Cientistas portugueses descobrem nova espécie de lagarto sem patas em Angola
Foi na região sudoeste de Angola, mais especificamente na ilha-montanha da Serra da Neve, que uma equipa internacional de cientistas numa expedição herpetológica, incluindo quatro portugueses, descobriram uma nova espécie de lagarto ápode, isto é, sem patas, do género Acontias.
Nesse local peculiar, uma montanha que se ergue no meio de uma planície e que apresenta um micro-habitat que destoa completamente da área em volta, depararam-se com a nova espécie Acontias mukwando. É um lagarto do grupo dos escincos-lança, apesar de se parecer mais com uma cobra, e vem juntar-se a três outras espécies que já tinham sido registadas em Angola: A. occidentalis, A. kgalagadi e A. jappi.
A Serra da Neve tem vindo a ser alvo de várias investigações científicas ao longo dos últimos anos e revelou já ser um dos locais mais biologicamente diversos de Angola, fortemente marcada por vários endemismos já documentados.
A nova espécie distingue-se das outras do mesmo género por ter pálpebras móveis, capacidade que não está presente na A. kgalagadi e na A. jappi, e por ter uma coloração diferente.
Através da análise e comparação de dados morfológicos, moleculares e biogeográficos, a equipa determinou que a população de Acontias da Serra da Neve era, de facto, uma espécie à parte, e o nome científico que lhe colocaram é uma homenagem ao povo local que vive nessa ilha-montanha, os Mukwando, e que muito ajudaram a equipa no seu trabalho de campo.
Num artigo publicado recentemente no ‘African Journal of Herpetology’, escrevem que “este nome é o reconhecimento do apoio, entusiasmo e amizade” mostrado por esse povo à equipa de investigação que realizou o trabalho nas suas terras.
Quanto ao nome em português, os cientistas sugerem que a nova espécie de lagarto ápode seja conhecida como lagarto-lança-da-Serra-da-Neve.
Embora os dados não permitam ainda perceber se se trata de uma espécie ameaçada ou não, argumentam que existirá apenas na Serra da Neve, uma área que embora tenha já sido apontado pelo governo angolano como de interesse para a conservação, ainda não foi formalmente classificada como área protegida.
Mariana Marques, primeira autora do artigo, afirma que “encontrar um espécime como o Acontias é sempre entusiasmante”, uma vez que “estes animais passam a maior parte das suas vidas debaixo de pedras e da folhagem, e não são habitualmente avistados pelas pessoas”, cita nota do Museu Carnegie de História Natural (Estados Unidos da América), uma das instituições envolvidas na investigação, a par do Museu Nacional de História Natural e da Ciência (Portugal) e do centro de investigação português Biopolis-CIBIO.
A investigadora diz que “há tanto qua não sabemos” sobre esses lagartos peculiares, pelo que “descobrir que um membro de um grupo pouco conhecido ocorre no topo de uma montanha igualmente enigmática foi um mistério tão entusiasmante de resolver”.
“O meu objetivo é fornecer uma visão sólida e científica da fauna que ocorre na Serra da Neve, de forma a apoiar a sua conservação e contribuir para a compreensão da sua rara biodiversidade”, salienta a cientista portuguesa.
Os espécimes de A. mukwando recolhidos estão agora depositados na coleção de Anfíbios e Répteis do Museu Nacional de História Natural e da Ciência, em Lisboa.