Mutação em plantas de Cabo Verde sugere como culturas podem resistir ao sal

Um estudo científico sobre amostras de plantas recolhidas em Cabo Verde dá novas sugestões para desenvolvimento de culturas agrícolas em solos onde haja muito sal, por influência da água do mar, lê-se no artigo, consultado hoje pela Lusa.
“As nossas descobertas revelam um método baseado no conhecimento para desenvolver culturas resistentes ao sal, o que pode ser atraente tanto para a agricultura convencional como para a agricultura biológica”, indicam os cientistas, ao detalhar as experiências laboratoriais realizadas.
O trabalho “Evolução paralela da tolerância à salinidade” em amostras da planta Arabidopsis thaliana recolhida em Cabo Verde foi publicada na última edição da revista Science Advances, disponível na Internet.
O artigo é partilhado por 15 autores de universidades e centros de investigação de França e Espanha e, embora não seja a primeira vez que a resistência de plantas à salinidade seja estudada, o estudo oferece provas genéticas e bioquímicas que podem fundamentar novas abordagens biotecnológicas.
“A salinização dos solos representa uma ameaça relevante à agricultura” e, no caso, as Ilhas de Cabo Verde “localizam-se a 600 quilómetros da costa de África e caracterizam-se por ambientes áridos e solos de elevada salinidade”, assinalam os autores.
“Descobrimos que as plantas Arabidopsis thaliana nativas destas ilhas acumulam ‘glucuronil-manose’, que as protege do stress salino”, um composto cuja produção os cientistas ligam a um gene específico, designado GH38cv.
As plantas portadoras de mutações de GH38cv “não apresentam defeitos de crescimento, nem de aptidão ou de resistência biótica em condições laboratoriais padrão, mas apresentam melhores taxas de germinação, raízes mais longas, melhor estado hídrico e maior aptidão do que as plantas não mutadas quando expostas ao stress salino”.
Segundo o artigo, as mutações “evoluíram independentemente em duas ilhas distintas dentro do arquipélago de Cabo Verde”, Santo Antão e Fogo, “ilustrando um exemplo de evolução paralela para a tolerância ao sal neste ambiente”.
“As nossas descobertas podem ter implicações práticas para a agricultura (…). Em resumo, tanto a síntese como a aplicação de ‘glucuronil-manose’, bem como a edição genética dirigida de GH38cv, oferecem estratégias promissoras inspiradas na natureza para aumentar a tolerância ao sal em culturas e plantas ornamentais através de abordagens biotecnológicas”, concluem.
A insularidade de Cabo Verde é um dos fatores que contribui para a sua biodiversidade e que tem despertado interesse científico em diversos domínios.
Em março, um outro grupo de cientistas indicou que um tipo de tamareira que se supõe já só existir em Cabo Verde pode ajudar árvores semelhantes a adaptarem-se às mudanças climáticas e outros problemas.