Não são só a seleção natural e as mutações aleatórias que movem a evolução dos organismos



Equipa internacional liderada pelo cientista português João Picão Osório, do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (CE3C), aprofunda conhecimento sobre as forças que impelem e condicionam a evolução dos organismos.

Ao analisarem o desenvolvimento de tecidos de dois grupos distintos de pequenos vermes (nemátodes), os investigadores descobriram que a forma como as células respondem a mutações desempenha um papel determinante no seu destino.

Em cada grupo, certas células mostraram-se muito mais sensíveis a pequenas variações genéticas ou ambientais, impulsionando mudanças rápidas. Contudo, noutras essa sensibilidade era menor, tornando a evolução mais lenta ou mais estável.

A descoberta, publicada recentemente na revista ‘PNAS’, mostra que é preciso perceber como as alterações genéticas se manifestam no corpo dos organismos para se compreender os diferentes caminhos que a evolução pode tomar.

A evolução é um processo transformador que, ao longo do tempo, vai mudando, em maior ou menor escala, os organismos, atuando, por exemplo, sobre aspetos como a cor, o tamanho e a resistência a doenças. Alguns desses traços são transmitidos pelo material genético dos progenitores durante a reprodução, e, se se provarem vantajosos, vão-se tornando mais comuns entre a população.

Ao longo de várias gerações, essas mudanças podem ser de tal forma impactantes que podem dar origem a novas espécies.

A evolução pode ser vista como um processo que resulta da influência de fatores internos, como mutações aleatórias nos genes, ou de fatores externos, como a pressão da seleção natural no ambiente em que o organismo vive. No entanto, este trabalho vem explorar uma outra camada de complexidade: a predisposição de certos tecidos e células para adquirirem funções diferentes devido às mutações que vão acumulando.

Assim, não são apenas as forças do acaso e da seleção natural que determinam a evolução de um organismo, mas também o modo como a sua biologia e desenvolvimento o pode enviesar.

“Este estudo demonstra a importância de como a estrutura dos processos de desenvolvimento podem enviesar os caminhos evolutivos de grupos de animais que divergiram há cerca de 160 milhões de anos”, explica, em comunicado, João Picão Osório.

“Desta forma, se investigarmos as características dos seres vivos que têm maior probabilidade de mudar enquanto crescem e se desenvolvem, poderemos prever como esses organismos podem evoluir ao longo de períodos muito longos”, salienta o investigador.

O desenvolvimento dos organismos pode atuar como uma “força invisível”. Isto é, pode facilitar certos caminhos evolutivos, tornando-os mais prováveis, ou, pelo contrário, bloquear outros, impedindo que atinjam maior vantagem.

Neste estudo, a força invisível chama-se Wnt, uma família de proteínas que atuam como mensageiras entre as células, indicando-lhes como se devem comportar: quando se dividem, que função devem assumir e para onde têm de se mover dentro do organismo.

Nos nemátodes investigados, dos géneros Caenorhabditis e Oscheius, a Wnt cria um gradiente de mensagens ao longo do corpo levando a que, de acordo com a posição de cada célula nesse gradiente, algumas se tornem mais sensíveis a pequenas alterações de origem genética ou ambiental, enquanto outras permanecem mais estáveis.

Em Caenorhabditis, as células que estão na franja deste gradiente são mais vulneráveis a mudanças, a alterações rápidas e novas possibilidades evolutivas. Já em Oscheius, o gradiente de Wnt reduz-se e altera as células que são sensíveis a variação. Com base nessas observações, os autores do estudo sugerem que a evolução não depende apenas das mutações que ocorrem, mas também da posição e da sensibilidade das células que as sofrem durante o desenvolvimento.

A equipa considera que esta investigação ajuda a perceber os diferentes caminhos evolutivos que organismos de linhagens próximas podem tomar, mesmo habitando em condições semelhantes.

De forma mais ampla, permite compreender melhor as interações entre dois fenómenos que atuam na adaptação das diferentes formas de vida ao longo do tempo: a microevolução, que ocorre ao nível das espécies e das populações, e a macroevolução, que explica as grandes diferenças que surgem ao longo de milhões de anos.






Notícias relacionadas



Comentários
Loading...