Reportagem: Como equilibrar o desenvolvimento com a conservação na Reserva Mundial de Surf da Ericeira
“Praias de águas cristalinas / De areias da cor do ouro / São beijadas pelo mar / Em espuma de rendas finas / São verdadeiros tesouros / Que sempre nos faz voltar”. Estes são alguns dos versos da canção de Gabriel Cardoso que viralizou a expressão “Ericeira, onde o mar é mais Azul” e que descreve na perfeição aquilo que se vê quando se chega a essa vila onde são poucos os recantos em que não se vislumbra esse cerúleo ondulante.
Há quem diga que o nome Ericeira significa, na origem, “terra de ouriços”, em referência aos numerosos ouriços-do-mar que abundavam nas suas praias, mas investigações mais recentes apontam o ouriço-cacheiro e não o do mar como inspirador do nome. Deve-se ao porto desta vila o seu desenvolvimento, noutros tempos habitada por um grupo étnico denominado jagoz, diferente das aldeias vizinhas porque vivia quase exclusivamente do mar.
No entanto, há muito que o Surf e atividades por ele impulsionadas têm sido a fonte de rendimentos de muitos, principalmente desde que a 14 de outubro de 2011 foi designada Reserva Mundial de Surf pela organização Save the Waves Coalition. Ao longo de quatro quilómetros de costa no concelho de Mafra, atravessando as freguesias da Ericeira, Santo Isidoro e Encarnação, podemos encontrar sete ondas de classe mundial, com características distintas: Pedra Branca, Reef, Ribeira d’Ilhas, Cave, Crazy Left, Coxos e São Lourenço.
Primeira Reserva Mundial de Surf da Europa
A nível mundial, a Ericeira foi a segunda Reserva de Surf a ser reconhecida, mas na Europa foi a primeira. “É uma homenagem a todos os pescadores locais que ao longo dos séculos respeitaram e elogiaram este belo oceano. É também assumir a responsabilidade pela sua preservação, fazendo com que este valioso património universal continue a ser usufruído na íntegra pelas gerações vindouras, tal como o foi para os pioneiros do Surf em Portugal, que se maravilharam com a sua descoberta”, sublinha a Save the Waves Coalition.
É esta organização sem fins lucrativos de âmbito internacional, orientada para a preservação das ondas e dos ecossistemas costeiro, que através do programa “World Surfing Reserves” (WSR), identifica, designa e preserva ondas excecionais, zonas de Surf e ambientes envolventes em todo o mundo. Todos os anos, por regra, apenas uma reserva é reconhecida e classificada.
E que atributos foram tidos em conta para a atribuição do galardão à Ericeira? Segundo a Save the Waves Coalition, a vila é uma zona de Surf de classe mundial que tem uma variedade de ondas que vão desde beachbreak a poderosos reef breaks. “Algumas das quebras notáveis nesta área incluem pontos emblemáticos como Ribeira d’Ilhas e Coxos, entre outros”, aponta no seu site.
A organização salienta também como fatores cruciais o grupo étnico jagoz, diferente dos povos mais próximos, o facto de a comunidade de surfistas do núcleo desta Reserva estar aqui há anos, “vivendo tranquilamente da qualidade e variedade do Surf oferecido regularmente”, de a Ericeira ser um destino há muito e de hoje ser o lar de inúmeras escolas de Surf e outras empresas relacionadas com a modalidade, além de competições regionais e internacionais.
Rica em biodiversidade marinha e terrestre
Em termos ambientais, o litoral é dominado por falésias rochosas e pontuado por praias localizadas em pequenas baías. As águas da costa da Ericeira “são das mais ricas em biodiversidade do mundo”, afirma a organização. A ressurgência “mistura uma quantidade enorme de nutrientes ricos regularmente”, acrescenta, sublinhando que Portugal tem cerca de mil espécies marinhas e pesca comercialmente sardinha, atum e cavala.
Diogo Batalha, biólogo, explica à Green Savers que a Reserva Mundial da Ericeira é rica em biodiversidade, tanto marinha quanto terrestre. Na zona costeira, encontram-se várias espécies de algas, como as algas castanhas (Phaeophyceae) e as vermelhas (Rhodophyta), “que são importantes para o equilíbrio ecológico”. A fauna marinha, continua, inclui várias espécies de peixes, moluscos, crustáceos e aves marinhas, como a gaivota-de-patas-amarelas (Larus michahellis).
