Regulamentação ambiental rigorosa pode comprometer objetivos climáticos e produção de energias renováveis

Um novo estudo publicado na revista Energy Policy desafia a sabedoria convencional em matéria de política ambiental. Os resultados sugerem que a imposição de regulamentos rigorosos sobre a poluição e a fixação de um preço para as práticas prejudiciais ao ambiente podem, inadvertidamente, agravar as alterações climáticas e aumentar os riscos de segurança energética.
Contrariamente às abordagens amplamente aceites que dão prioridade ao rigor regulamentar como principal instrumento de atenuação das alterações climáticas, o estudo destaca o papel fundamental da governação digital e da economia circular no aumento da produção de energias renováveis e na resposta mais eficaz aos desafios climáticos.
A governação digital refere-se à utilização eficaz e responsável dos recursos digitais pelas organizações para atingir objetivos estratégicos. No contexto da economia circular, as organizações pretendem otimizar a utilização dos recursos, minimizando os resíduos e promovendo a reutilização e a reciclagem de materiais para prolongar o seu ciclo de vida.
Este estudo, liderado pela Universidade de Sharjah nos Emirados Árabes Unidos (EAU), em colaboração com colegas académicos na Jordânia e no Paquistão, examina o impacto da digitalização, da economia de ciclo fechado e do rigor regulamentar na governação ambiental das fontes de produção de energia renovável (REP).
Os autores referem que a sua motivação decorre da observação de que a investigação anterior se centrou predominantemente nos determinantes macroeconómicos tradicionais da produção de energias renováveis, negligenciando frequentemente fatores emergentes como o governo digital, a economia circular e o rigor regulamentar ambiental.
Argumentam que, embora as alterações climáticas e as suas consequências – em particular o aquecimento global – sejam preocupações prementes para os governos, as indústrias e o público, a literatura existente tem-se limitado em grande medida a examinar as medidas de política macroeconómica e ambiental destinadas a reduzir as emissões e a mitigar os impactos climáticos.
“No entanto, o papel do governo digital, da economia circular e dos impostos de regulamentação ambiental no REP não foi avaliado adequadamente”, afirmam os autores. A sua pesquisa, portanto, procura investigar a relação entre governança digital, práticas de economia circular, impostos de regulação ambiental e produção de energia renovável.
Para resolver isso, o estudo emprega três técnicas econométricas comumente usadas para lidar com dados complexos e endogeneidade: Two-Stage Least Squares (2SLS), Generalized Method of Moments (GMM) e Smoothed Instrumental Variable Quantile Regression (SIVQR).
A análise dos autores baseia-se em dados extensivos recolhidos em 27 economias europeias no período de 2010 a 2022, abrangendo indicadores relacionados com a produção de energias renováveis, governação digital, economia circular e rigor regulamentar ambiental.
As conclusões dos modelos 2SLS e GMM destacam a influência positiva significativa da governação digital e da economia circular no REP. Em contrapartida, o rigor da regulamentação ambiental não apresenta um efeito estatisticamente significativo.
Além disso, o estudo revela que o desempenho logístico, o crescimento do PIB e a inclusão financeira digital contribuem positivamente para a REP, enquanto as rendas dos recursos naturais e o investimento direto estrangeiro (IDE) estão associados a declínios na REP.
Relativamente aos resultados do SIVQR, os autores concluem que a governação digital afeta positivamente o REP apenas nos quantis mais elevados, enquanto a economia circular demonstra uma relação positiva consistente em todos os quantis. Por outro lado, os impostos sobre a regulamentação ambiental tendem a afetar negativamente o REP na maioria dos quantis.
Os autores apresentam as suas conclusões como contribuições valiosas que oferecem orientações práticas aos decisores políticos sobre a forma como a governação digital, a economia circular e o rigor regulamentar afetam o desenvolvimento das energias renováveis.
Exortam os decisores políticos a reforçar a integração das tecnologias digitais nas operações governamentais, salientando que a digitalização desempenha um papel crucial na facilitação do desenvolvimento e gestão de iniciativas de energias renováveis. Neste contexto, instam os decisores políticos a “fornecer incentivos e criar possibilidades para o desenvolvimento de infraestruturas digitais”.
Além disso, os autores recomendam que os governos “devem melhorar a literacia digital entre os profissionais do sector da energia”, permitindo-lhes interagir eficazmente com as tecnologias emergentes. Apelam também aos governos “para estabelecerem leis e regulamentos que devem promover práticas de governação digital, que são vitais para monitorizar eficazmente os projetos de energias renováveis”.
A ênfase principal é colocada na incorporação dos princípios da economia circular nas políticas de desenvolvimento de energias renováveis (RED). Os decisores políticos são encorajados a conceber quadros que se alinhem com os ideais da economia circular, enquanto os investidores são aconselhados a favorecer projectos que incorporem estes princípios.
“O sector das energias renováveis pode beneficiar dos princípios da economia circular, aumentando o tempo de vida dos artigos de energias renováveis e das centrais elétricas”, escrevem os autores.
Eles sublinham que os governos devem implementar políticas que visem a eficiência dos recursos na produção de energias renováveis. Isto inclui oferecer “incentivos aos empresários” que utilizam materiais reciclados, concebem produtos para durabilidade e reutilização e minimizam os resíduos ao longo do processo de produção.
“Como resultado, através da governação digital, os decisores políticos ajudam a desenvolver um ambiente de transparência e responsabilidade, criando confiança nos investidores e atraindo financiamento para iniciativas renováveis”, referem.
Apesar da importância dos seus resultados, os autores reconhecem francamente “certas limitações” na sua análise. Alertam para o facto de os resultados poderem estar sujeitos a enviesamentos devido à correlação temporal e regional entre os 27 países europeus incluídos no estudo.
Outra limitação que destacam é o âmbito geográfico da investigação, que se limita às economias europeias. Observam que estes países diferem significativamente dos países da Ásia, África e Américas em termos de sistemas políticos, estruturas económicas, quadros institucionais e contextos sociais. Como tal, recomendam que a investigação futura efetue análises comparativas entre estas regiões globais para aumentar a generalização das conclusões.