são precisos mais estudos para que se possam realmente compreender as ligações entre as áreas marinhas protegidas e os impactos nas comunidades humanas, sobretudo no que diz respeito à pesca.

“Como é que as áreas marinhas protegidas afetam outros aspetos do bem-estar humano? Que fatores aumentam os resultados positivos? Quão eficazes são as áreas protegidas geridas pelas comunidades costeiras?”, são algumas das questões que ainda estão sem resposta, mas que ajudarão a ter uma imagem mais clara e precisa de como os grupos humanos e a proteção de ecossistemas marinhos se podem ajudar mutuamente.

Este é mais um estudo que vem reforçar um corpo de literatura científica cada vez maior que mostra que as áreas marinhas protegidas, sem forem bem implementadas e geridas, não têm de ser obstáculos à subsistência e bem-estar humanos, mas podem ser um peça fulcral de uma nova forma de estar e viver no planeta Terra, em que a conservação da biodiversidade assume um lugar de destaque no reforço da sustentabilidade das sociedades humanas.





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