A zona rochosa e as falésias “são habitats para espécies de plantas halófitas, que são adaptadas a ambientes salinos, como o Crithmum maritimum (erva-do-mar)”, assegura.
João N. Franco, biólogo marinho e investigador no MARE-IPLeiria, também não tem dúvidas de que a fauna e a flora encontradas nesta reserva “estão associadas a uma rica diversidade biológica marinha”. Lamentando o facto de não termos estudos prévios dedicados à biodiversidade na área da reserva, afirma, à Green Savers, que encontramos, na componente marinha “uma grande variedade de peixe e invertebrados como polvos, ouriços, anémonas” e que também podemos encontrar uma “grande variedade de algas”.
Na parte terrestre desta zona costeira, continua, “existe uma grande diversidade de plantas e invertebrados terrestres, adaptadas às zonas mais próximas das falésias”.
Como proteger?
Ora, o objetivo principal das Reservas Mundiais de Surf é proteger precisamente estas áreas não apenas por estes valores ambientais, mas também culturais e sociais e, claro, pelas suas ondas. E como é que se protegem estas ondas, paisagens e ecossistemas?
Segundo Diogo Batalha, a proteção das ondas, paisagens e ecossistemas na Reserva Mundial de Surf da Ericeira envolve uma “abordagem multifacetada” que passa pela regulamentação do uso do solo, já que “é fundamental garantir que o desenvolvimento urbano seja controlado, evitando a construção em áreas sensíveis e protegendo as falésias e zonas costeiras”.
Passa também, aponta o biólogo, pela conservação dos ecossistemas: “a implementação de áreas protegidas marinhas e terrestres, onde as atividades humanas são limitadas, é essencial para preservar a biodiversidade”. E ainda pela gestão dos resíduos e da poluição. Para Diogo, a “criação de sistemas eficazes de gestão de resíduos e a promoção de práticas sustentáveis entre os visitantes ajudam a reduzir a poluição e a degradação ambiental”.
A educação e a sensibilização devem ser também encaradas como pilares-chave destes esforços de conservação, por exemplo, através de programas dirigidos tanto à população local como aos turistas, sendo “fundamentais para fomentar uma cultura de respeito e proteção do meio ambiente”, acrescenta.
“Podemos fazer uma abordagem clássica, através da monitorização ambiental e da regulamentação da construção costeira, mas também apostar em campanhas de sensibilização que nos permitam informar a população. Dar a conhecer o que existe, o valor ecológico, o património cultural e histórico, e as ondas em si, a biodiversidade”, reforça o também biólogo João N. Franco.
Esta sensibilização, aconselha, “deve ser feita junto das comunidades locais onde se incluem, também, os turistas, que podem e devem desempenhar um papel ativo nesta preservação, em conjunto, depois, com as organizações ambientais, autoridades municipais e nacionais”.
Os Guardiões
Um dos símbolos dessa proteção encontra-se no miradouro de Ribeira d’Ilhas, a mais mediática e cosmopolita das sete singulares ondas que constituem a primeira Reserva da Europa e a segunda do mundo. Trata-se de uma escultura da autoria do artista José Queiroz, intitulada “Guardião da Reserva Mundial de Surf da Ericeira”.
Em entrevista ao site ‘Ericeira Living’, o artista explica que os traços do Guardião foram inspirados por uma “pessoa real”. Esta pessoa foi um “modelo para uma relação saudável, sustentável e íntima com o mar”. Representa um homem que “amou verdadeiramente a Natureza e cujas qualidades são dignas deste título”.
A escultura é feita em bronze, um material que, segundo o criador da obra, não é prejudicial à Natureza e dura muito tempo. Lançando um apelo coletivo à preservação ambiental – “todos, dentro e fora de água, somos guardiões deste património único que são ondas” – José espera inspirar a uma versão melhor de cada um de nós.
“A distinção como Reserva Mundial de Surf significa, no entendimento municipal, um desafio sempre inacabado, pois implica assumir um compromisso de cuidar em permanência, garantindo que este património único possa ser legado para as gerações futuras”
Esta instalação foi uma iniciativa da Câmara Municipal de Mafra, do Ericeira Surf Clube, da Associação dos Amigos da Baía dos Coxos e da Associação SOS Salvem o Surf, entidades que integram o Conselho Municipal de Gestão da RMSE e que são os Guardiões desta Reserva.
