“Jardim Crioulo” vai ter plantas cultivadas como atos de resistência na Bienal de Veneza



O “Jardim Crioulo” do projeto “Greenhouse”, escolhido para representar Portugal na 60.ª Bienal de Arte de Veneza, a partir de abril, vai recriar as plantações privadas, “cultivadas por pessoas escravizadas como atos de resistência e fontes de alimentação”.

Este jardim, segundo informação constante no sítio ‘online’ da Bienal de Veneza, constituirá “uma antítese da plantação monocultural”, e será “densamente plantado e repleto de biodiversidade”, com o objetivo de promover “um espaço discursivo de possibilidade, multiplicidade, libertação e sobrevivência”.

O projeto da autoria das curadoras e artistas Mónica de Miranda, Sónia Vaz Borges e Vânia Gala foi escolhido em 2023, num concurso limitado organizado pela Direção-Geral das Artes (DGArtes), com um montante financeiro global disponível de 385.000 euros, e representará oficialmente Portugal na Bienal de Arte entre 20 de abril e 24 de novembro.

Parte central da conceção, o “Jardim Crioulo” da “Greenhouse”, ainda segundo o sítio ‘online’, acolherá um vasto programa de “ações interdisciplinares e transformadoras” e será composto por plantas provenientes da botânica tropical, cultivadas segundo os princípios da permacultura e da agricultura sintrópica”, caracterizada pela organização, integração, equilíbrio e preservação de energia no ambiente.

“O jardim crioulo é simultaneamente produto e processo. Será ativado como um arquivo vivo, um espaço educativo, um palco de gestos, movimentos e ações, resistências, fabricações e especulações, onde se fundem as várias identidades dos corpos de pesquisa curatorial, visual, coreográfico, transmissor e militante, para formar um corpo-solo migrante”, indica o texto inserido em https://greenhouse2024.com/.

Mónica de Miranda, Sónia Vaz Borges e Vânia Gala descrevem “Greenhouse” como um projeto “baseado em interconexões de prática, teoria e pedagogia, apresentando o espaço expositivo como um lugar de experimentação e reflexão”, baseado em quatro ações: Jardim (Instalação, Espaço e Tempo), Arquivo Vivo (Movimento, Som e Performance), Escolas (Educação, História e Revolução) e Assembleias (Público e Comunidades).

“A criação de um arquivo vivo com o desenvolvimento de uma escola, ações performativas e uma teia de encontros entre artistas, públicos e comunidades, num jardim em constante crescimento, tem como objetivo fomentar espaços de fantasia, imaginação, novas histórias e fabulações críticas”, explicam ainda.

Os “jardins crioulos” misturam uma grande variedade de espécies vegetais, e “são exemplos de resistência, exercícios de liberdade”, onde “arranjos de várias espécies foram cultivados e cuidados de modo a que árvores e aromas diferentes se protejam mutuamente”, sublinha a curadoria.

“Greenhouse questiona a forma como o solo, a terra e as fronteiras se relacionam com a política do corpo no presente. Integra a terra como uma forma de entender os processos de libertação e auto-descoberta para criar ecologias de cuidado no ecossistema atual. Observamos estas dinâmicas no corpo migrante, o ser diaspórico em constante movimento e transição”, acrescentam.

No Palazzo Franchetti, onde ficará instalado o projeto durante a Bienal de Arte de Veneza, o jardim-escultura será ativado através de um programa público alargado, integrado na exposição para tornar-se “um espaço de criação contínua e dialógica entre artistas e público”.

O projeto das três curadoras responde ao tema lançado pelo comissário-geral da Bienal, Adriano Pedrosa, “Foreigners Everywhere” (“Estrangeiros em todo o lado”, em tradução livre), que reunirá 90 representações nacionais e obras de 332 artistas numa edição em que a migração e a descolonização são temas-chave, com foco nos criadores indígenas, ‘queer’ e ‘outsider’.

Cofundadora do Hangar (Centro de Investigação Artística), em Lisboa, Mónica de Miranda foi nomeada em 2019 para o Prémio EDP Novos Artistas e, em 2014, para o Prémio Novo Banco de Fotografia, e tem a sua obra representada em várias coleções, tanto públicas como privadas, entre as quais a Fundação Calouste Gulbenkian, o Museu Nacional de Arte Contemporânea, a Nesr Art Foundation e o Arquivo Municipal de Lisboa.

Sónia Vaz Borges apresenta-se como uma “historiadora interdisciplinar”, cuja carreira se desenvolveu em universidades públicas de Lisboa, Berlim e Nova Iorque.

Com um doutoramento em Ciências da Educação – História da Educação, pela Universidade Humboldt de Berlim, onde é investigadora, Sónia Vaz Borges tem dois livros publicados: “Na Pó Di Spéra. Percursos nos Bairros da Estrada Militar, de Santa Filomena e da Encosta Nascente” e “Militant Education, liberation struggle and consciousness. The PAIGC education in Guinea Bissau 1963- 1978” (“Educação Militante, luta de libertação e consciencialização. A educação do PAIGC na Guiné-Bissau 1963-1978”, tradução livre para português).

Vânia Gala é uma coreógrafa e investigadora, cujos interesses “incidem sobre práticas experimentais em performance, dança e teatro com ênfase em noções de recusa, (não)performance, opacidade, pensamento-coreográfico, fugitividade, improvisações, dissenso e hospitalidade”.

Em 2005, foi distinguida com o prémio de Melhor Performance Feminina do Dublin Fringe Festival, e os seus trabalhos já foram apresentados em países como Angola, Portugal, Noruega, Alemanha, Irlanda, Reino Unido, Áustria e Rússia.

Na Bienal de Arte de 2022, Portugal foi representado em Veneza por Pedro Neves Marques, com o projeto “Vampires in Space”, apresentado pelos curadores João Mourão e Luís Silva.





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