Debate sobre novo crime de ecocídio e estatuto de refugiado climático cinde direita e esquerda no Parlamento



As propostas de introdução do crime de ecocídio e a criação do estatuto do refugiado climático do PAN, BE e Livre no parlamento foram hoje criticados pelos partidos da direita parlamentar.

Os projetos em debate previam a criação do crime de ecocídio no Código Penal, com penas que os deputados do Chega, CDS e do PSD consideraram desproporcionais, enquanto o PS recordou que a figura do estatuto de refugiado climático já está contemplada na lei de bases do clima.

No debate, a deputada do PAN, Inês Sousa Real, considerou que se assiste “à destruição impune dos ecossistemas sem exigir as devidas responsabilidades por quem toma as decisões”, com “crimes ambientais que afetam a saúde, a economia e a nossa própria sobrevivência”.

Por isso, “consagrar o crime de ecocídio é uma responsabilidade necessária” e teria um “efeito dissuasor e preventivo” num tempo que se está a “invadir e degradar a natureza de modo impune”.

“Todos os anos mais de 75 milhões de pessoas são forçadas a abandonar das suas casas devido a catástrofes climáticas”, pelo que o “conceito de refugiado climático precisa de ser urgentemente reconhecido a par do ecocídio”, afirmou Inês Sousa Real.

Já Fabian Figueiredo (BE), outro dos partidos com uma proposta de criação do estatuto de refugiado climático, criticou o “modelo económico gerador de desigualdade” e pediu uma “organização social e territorial que proteja as pessoas das cheias, dos incêndios ou da erosão”.

O dirigente bloquista defendeu o fim do “financiamento aos responsáveis pelo problema [das alterações climáticas] e começar a resolvê-lo”, porque “não pode ser a população mundial como um todo a pagar por um sistema injusto e premiar os poluidores”.

Isabel Mendes Lopes, líder da bancada do Livre que propôs um regime jurídico da mobilidade ambiental e defendeu a criação do crime de ecocídio, porque as propostas asseguram “recomendações de iniciativas multilaterais” de que Portugal faz parte, considerando que o “impacto das catástrofes ambientais nas pessoas tem de ser uma preocupação transversal das políticas públicas, dentro e fora de portas”.

Hoje em dia, “os responsáveis diretos e indiretos por estes danos saem muitas vezes impunes”, acrescentou.

Por seu turno, Miguel Costa Matos, do PS, partido que propõe a “proteção subsidiária a migrantes sujeitos a eventos climáticos extremos”, considerou que é necessário “diferenciar quem é imigrante por motivos económicos e sociais, que deve estar sujeito a um estatuto, mesmo que essa migração seja agravada pelas alterações climáticas” de “quem procura refúgio porque foi afetado por um fenómeno climático extremo”.

“É uma questão de decência humana”, afirmou, recordando que a lei de bases do clima previa um “estatuto internacional de refugiado climático”.

Sobre as propostas do crime de ecocídio, Ana Santos (PSD) alertou que há uma diretiva europeia (2024/1203) relativa à proteção do meio ambiente através do direito penal que tem de ser transporta até 21 de maio de 2026.

“Para quê antecipar alterações legislativas que devem ser ponderadas?” – questionou a deputada, recordando, tal como CDS, que a Ordem dos Advogados, o Conselho Superior de Magistratura e o Conselho Superior do Ministério Público também levantaram dúvidas sobre o crime de ecocídio.

Em relação ao estatuto de refugiado climático, Ana Santos salientou que o “estatuto e os critérios gerais que definem a proteção internacional não são conceitos definidos pela legislação nacional mas por diplomas de direito comunitário”.

“Além disso, levadas as alterações propostas à letra, tal poderia colocar diversos desafios e problemas sobre o sistema nacional de asilo e gestão das migrações”, porque há uma “fronteira muito estreita entre refugiados e imigrantes económicos”, acrescentou.

Mariana Leitão (IL) considerou que “este é mais um exemplo de marketing e espetáculo político em vez de uma solução real e eficaz” para os problemas ambientais.

Para a IL, trata-se de uma “abordagem que combina populismo puro penal com intervencionismo desnecessário disfarçada de virtude ambiental ao qual se juntam preocupações sérias quanto à sua necessidade, adequação e proporcionalidade”.

O Chega, através da deputada Vanessa Barata, alertou para o “risco da subjetividade jurídica destas propostas aqui trazidas, com a introdução de vários conceitos indeterminados”, quando já existe “um catálogo de crimes ambientais” no Código Penal.

Os “tribunais não aplicam penas de prisão aos crimes ambientais”, a “maioria dos casos relacionados com o crime ambiental não chegaram aos tribunais” e “apenas seis por cento dos crimes contra a natureza foram julgados”.

Alfredo Maia (PCP) considerou que as propostas em debate pretendem “responder a problemas que as atuais gerações já estão a viver”, em particular para “populações inteiras que têm de se deslocar para outras paragens” por causa do clima.

Contudo, alertou para o risco de as propostas de ecocídio poderem contribuir “dupla incriminação tendo que a lei já comina várias condutas”.

O deputado Paulo Núncio (CDS) criticou as propostas de crime de ecocídio, dando o exemplo da proposta do PAN, que “está tecnicamente mal elaborada e iria criar uma insegurança no sistema penal português”.





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