Um desafio sempre inacabado
Questionado sobre quais os maiores desafios sentidos ao longo destes 13 anos, Hugo Moreira Luís, Presidente da Câmara de Mafra, afirma à Green Savers que a distinção como Reserva Mundial de Surf “significa, no entendimento municipal, um desafio sempre inacabado, pois implica assumir um compromisso de cuidar em permanência, garantindo que este património único possa ser legado para as gerações futuras”.
O presidente do Ericeira Surf Clube, outro dos guardiões da reserva, também partilha da opinião de que é um trabalho “sempre inacabado, exigente e que deverá ser coletivo”. Talvez seja este o principal desafio, aponta, ou seja, “ser difícil termos a devida disponibilidade constante e continuada para tão grande desafio. O de não se ter encontrado uma fórmula que atraia o coletivo e se encadeie com as diversas agendas para a área da reserva”, afirma.
Outro desafio, acrescenta, “é o facto da reserva em boa parte encontrar-se em área urbana, o que dificulta que muitos entendam que estão num local muito especial não só para os novos moradores, como também para as famílias que cá residem há várias gerações”.
O facto de “não haver uma delimitação oficial e legalmente constituída sobre a área da reserva, embora o Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) já assuma, em parte, a existência desta área”, também tem sido desafiante. No entanto, aponta Miguel, “para se dar uma outra segurança, para que todos sintamos ainda mais estarmos num local especial, devidamente identificado, a figura jurídica de uma Reserva será bastante importante”.
O responsável considera que, “talvez, o maior desafio seja mesmo o de educarmos as gerações vindouras para a necessidade de protegermos os locais e o ambiente em que nos inserimos e saibamos acolher e transmitir esses valores a quem nos vem procurando não só para períodos de férias, como novos residentes”.
Consciencialização ambiental da comunidade
Para celebrar o 10.º aniversário da Reserva Mundial de Surf da Ericeira em 2021, foi desenvolvido o projeto ‘Ericeira WSR+10’, promovido pelo Ericeira Surf Clube. Uma das iniciativas multidisciplinares foi a apresentação de um estudo que analisou os impactos económicos, sociais, ambientais e de imagem do surfing e das atividades associadas a estes desportos.
Entre os diferentes instrumentos de recolha de dados utilizados, destaca-se a criação de dois questionários: um destinado aos residentes da Ericeira e o outro dirigido aos turistas, praticantes e não praticantes.
O objetivo do questionário dirigido aos residentes foi conhecer a perceção dos moradores sobre as alterações sentidas desde a criação do RMS da Ericeira, bem como uma avaliação das mesmas. Com o que foi dirigido aos turistas procurou-se perceber o grau de importância atribuído às atividades de surfing e o peso da classificação da Ericeira como RMS na hora de decidir visitar a região, bem como os padrões de gastos e satisfação destas pessoas.
Para o Presidente da Câmara de Mafra, esse estudo é um “bom exemplo da dinâmica de reflexão que pode ser desenvolvida em torno da RMSE” e, fazendo um balanço desde que a Ericeira foi consagrada como Reserva Mundial de Surf, sublinha que o maior dos traços positivos “é, sem dúvida, a consciencialização ambiental da comunidade para a preservação das ondas e dos ecossistemas costeiros”.
Pressão urbanística
Juanma Murua, coordenador do estudo, declarou, em entrevista ao site do projeto ‘Ericeira WSR+10’ que, numa avaliação geral, o impacto da RMSE tem sido positivo, embora, em termos ambientais, nem tanto. Os principais impactos negativos referidos no estudo foram a artificialização do solo, devido à pressão urbanística, a diminuição da biodiversidade (especialmente nas zonas de acesso ao mar) e as emissões derivadas do transporte, principalmente por parte dos turistas que chegam à Ericeira.
O consultor acredita que, ainda que o surf tenha contribuído para aumentar o número de alojamentos turísticos e escolas da modalidade, a pressão turística trouxe problemas ambientais, já que os espaços verdes não aumentaram proporcionalmente, para além de também não ter contribuído para o aumento do emprego ou do poder de compra dos residentes.
Disse mesmo, em 2021, que “é necessário que se tomem medidas no imediato para evitar que questões como o impacto do transporte, a urbanização excessiva ou a estagnação da qualidade de vida local continuem a tendência negativa demonstrada e que, mais tarde, será muito difícil de reverter (…). São essas pressões que devem ser respondidas com um bom planeamento de uso dos solos”.
Para Miguel Barata de Almeida, é natural que o crescimento em algumas áreas de atividade económica, aliado ao aumento da pressão turística, e até mesmo da construção de novas habitações, esteja a trazer “diversos constrangimentos ambientais e na qualidade de vida que anteriormente se verificava”.
