Exclusivo Green Savers: a tragédia da Madeira pode repetir-se?



Depois da tragédia de 20 de Fevereiro último, que vitimou 42 pessoas, a Ilha da Madeira voltou a passar por momentos de pânico na última quinta-feira, quando um temporal provocou inundações na ilha, desalojou pelo menos18 pessoas e foi responsável por estragos avultados no comércio.

Apesar de a ilha ter já, aparentemente, regressado à normalidade, há um dado que não pode ser ignorado. Se no dia 20 de Fevereiro a precipitação teve um pico máximo de 51,3 mm/h, na última quinta-feira os valores ficaram-se pelos 27,8 mm/h.

Mas, se recuarmos alguns anos, percebemos que a 27 de Setembro de 1989 houve uma precipitação, também na Madeira, de 34,3 mm/h e, a 18 de Setembro do ano seguinte, de 37,8 milímetros em apenas quarenta minutos. Ainda assim, estas duas sessões de chuva forte não chegaram nem perto dos estragos provocados na quinta-feira. O que está a mudar, então, na Ilha da Madeira?

O Green Savers foi ouvir Hélder Spínola, membro da direcção nacional da Quercus e um dos responsáveis pelo núcleo da Madeira e Raimundo Quintal, presidente da Amigos do Parque Ecológico do Funchal, para perceber por que razão o temporal de quinta-feira fez tantos estragos e, mais importante, se existe motivo para nos preocuparmos no futuro?

“Houve um factor que agravou as consequências destas chuvas no arrastamento de solo e rochas até à zonas mais baixas do Funchal: os incêndios que destruíram a vegetação na costa sul da ilha da Madeira, em particular nas serras sobranceiras ao Funchal, Câmara de Lobos e Ribeira Brava”, começa por explicar Helder Spínola.

“As serras sem vegetação estavam mais desprotegidas do efeito erosivo das chuvas – mais do que antes do temporal de 20 de Fevereiro – e, como não houve prevenção, vigilância e combate eficaz aos incêndios florestais, acabamos agora por ter, na Madeira, um aumento do risco de cheia depois de 20 de Fevereiro”, continuou o responsável.

Uma opinião corroborada por Raimundo Quintal, que explica que as cheias de Fevereiro e os incêndios de Agosto são uma “dupla terrível”.

“A 13 e 14 de Agosto ardeu 11% da Ilha da Madeira… Foi um impacto muito grande no ecossistema da alta montanha, todo o trabalho que vinha a ser feito sofreu um golpe muito duro… foi um desastre ecológico mais grave que o de 20 de Fevereiro”, argumentou.

Segundo Raimundo Quintal, a partir de agora a situação fica “bem mais complicada” e poderá agravar-se no futuro.

Ambos os activistas ambientais são da opinião que a reconstrução da ilha continuará a cometer os mesmos erros das últimas décadas. “[Falo da] artificialização e estrangulamento dos leitos das ribeiras e ribeiros. Esta situação leva-nos a temer que, sempre que ocorram chuvas mais intensas, o risco de cheia continuará a ser muito elevado”, avisa Hélder Spínola.

Paralelamente a todos os perigos ecológicos, Raimundo Quintal fala de uma dupla “oportunidade perdida”. “Poderíamos ter feito uma grande aposta para fazer o reordenamento do território e retirar as populações de risco para áreas mais seguras… há apartamentos fechados no Funchal, não há falta de infra-estruturas”, avança.

Por fim houve também, ao longo destes oito meses, uma lacuna na educação cívica. “Não se realizaram acções de formação para saber como reagir a uma situação destas… a população não sabe o que fazer”, explica o ambientalista.

E dá um exemplo: “O Governo regional disse às pessoas para manterem a calma e ficarem onde estavam, mas eu estava na baixa do Funchal na quinta-feira e nem os próprios funcionários da Câmara do Funchal e o Governo regional ficaram onde estavam… estava tudo vazio”, relembra.

E, no futuro, o que poderá acontecer? “Com as linhas de água canalizadas e apertadas, e com os leitos de cheia ocupados com estradas, escolas, quartéis de bombeiros, centros de saúde e habitações, a violência das águas torrenciais é maior e, portanto, mais capaz de arrastar terras e pedras e galgar as margens impostas pelo homem”, conclui Hélder Spínola.

Há motivos para preocupação, ou terá sido o temporal de quinta-feira uma situação isolada? Deixe-nos o seu comentário aqui ou no Facebook.





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