Extração de metais raros em águas profundas tem impacto na vida marinha durante décadas



A vida marinha nas profundezas do oceano pode levar décadas a recuperar do impacto da extração de metais raros em águas profundas, segundo uma nova investigação.

Um estudo publicado na revista Nature concluiu que o local de um teste de extração mineira em águas profundas realizado em 1979 no Pacífico Norte ainda apresentava níveis mais baixos de biodiversidade – variedade de espécies – do que os locais vizinhos não perturbados 44 anos mais tarde.

A investigação foi efetuada em 2023 e 2024, a 5000 m abaixo da superfície do Oceano Pacífico, na zona de Clarion-Clipperton. Esta zona situa-se sensivelmente a meio caminho entre o México e o Havai e é uma região vasta, plana e profunda do fundo do oceano, conhecida como “planície abissal”.

Os cientistas do Centro Nacional de Oceanografia de Southampton conduziram a investigação no âmbito de um consórcio que inclui o Museu de História Natural de Londres, o British Geological Survey e a Universidade Heriot-Watt de Edimburgo, o Comité Conjunto para a Conservação da Natureza, a Associação Escocesa para a Ciência Marinha de Oban, Argyll, a Universidade de Liverpool, a Universidade de Plymouth e a Universidade de Southampton.

Os parceiros fazem parte do Seabed Mining and Resilience to Experimental Impact (SMARTEX), um projeto de investigação financiado pelo Natural Environment Research Council do Reino Unido. O SMARTEX foi criado para determinar o impacto ecológico, no Oceano Pacífico central, da exploração mineira em águas profundas de depósitos minerais conhecidos como nódulos, que contêm metais raros como o cobalto, o manganês e o níquel, elementos essenciais para as baterias dos automóveis elétricos e outros dispositivos eletrónicos.

Mark Hartl, biólogo marinho da Universidade Heriot-Watt, especializado em ecotoxicologia – a forma como os organismos são expostos aos poluentes e sofrem o seu impacto – faz parte do consórcio SMARTEX e é coautor da investigação.

O investigador explica que “estes nódulos são depósitos minerais do tamanho de uma batata que se foram acumulando em camadas ao longo de milhares de anos. As empresas mineiras querem explorá-los para obter metais essenciais como o cobalto e o níquel. Mas há muitas perguntas sem resposta. Por exemplo, sabemos que os nódulos produzem oxigénio. Se forem removidos, isso irá reduzir a quantidade de oxigénio nas profundezas do mar e afetar os organismos que aí vivem? Qual é o efeito da exposição dos animais a plumas de sedimentos contendo metais, agitadas durante o processo de extração mineira? Estas são algumas das questões a que estamos a tentar responder”.

O papel de Hartl envolveu a investigação da forma como os organismos de profundidade são afetados pela exposição aos sedimentos e pelo stress associado, para ajudar a quantificar os impactos menos óbvios da exploração mineira de profundidade. Neste contexto, desenvolveu um procedimento para medir a forma como a exploração mineira pode danificar o ADN – os genes – dos peixes de profundidade. Este trabalho foi publicado na revista Deep Sea Research.

“Isto nunca tinha sido feito antes”, explica Hartl, ”por isso não tínhamos dados de base para comparar os efeitos da extração mineira. Estamos atualmente a otimizar os testes para outros sinais de stress aplicáveis ao mar profundo”, acrescenta.

Estima-se que mais de 21 mil milhões de toneladas de nódulos se encontrem no fundo do mar da Zona Clarion-Clipperton, que se estende por mais de 6 milhões de quilómetros quadrados – cerca de 25 vezes o tamanho do Reino Unido.

Estes campos de nódulos sustentam “comunidades animais e microbianas altamente especializadas”, afirmam os investigadores. Estas incluem organismos unicelulares gigantes com conchas calcárias (denominados “foraminíferos”); pepinos-do-mar e peixes altamente especializados – e muitas espécies que dependem dos nódulos como a única superfície dura onde se instalam.

Os investigadores estudaram uma área no fundo do oceano onde foi colocada uma máquina mineira experimental de 14 metros de comprimento em março de 1979. Esta extraiu uma quantidade desconhecida de nódulos durante quatro dias, utilizando um ancinho mecânico rotativo no fundo do mar que apanhava os nódulos e os transferia através de um transportador para um triturador.

Os cientistas concluem que, quatro décadas após este teste de extração mineira, “os impactos biológicos em muitos grupos de organismos são persistentes”, embora algumas espécies tenham começado a recuperar.

Os sinais físicos do teste também ainda são visíveis, incluindo áreas do fundo do mar que foram despojadas de nódulos e marcas visíveis do rasto do veículo mineiro.

O autor principal da investigação e chefe da expedição, Professor Daniel Jones do Centro Nacional de Oceanografia, explica que “para abordar a questão crucial da recuperação da extração mineira em águas profundas, temos primeiro de olhar para o passado e utilizar antigos testes de extração mineira para ajudar a compreender os impactos a longo prazo. Quarenta e quatro anos mais tarde, os rastos da exploração mineira têm um aspeto muito semelhante ao que tinham quando foram feitos pela primeira vez, com uma faixa de 8 metros de largura do fundo do mar sem nódulos e dois grandes sulcos no fundo do mar por onde a máquina passou. O número de muitos animais foi reduzido dentro dos rastos, mas vimos alguns dos primeiros sinais de recuperação biológica”.

Já o coautor, Adrian Glover, do Museu de História Natural, revela que a “teoria ecológica geral prevê que, após uma perturbação, qualquer ecossistema passará por uma série de fases sucessivas de recolonização e crescimento. No entanto, até este estudo, não fazíamos ideia das escalas de tempo deste processo crítico nas regiões mineiras de profundidade, nem da forma como diferentes partes da comunidade respondem de diferentes maneiras”.

“Os nossos resultados não respondem à questão de saber se a exploração mineira em águas profundas é socialmente aceitável, mas fornecem os dados necessários para tomar decisões políticas mais bem informadas, tais como a criação e o aperfeiçoamento de regiões protegidas e a forma de monitorizar os impactos futuros”, acrescenta.

A extração mineira em águas profundas está atualmente proibida ao abrigo de uma moratória internacional – suspensão – enquanto a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA) – que regula e gere todas as atividades relacionadas com os minerais nos fundos marinhos internacionais – desenvolve o quadro jurídico, financeiro e ambiental para sustentar qualquer potencial exploração comercial total, quando esta ocorrer. Uma questão fundamental para esta decisão é saber se os ecossistemas de profundidade podem recuperar das perturbações causadas pela atividade mineira, afirma o Centro Nacional de Oceanografia.

O Centro Nacional de Oceanografia acrescenta que a extração mineira em águas profundas está a ser cada vez mais considerada como uma solução potencial para fornecer os metais cruciais necessários para o avanço da tecnologia global e para impulsionar a transição para um futuro de energia zero.

No artigo publicado na Nature, os investigadores explicam que a extração de nódulos deverá causar “impactos imediatos” na superfície do fundo do mar e no habitat no caminho dos veículos coletores. Este impacto inclui perturbações mecânicas, nomeadamente a remoção de espaços de superfície dura para as espécies viverem debaixo do leito marinho e a compactação dos sedimentos. Outro impacto é a criação de plumas de sedimentos que podem ter “impactos significativos nos ecossistemas” para além das áreas imediatamente minadas, afirmam.

 

 

 






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