Intenso comércio internacional e falta de regulação ameaçam sobrevivência dos calaus africanos
Bicos grandes, coloridos e de muitas formas. Estes são dos traços mais distintivos dos calaus, aves icónicas da fauna africana (pense no Zazu de “O Rei Leão”) e asiática, mas são também as características que os tornam mais atrativos para o comércio internacional.
Um estudo publicado na revista ‘Biological Conservation’ alerta que o comércio internacional está a ameaçar a sobrevivência dessas espécies de aves, especialmente das africanas, para as quais a proteções legais existentes são parcas.
Em 1992, a maioria dos calaus asiáticos foram incluídos na Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Fauna e Flora Selvagens (CITES), que estipula proteções para determinadas espécies. O objetivo é que a sua comercialização não põe em risco as populações selvagens e as espécies.
Embora a maioria dos calaus asiáticos tenha recebido proteção da CITES em 1992, as espécies africanas continuam amplamente desprotegidas e o seu comércio internacional a não estar regulado.
Os investigadores, com base em dados do serviço de pescas e vida selvagem dos Estados Unidos da América (USFWS), de 1999 a 2024, revelam que quase 95% dos calaus comercializados internacionalmente são espécies oriundas de África e que o seu comércio aumentou “significativamente” nesse período. Por outro lado, o comércio de calaus asiáticos tem mantido constância, algo atribuído às regulações impostas pela CITES.
De acordo com os dados, os Camarões foram os principais exportadores de calaus africanos para os EUA ao longo desses 25 anos, representando cerca de 25% de todos os calaus que entraram no país americano. A Tanzânia surge como segundo maior exportador, seguida pelo Senegal e pela Guiné.
Até 2004, a maioria dos calaus enviados para os EUA provieram da África Oriental, mas de então até 2020 a principal origem eram os países da África Ocidental. Contudo, após 2021, os Camarões e a República Democrática do Congo surgiram como os principais exportadores de calaus africanos para os EUA.
Revela a investigação científica que cerca de 45% de todos os calaus exportados para o país americano eram animais vivos, e os investigadores pensam que terão sido capturados diretamente nos seus habitats naturais, uma vez que, como dizem, é muito difícil criar calaus em cativeiro.
No entanto, o comércio dentro de África é também motivo de preocupação. A maioria dos calaus comercializados entre os países africanos envolve a decapitação das aves, pois o intento principal é vender os seus icónicos bicos.

Cientistas e conservacionistas alertam que a crescente procura por calaus africanos tem provocado declínios populacionais por todos os países onde essas aves ocorrem. Todos os géneros de calaus são comercializados internacionalmente, mas mais de 80% do comércio afeta sobretudo quatro: Ceratogymna, Bycanistes, Tockus e Lophoceros.
Os autores desta investigação estimam que o comércio de calaus Ceratogymna e Bycanistes para os EUA provavelmente será superior ao comércio global de todos os géneros de calaus asiáticos antes de terem sido protegidos pela CITES.
Entre as espécies mais comercializadas estão duas classificadas como vulneráveis ao risco de extinção pela União Internacional para a Conservação da Natureza: Bycanistes cylindricus e Ceratogymna elata. Para essas, a falta de regulação do seu comércio representa uma ameaça existencial.
Num texto publicado na página online da organização International Bird Conservation Partnership, Nico Arcilla, um dos autores do artigo, defende, refletindo a urgência dos resultados do estudo, que o calaus africanos devem ser legalmente protegidos ao abrigo da CITES, em particular no Apêndice II, constituído, essencialmente, por espécies de fauna e de flora que, embora não o estejam nesse momento, possam vir a ser empurradas para o limiar da extinção se a sua comercialização não foi devidamente regulada.
Contudo, mesmo isso poderá não ser suficiente. No artigo, Arcilla e os colegas escrevem que é necessário reduzir a procura por calaus nos EUA, que é um dos principais motores do comércio internacional de todas as espécies dessas aves.
Importantes dispersores de sementes e parte integrante da biodiversidade que caracteriza os locais onde vivem, o desaparecimento dos calaus teria amplas consequências negativas, para os ecossistemas e para as comunidades que mais deles dependem.