Pantanal torna-se “refúgio climático” para jaguares que fugiram de incêndio

Em 2020, uma série de incêndios de grandes dimensões devastou 27% da vegetação do Pantanal, considerado a maior zona húmida de água doce do planeta, abarcando partes do Brasil, da Bolívia e do Paraguai.
As chamas foram também responsáveis pela morte de, pelo menos, 17 milhões de animais vertebrados, especialmente répteis. Um grupo de cientistas procurou perceber os impactos sofridos pelas populações de jaguares (Panthera onca), um grande felídeo endémico das Américas Central e do Sul, encontrado desde o México ao norte da Argentina.
Num artigo publicado em julho na revista ‘Global Change Biology’, a equipa de investigadores dos Estados Unidos da América (EUA) e do Brasil, através da análise de imagens obtidas por câmaras de foto-armadilhagem, descobriu que os jaguares migraram para uma área no norte do Pantanal após os incêndios de há cinco anos.
Com cerca de 14 mil hectares, essa zona, que está alagada durante metade do ano, já antes do fogo tinha a maior densidade populacional de jaguares do mundo, que aumentou ainda mais com a chegada dos novos animais que procuravam locais que não tivessem sido queimados pelas chamas.
“Encontrar ainda mais jaguares e outros mamíferos na área de estudo depois do incêndio e da seca extrema de 2020 sugere que poderá servir de refúgio climático, atenuando os efeitos de eventos climáticos extremos”, explica, em comunicado, Charlotte Eriksson, da Universidade Estadual do Oregon (EUA) e primeira autora do estudo.
Investigações anteriores feitas por Eriksson e colegas haviam revelado que a população de jaguares nesse local do Pantanal era especialmente peculiar, uma vez que a sua dieta era composta maioritariamente por organismos aquáticos, como peixes e caimões, e não por animais terrestres como noutros grupos da espécie que vivem fora de zonas húmidas. Além disso, descobriram também que esses jaguares eram mais sociáveis e tolerantes face à presença de outros animais da espécie.
O “refúgio climático” está praticamente isolado, a cinco horas da vila mais próxima e os humanos só lá conseguem chegar de barco.
Recordando o trabalho de campo feito nesse local, e a abundância de vestígios de jaguares que encontraram, Eriksson diz que “nunca tinha estado num lugar onde a presença de um grande carnívoro é tão óbvia”.
A investigação revela que, antes e depois dos incêndios de 2020, a densidade de jaguares a viver nessa área manteve-se praticamente inalterada, “indicando que os jaguares residentes sobreviveram aos fogos e mantiveram as suas áreas de distribuição”. Aos residentes, foram-se juntando, aos poucos, “imigrantes” vindos de zonas afetadas, “indicando que a área serviu como refúgio climático”, dizem os cientistas, e que apresenta condições propícias à prosperidade da espécie.