Mesmo em florestas intocadas as aves continuam a desaparecer
Os habitats intocados pelos humanos são considerados os últimos refúgios de muitas espécies de animais e plantas e autênticas “fortalezas” da biodiversidade. Contudo, mesmo nas florestas consideradas prístinas, a perda de espécies continua a acontecer, com os cientistas a alertarem que, mesmo nesses locais, não há garantias de conservação.
Uma equipa de investigadores que há quase 30 anos tem estudado as populações de 29 espécies de aves na Amazónia, numa região de floresta a cerca de 80 quilómetros da cidade brasileira de Manaus, revela ter feito “descobertas alarmantes”.
Num artigo publicado esta semana na revista ‘Science Advances’, afirmam que o aumento da temperatura e a falta de chuva são dois dos fatores que mais ameaçam a sobrevivência dessas aves. Em algumas espécies, as probabilidades de sobrevivência nessas condições caíram mesmo para metade.
“Este estudo revela uma crise emergente para as aves numa das regiões mais biodiversas do mundo”, refere, em comunicado, Jared Wolfe, professor na Universidade Tecnológica do Michigan (Estados Unidos da América) e primeiro autor do trabalho.
Para o investigador, este é o primeiro estudo que mostra as ligações perniciosas entre os efeitos das alterações climáticas e o risco de extinção de populações e espécies de aves tropicais, especialmente as que vivem na zona de sub-bosque, a vegetação que está abaixo do dossel florestal formado pelas copas das árvores, mas acima do solo.
Para que essas espécies de aves, como o papa-formiga-de-topete (Pithys albifrons) e o rendadinho-da-amazónia (Willisornis poecilinotus), possam sobreviver, Wolfe defende que mesmo as florestas consideras prístinas têm de ser urgentemente protegidas e é preciso um maior esforço para compreender exatamente como é que as alterações climáticas estão a delapidar a biodiversidade de avifauna nesses locais.
“Estes são passos essenciais para assegurar a persistência de comunidades vulneráveis de aves tropicais no século XXII”, salienta, acrescentando que “receamos que a perda de aves no nosso local de estudo não seja única”, ou seja, que a redução das probabilidades de sobrevivência desses animais possa estar a acontecer noutras regiões neotropicais (desde o México ao extremo mais meridional da América do Sul).
Wolfe argumenta que “esta investigação salienta a necessidade de se identificar refúgios contra as alterações climáticas na Amazónia e noutras regiões neotropicais para salvaguardar a biodiversidade”.
As causas precisas da mortalidade das aves estão ainda por descobrir, com os autores a sugerirem, no entanto, que poderão ser a escassez de alimento, a incapacidade para lidar com temperaturas cada vez mais elevadas ou mesmo uma combinação de ambas.