No entanto, sublinha, “para quem cresceu nesta terra, a constatar que a atividade económica principal durante décadas se resumia a Pesca e Turismo, sofrendo de uma enorme sazonalidade, obrigando, em muitos casos, as famílias a terem de trabalhar fora da Ericeira para se puderem sustentar, facilmente verifica que esta situação se reverteu muito com a criação de centenas de empregos ao longo do ano, embora o tecido económico da Pesca se tenha alterado muito”.
Questionado sobre se foram implementadas as medidas referidas por Juanma Murua, o presidente do Ericeira Surf Clube afirma que, neste momento, não tem novos dados sobre algumas destas questões, “mas certamente que teremos de ter noção que o enorme aumento mundial de praticantes de surfing está a fazer-se sentir nos melhores locais para a sua prática”.
Já o presidente da Câmara de Mafra considera que “o adequado planeamento” tem vindo a ser garantido. “Tanto assim é”, continua o autarca, “que, em 2022, o Concelho de Mafra foi certificado como Biosphere Destination, selo internacional atribuído pelo Instituto de Turismo Responsável, reconhecendo a integração dos ODS [Objetivos do Desenvolvimento Sustentável] na estratégia de desenvolvimento turístico do território”.
Esta certificação, aponta, “implicou um exigente processo, que incluiu um exaustivo diagnóstico, envolvendo entidades externas e serviços municipais e que levou à elaboração de um Plano de Ação para a Sustentabilidade, e ainda vários momentos de auscultação pública”.
Mais recentemente, diz ainda, a Ericeira foi distinguida no ano passado como “Best Tourism Village 2023” pela Organização Mundial do Turismo. Este galardão – que reconhece destinos turísticos de referência com um máximo de 15 mil habitantes, inseridos numa paisagem com importante presença de atividades tradicionais e que partilham valores e estilos de vida da comunidade – resultou de uma candidatura avaliada por um Conselho Consultivo Independente, mediante indicadores em nove áreas, vinculadas aos ODS.
“A Ericeira está a ser banalizada por quem cá chega e explora sem qualquer contemplação os seus recursos. Em muitos casos, pouco ou nada trazem de novo. Copiam o existente e pretendem afirmar-se como diferenciados ou apresentarem-se como inovadores”, Miguel Barata de Almeida, Presidente do Ericeira Surf Clube
Planeamento do uso dos solos é essencial
No entanto, há algumas vozes locais que consideram que tem havido um crescimento algo descontrolado ao nível da construção e das escolas de Surf. Com uma carreira dedicada ao Surf, Joana Andrade mora há cerca de 17 anos na Ericeira e, em entrevista a um blog local, disse que esta “é uma vila piscatória com uma tradição e com uma cultura bonita e penso que se está a estragar um bocadinho, estão a construir muitas casas, está a haver uma indústria muito grande à volta”.
Na perspetiva de Miguel Barata de Almeida, a Ericeira “está a ser banalizada por quem cá chega e explora sem qualquer contemplação os seus recursos”. Em muitos casos, continua, “pouco ou nada trazem de novo. Copiam o existente e pretendem afirmar-se como diferenciados ou apresentarem-se como inovadores. Sou da Ericeira, foi cá que cresci e sei bem como se caracterizava a sociedade durante várias gerações”. O responsável considera mesmo que a opinião de Joana Andrade, “poderá levar a uma introspeção e análise coletiva à realidade atual”.
Para o biólogo Diogo Batalha, “o crescimento populacional e turístico, se não for devidamente controlado, pode resultar numa perda significativa de atratividade da Ericeira, devido à pressão sobre os recursos naturais e ao aumento da urbanização desordenada”. Um bom planeamento de uso do solo “é crucial para equilibrar o desenvolvimento com a conservação. Isto inclui a definição de zonas de proteção, a limitação da construção em áreas sensíveis e a implementação de medidas que minimizem a pegada ambiental dos novos projetos”, explica.
