Incêndios: Estamos a gastar na limpeza o que se podia investir na gestão da floresta

A ANEFA – Associação Nacional de Empresas Florestais, Agrícolas e do Ambiente considera que os gastos feitos anualmente na “limpeza de erva”, no âmbito da prevenção de incêndios rurais, deveriam ser investidos na gestão da floresta.
“O dinheiro que podíamos investir na floresta, na gestão e na condução da floresta, como deve ser, estamos a investir na limpeza da erva todos os anos. Portanto, isto não é uma solução, é um recurso, mas não é uma solução até porque está mais do que provado, até pelas diferentes comissões que estudaram o assunto quando houve os grandes incêndios, que nada disso pararia os incêndios que ocorreram”, afirmou o presidente da associação.
Pedro Serra Ramos defendeu, em declarações à Lusa, que “está na altura de rever a legislação”, embora seja preciso esperar pelo novo Governo para que isso aconteça.
“Este ano, ainda por cima, é um ano em que, como choveu muito, há muita erva. Se entretanto começar a aquecer muito toda ela vai secar e, portanto, andamos sempre a gastar dinheiro”, apontou.
Além das dificuldades dos proprietários na contratação de empresas para a limpeza, Pedro Serra Ramos admitiu que houve “um aumento geral de tudo”, da mão-de-obra aos custos de equipamentos, e, “por isso, os preços têm que subir” e “não há outra maneira de o fazer”.
O diretor-geral da Florecha, Rui Igreja, notou que, além das dificuldades de trabalhadores, “os equipamentos também não são infindáveis”, para a quantidade de trabalho, e o aumento do ordenado mínimo contribui para aumentar os custos, naturalmente refletidos nos clientes.
Em termos de aumentos, o sócio-fundador da empresa com sede na Chamusca, distrito de Santarém, não arriscou percentagens, mas avançou que a limpeza manual de um hectare (ha) “anda pelos mil euros”, dependendo da dificuldade e do tipo de terreno, mas se for possível mecanizar “desce substancialmente para 200 ou 300 euros”.
O empresário admitiu que “um operador com motorroçadora é capaz de, no mercado, andar entre os 120 e os 150 euros”, mas o preço final depende sempre muito do tipo de solo e do trabalho a efetuar. Também reflete a “economia de escala” e quanto mais pequeno o terreno, “maior será o valor por hectare”.
O presidente da Federação Nacional de Associações de Proprietários Florestais (FNAPF), Luís Damas, questionado sobre o custo por ha, ironizou, referindo que “limpar o estádio de Alvalade ou o estádio da Luz com ervas pode custar até mil euros, se for inclinado ainda pode chegar a mais” ou ficar por metade do valor, mas tem “sempre a ver” com o ordenado mínimo, a inflação, combustíveis e materiais.
O também dirigente da Associação dos Agricultores de Abrantes, Constância, Sardoal e Mação admitiu que, para se retirar combustível ao pé das casas e das estradas, “já se está a mecanizar muito”, mas mesmo assim ainda se depende de mão-de-obra, como as sete equipas de sapadores, com 35 operacionais, da sua associação, pelo que também sentem “essa dificuldade”.
Segundo dados da AGIF – Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais, “a gestão de combustível reportada em 2023 atingiu uma execução global de 85.536 ha (mais 7.768 ha face a 2022 – um aumento de 10%), superando-se em 1% (543 ha) o valor total estabelecido pelas entidades”.
Relativamente ao Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), a execução “manteve-se praticamente idêntica ao ano anterior (29.973 ha)”. Das 14.319 situações de incumprimento sinalizadas pela GNR – 47% das quais localizadas nas freguesias prioritárias, ou seja, 5.126 sinalizações – “cerca de 36% não tinham sido regularizadas”, refere-se no relatório.
O relatório de 2024 será entregue em breve pela AGIF à Comissão Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais, para recolha de comentários antes de ser divulgado, adiantou à Lusa fonte do organismo.
A agência para já não possui dados sobre a gestão de combustível (limpeza de terrenos no âmbito da prevenção de incêndios) efetuada pelos municípios em substituição dos proprietários que não limpam os seus terrenos, mas espera que no próximo ano possa dispor de uma plataforma interoperável que permita fazer a monitorização dos programas municipais.
Fonte oficial do Ministério da Agricultura e Pescas referiu que o gabinete do secretário de Estado das Florestas, Rui Ladeira, está a acompanhar com elementos do setor a situação, mas para já, após a prorrogação do prazo do fim de abril para 31 de maio, não há decisão quanto a novo prolongamento, até por duas semanas de calor bastarem para a vegetação secar.