Rãs-de-vidro ‘escondem’ glóbulos vermelhos no fígado para ficarem transparentes



Os filmes de ficção científica estão repletos de personagens, deste e de outros planetas, que exibem capacidades consideradas sobre-humanas, como voar, respirar debaixo de água e até ficar invisíveis. Apesar de esses poderes serem do reino da fantasia, o mundo natural está pejado de seres com capacidades que podem mesmo ir além dos limites das mentes mais imaginativas.

As rãs-de-vidro, da família Centrolenidae são prova viva disso mesmo, e os cientistas confirmaram agora como esse pequeno anfíbio consegue tornar-se translúcido, fazendo jus ao nome que lhe foi atribuído.

Uma equipa de biólogos e engenheiros biomédicos das universidades de Duke, Stanford e Southern California, nos Estados Unidos, revela que as rãs-de-vidro conseguem tornar-se transparentes quando descansam ao retirarem da sua circulação sanguínea perto de 90% dos glóbulos vermelhos e armazenando-os nos seus fígados. Este é um mecanismo de camuflagem fundamental para a sobrevivência destes anfíbios singulares, mantendo-se escondidos dos olhares dos predadores.

Rã-de-vidro depois de ter armazenado dos glóbulos vermelhos no fígado.
Crédito: Jesse Delia / Fonte: Duke University

Os próprios fígados estão cobertos por uma camada que reflete a radiação, para que esse órgão não seja extremamente visível quando está cheio de glóbulos vermelhos, o que seria contraproducente.

A investigação, divulgada na revista ‘Science’, focou-se sobre uma espécie em particular de rã-de-vidro, da espécie Hyalinobatrachium fleischmanni, um pequeno animal nativo das florestas densas da América do Sul e que não chega a medir mais do que 15,5 milímetros de comprimento, fazendo com que seja muito difícil identificá-la no meio da folhagem. Além disso, é tendencialmente notívaga, pelo que, quando está desperta, a sua pele esverdeada torna-a praticamente indetetável aos olhares destreinados.

Durante do dia, quando descansam das caçadas noturnas, H. fleischmanni torna-se translúcida, quase invisível, pois, como explica Carlos Taboada, o principal autor do artigo, “os seus músculos e pele tornam-se transparentes, e os seus ossos, olhos e órgãos internos são as únicas coisas que se veem”.

Estas rãs preferem dormir nas faces inferiores de grandes folhas verdes, pelo que, quando ativam o seu mecanismo de camuflagem, misturam-se na perfeição com as cores da vegetação que as envolve.

Rãs-de-vidro a dormirem numa folha, perfeitamente camufladas.
Crédito: Jesse Delia

Embora no mar a capacidade de mudar a cor da pele seja relativamente comum – lembremo-nos dos polvos ou dos chocos, verdadeiros mestres da camuflagem e da mímica –, em terra esse não é um dom que pertença a muitos animais. E os cientistas explicam que isso se deve aos glóbulos vermelhos presentes no sangue dos animais terrestres, que, embora sejam de vital importância por transportarem oxigénio, fazem com que seja muito difícil uma camuflagem perfeita, especialmente quando o pano de fundo é praticamente todo verde, como nas florestas.

“As rãs-de-vidro são alguns dos únicos vertebrados terrestres que conseguem alcançar a transparência”, apontam os autores, e, como tal, têm sido alvo de grande interesse científico.

Quando estão acordados, sob stress ou anestesiados, estes animais são opacos, porque o sistema circulatório está cheio de glóbulos vermelhos, refere Jesse Delia, que também fez parte desta investigação. Dessa forma, para estudar esta capacidade invulgar as rãs têm de têm de estar “felizes e a dormir”.

Rã-de-vidro a dormir (esq.) e anestesiada (dir.)
Crédito: Junjie Yao, Duke University





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