Plano para abater elefantes na África do Sul gera contestação

Está a ser contestado um plano para abater elefantes na reserva de Madikwe, onde as autoridades locais dizem que a população desses animais selvagens aumentou demasiado e precisa de ser reduzida.
Madikwe é uma área protegida com 750 quilómetros quadrados, localizada no noroeste sul-africano na fronteira com o Botsuana. Além do propósito de conservação, serve como referência turística, oferecendo alojamento e também safáris, com a observação de várias espécies selvagens, incluindo 66 diferentes mamíferos, entre eles os elefantes, os búfalos, os rinocerontes, os leões, os leopardos, os mabecos, as girafas, os hipopótamos, as chitas e as hienas.
Contudo, a entidade responsável pela gestão da reserva, a North West Parks and Tourism Board, considera que os elefantes se tornaram demasiado numerosos e que é preciso implementar ações de controlo populacional, e entende que o abate controlado é a única opção.
Num artigo de opinião publicado em julho no jornal sul-africano ‘Daily Maverick’, dois responsáveis da North West Parks and Tourism Board, Khorommbi Matibe e Jonathan Denga, declaram que Madikwe “tem demasiados elefantes”.
“Uma reserva fechada e vedada com um atual ritmo de crescimento indeterminado de um modificador do habitat como o elefante, que não tem predadores, com acesso permanente a água e comida, levará à sobrepopulação”, salientam.
E dizem que estimativas de 2024 apontam para 1.633 elefantes na reserva, um aumento de 653% face à dimensão populacional de 250 indivíduos que constava do plano de gestão de 1997 de Madikwe.
Referindo que “a inação não é uma opção” e rejeitando “a ideia de deixar a Mãe Natureza fazer o que ela faz sem qualquer intervenção humana”, os responsáveis Matibe e Denga defendem que as únicas opções “realistas” para o controlo populacional dos elefantes na reserva são a contraceção e “a redução letal”, ou seja, o abate.
“A redução letal pode assumir a forma de caça ou de abate, cujas receitas podem facilmente ser canalizadas de volta para a reserva”, apontam, afirmando que deixar a Natureza seguir o seu caminho é também uma forma de abate “mas liderado pela mãe natureza que não tem qualquer consideração pelo bem-estar animal”.
Num texto impregnado de um tom combativo e até desafiador, os responsáveis da reserva de Madikwe dizem-se decididos a avançar com o plano de redução do número de elefantes através do abate, e desvalorizam as críticas que lhes são lançadas.
Do lado dos opositores, a organização sul-africana NSPCA, que se dedica à proteção animal, publicou no seu portal online, em agosto, um texto no qual questiona se o plano da North West Parks and Tourism Board está a ser motivado por um interesse real na conservação ou se, ao invés, é o caminho mais conveniente.
Referindo-se ao mesmo artigo de opinião, a organização, em tom quase irónico, agradece a “candura” da entidade gestora de Madikwe, bem como a aceitação da responsabilidade pela situação atual de sobrepopulação de elefantes na reserva.
Contudo, admite estar “alarmada” com a tentativa de normalização do abate como “estratégia viável e oportunidade económica”.
“Embora seja verdade que a população de elefantes de Madikwe aumentou substancialmente dentro dos limites da reserva vedada (…) a sugestão de que a solução está na morte de animais para financiar a conservação é profundamente preocupante e de uma visão limitada”, lança a NSPCA.
“A redução letal não pode ser configurada como uma fonte de rendimento para preencher buracos em sistemas de gestão há muito negligenciados”, afirma a organização sul-africana. E argumenta que “a mercantilização da vida selvagem sob a guisa do ‘uso sustentável’ [dos recursos naturais] erode não apenas as fundações éticas da conservação, como também a reputação internacional da África do Sul como um país comprometido com a custódia ambiental humana e responsável”.
Respondendo à alegação da North West Parks and Tourism Board de que não é possível deixar a Natureza entregue a si própria, a NSPCA afirma que “ignora o facto de que o curso da natureza foi alterado no momento em que os humanos ergueram as vedações”.
Para a organização não-governamental, a contraceção e a translocação de elefantes de Madikwe para outros locais são as melhores opções disponíveis e as únicas que deveriam estar a ser consideradas para implementação.
“Desvalorizá-las como ‘irrealistas’ denuncia um fracasso de imaginação ou de vontade”, acusa a NSPCA.
“Os elefantes são seres sencientes e inteligentes com estruturas sociais complexas e vidas emocionais. Qualquer política que posicione o abate ou a caça de elefantes como a via mais ‘realista’ deve ser rigorosamente questionada”, sublinha. E assevera que “percebemos os desafios de gerir uma paisagem limitada com uma população crescente de elefantes. Mas não podemos permitir que o desespero ou pressões políticas e económicas se tornem em justificações para a crueldade”.