Hortelões do Monte Abraão escrevem carta aberta ao presidente da câmara de Sintra. Saiba porquê.
Um grupo de hortelões da Horta Comunitária do Monte Abraão, em Sintra, manifestou o seu descontentamento – através de uma carta aberta enviada ao presidente da câmara de Sintra, Fernando Seara – pela forma como a autarquia está propor a reposição “da situação anterior à ocupação” deste terreno, “deixando-o devoluto”. É que esta horta comunitária é utilizada pelos moradores do Monte Abraão “há quase trinta anos” e a câmara ainda não começou a construção da nova horta.
“Queremos deixar claro que não tencionamos abandonar este terreno enquanto a Câmara Municipal não arrancar com um novo projecto para o mesmo. A Câmara informa-nos de que o adquiriu tendo em vista a ‘construção de equipamentos sociais, culturais, desportivos, educativos ou de serviços públicos’, mas não nos informa de nenhum horizonte para o início dos trabalhos. Enquanto nenhuma construção começa, afirmamos que as hortas são já um projecto social, cultural e educativo em curso, levado a cabo pelos próprios munícipes, e que tem para a Câmara custo zero”, explicou o grupo num post publicado no blog Couves para Todos e na própria carta, que enviada também ao Green Savers.
O último capítulo deste processo decorreu a 22 de Novembro último, quando os hortelões receberam uma notificação da Polícia Municipal que lhes dá trinta dias para retirarem as hortas, sob ameaça de uma “execução coerciva” e pagamento das respectivas despesas.
“As hortas fazem parte do quotidiano de todos nós e para alguns são mesmo a única ocupação. Promovem o sustento alimentar de várias famílias com baixos rendimentos. Promovem a agricultura biológica, a sustentabilidade ambiental e a qualidade de vida no município. São um espaço de convívio entre vizinhos. Juntam desde idosos que cresceram a trabalhar no campo até jovens estudantes que aqui aprendem a cultivar a terra”, afirma o grupo.
Que continua: “Lamentamos a incoerência da Câmara Municipal: alega interessar-se pelas hortas urbanas e anuncia até estar a desenvolver um projecto de “hortas comunitárias em zonas urbanas do concelho”, e depois mostra desprezo total por um projecto já em curso – um projecto precisamente com as mesmas características e objectivos, que existe por iniciativa de munícipes activos que se juntaram e o começaram pelas próprias mãos, e que ao longo de muitos anos aqui puseram persistência e suor”.
Há trinta anos, quando estes terrenos começaram a ser cultivados, encontravam-se completamente abandonados.
Leia a carta aberta na íntegra.
Carta aberta ao Presidente da Câmara Municipal de Sintra
Nós, hortelões das hortas junto ao bairro 1º de Maio no Monte Abraão, juntamo-nos para reagir à notificação da Polícia Municipal que recebemos a 22 de Novembro e que nos dá trinta dias para retirarmos as hortas, sob ameaça de uma “execução coerciva” e pagamento das respectivas despesas.
Queremos deixar claro que não tencionamos abandonar este terreno enquanto a Câmara Municipal não arrancar com um novo projecto para o mesmo. A Câmara informa-nos de que o adquiriu tendo em vista a “construção de equipamentos sociais, culturais, desportivos, educativos ou de serviços públicos”, mas não nos informa de nenhum horizonte para o início dos trabalhos. Enquanto nenhuma construção começa, afirmamos que as hortas são já um projecto social, cultural e educativo em curso, levado a cabo pelos próprios munícipes, e que tem para a Câmara custo zero.
Este espaço já é utilizado pelos moradores do bairro para cultivo há quase trinta anos. Já por várias ocasiões as autoridades vieram destruir as hortas. Em todas elas, para deixar o terreno num estado abandonado e lamentável. E em todas elas, os moradores voltaram a limpá-lo, a cuidar dele e a recomeçar as suas hortas.
As hortas fazem parte do quotidiano de todos nós e para alguns são mesmo a única ocupação. Promovem o sustento alimentar de várias famílias com baixos rendimentos. Promovem a agricultura biológica, a sustentabilidade ambiental e a qualidade de vida no município. São um espaço de convívio entre vizinhos. Juntam desde idosos que cresceram a trabalhar no campo até jovens estudantes que aqui aprendem a cultivar a terra.
Lamentamos a incoerência da Câmara Municipal: alega interessar-se pelas hortas urbanas e anuncia até estar a desenvolver um projecto de “hortas comunitárias em zonas urbanas do concelho”, e depois mostra desprezo total por um projecto já em curso – um projecto precisamente com as mesmas características e objectivos, que existe por iniciativa de munícipes activos que se juntaram e o começaram pelas próprias mãos, e que ao longo de muitos anos aqui puseram persistência e suor.
Manifestamos pois a nossa incredulidade pelo facto de, para um terreno a que demos tanta vida, uma Câmara Municipal nada mais ter a propor senão que os hortelões “reponham a situação anterior à ocupação do terreno, deixando-o devoluto”.
Solicitamos que, se um dia arrancarem as construções no espaço que actualmente utilizamos, e no âmbito do referido projecto de hortas comunitárias, nos seja disponibilizado um outro terreno devoluto, dos vários existentes nas imediações do bairro, onde possamos continuar as nossas actividades.
Sublinhamos, entretanto, a nossa total disponibilidade para colaborar com a Câmara Municipal no sentido de melhorar o que quer que deva ser melhorado no terreno e nas hortas.
Atenciosamente,
Amélia Costa, reformada
Ana Raquel Pinto, estudante
Cátia Teixeira, operadora de call center
Cristina Bandeira, polidora de móveis
Eduardo Barbosa Vieira, reformado
Fernanda Bandeira, reformada
Fernando Santos, reformado
Francisco Pedro, jornalista
Francisco Virgílio Moreno, reformado
Isabel Oliveira, governanta de hotelaria
Joana Oliveira, bolseira de investigação
Jorge Duarte, estudante
Jorge Pinto, carpinteiro
José Bandeira, reformado
José Ribeiro, desempregado
Liliana Roxo, técnica de inserção profissional
Lina Martins, desempregada
Lurdes Martins, reformada
Manuel Tavares, desempregado
Maria Balbina Cordeiro, reformada
Maria Correia, desempregada
Maria de Lurdes Silva, governanta de hotelaria
Maria de Fátima Matos, auxiliar de limpeza
Miguel Morais, bolseiro de investigação
Nuno Costa, reformado
Olga Birjukova, estudante
Paulo Figueiredo, serralheiro
Pedro Correia, bolseiro de investigação
Ricardo Canelas, doutorando em engenharia civil
Susana Branco, professora universitária
Tiago Maduro, estudante