“O crescimento populacional e turístico, se não for devidamente controlado, pode resultar numa perda significativa de atratividade da Ericeira, devido à pressão sobre os recursos naturais e ao aumento da urbanização desordenada. Um bom planeamento de uso do solo “é crucial para equilibrar o desenvolvimento com a conservação”, Diogo Batalha, biólogo
João N. Franco não tem dúvidas de que o “crescimento descontrolado leva à perda de atratividade” e que o planeamento do uso do solo, com limites à construção e aposta na preservação das áreas naturais, “é um passo essencial” para equilibrar esta questão do turismo e da conservação. “É um passo importante a dar e deve ser complementado com um maior conhecimento ecológico dos ecossistemas que integram estas ondas. Este conhecimento, que depois deverá ser partilhado, é uma mais-valia para que o produto turístico se torne mais completo e mais atrativo”, afirma.
Figura legal para garantir a proteção da RMSE
Em 2021, o coordenador do estudo, Juanma Murua, lamentou a falta de uma figura legal para garantir a proteção da Reserva atendendo ao crescimento populacional e turístico e à sustentabilidade. Uma medida que seria importante na opinião de ambos os biólogos.
O Município de Mafra está “sempre disponível para adotar todas as medidas que considere oportunas para a proteção da Reserva”, mas Hugo Moreira Luís salienta que a Reserva está reconhecida no instrumento de gestão territorial em vigor, o Programa da Orla Costeira (POC), e que a própria câmara tem vindo a desenvolver planos estratégicos orientados para a proteção dos recursos naturais e, em particular, dos recursos hídricos, tais como o Plano Municipal de Ação Climática ou o Plano Estratégico para a Reabilitação das Linhas de Água.
O autarca destaca a criação do Conselho Municipal para a Gestão da RMSE e respetivo Conselho Restrito, o trabalho de conservação das infraestruturas costeiras, a instalação de pórticos rebaixados para impedir o acesso de autocaravanas aos spots de Surf, complementada com a criação de áreas de serviço para esta tipologia de veículos, a implementação da taxa turística, que imputa aos visitantes a responsabilidade de comparticipar os custos com a prestação de serviços e com a qualificação do destino e a criação de áreas de contenção de Alojamento Local em zonas premium, onde é atingida a capacidade máxima desta tipologia de alojamento.
Hugo Moreira Luís afirma ainda que esses exemplos de medidas tomadas pela autarquia contrariam a ideia de um “crescimento algo descontrolado”. A consagração da Ericeira como Reserva Mundial de Surf “teve, aliás, o mérito de motivar a responsabilidade coletiva”, assegura.
“Através da adoção de ações contínuas, comprova-se que é possível equilibrar as componentes ambiental, social e económica do desenvolvimento sustentado. Tanto assim é que estão já previstos novos investimentos municipais, nomeadamente a construção do Parque Verde Urbano da Ericeira (junto ao Parque de Campismo da Ericeira), a criação do Parque Ecológico da RMSE (junto à praia da Empa) e a ampliação da Escola Básica e Secundária António Bento Franco, de modo a assegurar as melhores condições de vida a quem vive e visita a Ericeira, sempre em respeito pelos recursos naturais”, aponta.
Como tornar a RMSE mais sustentável
De qualquer forma, na opinião dos biólogos, existem condições para que a Reserva Mundial da Ericeira se torne mais sustentável. Para Diogo Batalha, alguns passos poderiam ser dados, nomeadamente, incentivar práticas de turismo que minimizem o impacto ambiental, como o uso de transportes públicos, a promoção de alojamentos sustentáveis e a restrição do acesso a áreas sensíveis.
“Não podemos querer proteger a zona costeira e, ao mesmo tempo, levar um carro que nos deixe mesmo em cima da praia. Há toda essa componente que tem de ser estudada – as pessoas poderão ter de andar mais, recorrer a bicicletas e apostar noutro tipo de transportes para as suas deslocações”
Implementar sistemas de gestão de águas residuais eficientes e programas de reciclagem para reduzir a pegada ecológica da área, bem como investir em infraestruturas que respeitem o ambiente natural, como caminhos pedestres sustentáveis e sistemas de energia renovável, são também medidas fundamentais.
Para João N. Franco, os passos estão à vista: limitar a construção na zona costeira e promover este turismo ecológico e sustentável, fazer dele uma mais-valia diferenciada e não um turismo de massas, incentivar o recurso a meios de transporte mais sustentáveis como bicicletas e autocarros elétricos, entre outros.
“Não podemos querer proteger a zona costeira e, ao mesmo tempo, levar um carro que nos deixe mesmo em cima da praia”, considera. “Há toda essa componente que tem de ser estudada – as pessoas poderão ter de andar mais, recorrer a bicicletas e apostar noutro tipo de transportes para as suas deslocações.”
*Artigo publicado originalmente na revista Green Savers de setembro de 2024