Recuo nas áreas marinhas protegidas nos Açores seria “um tiro no pé”

O eventual recuo no projeto das novas das áreas marinhas protegidas nos Açores seria “um tiro no pé” e uma medida “negativa” para a imagem da região, considerou hoje José Neto Azevedo, professor auxiliar da Universidade dos Açores (UAç).
“Parece-me que é um tiro no pé e até, do ponto de vista da imagem dos Açores, extremamente negativo dizer que, afinal, a gente tem áreas protegidas, mas pode-se pescar!”, afirmou o docente universitário, doutorado em ecologia animal, ouvido na Comissão de Assuntos Parlamentares, Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CAPAD’S), reunida em Ponta Delgada.
A audição de José Neto Azevedo ocorreu na sequência de uma proposta apresentada pela bancada do PS (o maior partido da oposição nos Açores), que pretende alterar o diploma aprovado em outubro de 2024 na Assembleia Legislativa Regional, sobre a rede de áreas marinhas protegidas dos Açores (RAMPA), no sentido de permitir que a pesca do atum possa continuar a ser feita nas zonas de reserva total.
“É muito importante que uma determinada proporção das áreas marinhas protegidas seja de proteção total”, disse o professor da academia açoriana, que discorda da exceção que se pretende agora introduzir ao diploma inicial, que determina a existência de 30% de áreas marinhas protegidas no arquipélago.
Segundo explicou aos deputados, é necessário criar medidas restritivas à atividade piscatória no arquipélago, sob pena de, a este ritmo, a pesca poder deixar de ter futuro na região: “a pesca, se continua como está, não tem futuro! Nós estamos a extrair muito mais do que aquilo que os ecossistemas conseguem repor”.
Os deputados do PS alegam, porém, que a pesca do atum, que é efetuada com arte de salto e vara (cada pescador usa apenas uma cana e um anzol), já é suficientemente seletiva e amiga do ambiente, além de ser um tipo de captura “sustentável”, comparada, por exemplo, com as redes de cerco utilizadas pelos atuneiros espanhóis.
“É verdade que é uma pesca extremamente seletiva, mas isso não significa que seja sustentável”, ressalvou o especialista durante a audição parlamentar, lembrando que a arte de pesca com salto e vara “é muito pouco destrutiva”, mas que a intensidade com que a é feita é que determina “se é sustentável ou não!”
A proposta apresentada pela bancada socialista no parlamento açoriano alerta também para as consequências económicas que a proibição da pesca nos bancos submarinos açorianos, como Princesa Alice, D. João de Castro ou os ilhéus das Formigas, poderão vir a ter junto da frota atuneira dos Açores e da própria indústria conserveira.
Questionado a esse propósito, José Neto Azevedo minimiza, no entanto, esses efeitos: “ninguém está a dizer que não se pesca mais atum nos Açores! As capturas mantêm-se! O que vai acontecer é que não pescam em determinados sítios!”.
Os dois maiores partidos nos Açores (PSD e PS), já encetaram, entretanto, negociações entre si, no sentido de evitar um eventual recuo no projeto das áreas marinhas protegidas, e também um previsível embaraço junto das instâncias europeias, que, na altura, elogiaram as autoridades regionais pelo aumento das áreas marinhas protegidas nas ilhas.
Segundo apurou a Agência Lusa, junto de fontes dos dois partidos, o acordo poderá passar pelo adiamento da entrada em vigor da nova rede de áreas marinhas protegidas, de forma a permitir que a pesca do atum possa continuar a realizar-se nos bancos submarinos, pelo menos, durante mais algum tempo.
Os deputados vão ouvir esta terça-feira, ainda a propósito deste tema, representantes da Associação de Operadores Marítimo Turísticos dos Açores (AOMA) e da Associação dos Industriais de Conservas de Peixe dos Açores (Pão do Mar).