Quanto mais um país reforça ação climática, mais fortes ficam os movimentos anti-clima
Desde a década de 1990 mais do que duplicou o número de países com pelo menos um grupo de reflexão, instituto de investigação, associação ou qualquer outro grupo cuja missão é combater políticas e narrativas que promovam a ação climática e o conhecimento científico em torno dessa crise planetária.
A conclusão é de um estudo publicado esta semana na revista ‘PLOS One’, assinado por dois investigadores da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos da América (EUA), país com o maior número de organizações desse tipo.
Patricia Bromley, coautora do artigo, explica, em comunicado, que esses grupos, que, na prática, procuram negar as alterações climáticas, ou pelo menos desvalorizar a urgência das ações para combatê-las, “tendem a emergir depois de políticas pró-ambiente serem institucionalizadas ao nível governamental”.
A investigação teve por base uma análise de dados que abrangeu 164 países, incluindo Portugal, e um período compreendido entre 1990 e 2018. De acordo com os dados recolhidos, os autores revelam que a primeira organização anti-climática em Portugal foi criada em 2003, embora não a identifiquem.
O movimento institucional anti-clima terá começado a ganhar impulso depois da criação o Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas (IPCC), em 1988, o órgão das Nações Unidas que define as bases do conhecimento científico a nível global sobre as alterações climáticas, os seus impactos e riscos, bem como avança soluções de mitigação e adaptação.
Dizem os autores que, antes disso, “havia pouco contra o que se mobilizarem”. Mas desde então as organizações anti-clima têm proliferado pelo mundo fora, com cerca de 60% das 548 organizações identificadas neste estudo a estarem sediadas nos EUA.
Ainda assim, atualmente 51 países têm pelo menos uma dessas organizações, mais de o dobro das 25 que se registavam em 1990. E os investigadores dizem que a multiplicação dessas organizações e o fortalecimento do movimento anti-climático foram, em grande parte, impulsionados por interesses económicos, especialmente dos setores energético e agrícola, que, lembram, são no seu conjunto responsáveis por mais de metade das emissões de gases com efeito de estufa.
O trabalho revela que estes movimentos e organizações surgem como resposta à ação climática dos países em que estão sediados, pelo que, quanto mais um país investe no combate às alterações climáticas e cria leis mais fortes para combatê-las, mais ímpeto ganha a fileira anti-clima.
Por isso, não é de surpreender que países cuja riqueza interna mais dependa dos combustíveis fósseis, e que não estão, por isso, muito inclinados para as questões climáticas, têm menos organizações anti-clima.
Os investigadores recordam que já na década de 1980 a indústria dos combustíveis fósseis tinha posto em marcha campanhas que procuravam desacreditar as narrativas e conhecimento que apontava para a ligação entre combustíveis fósseis e o aquecimento global. Contudo, explicam que estas novas organizações anti-clima operam de forma diferente, com argumentos com base na defesa da identidade cultural e em alertas de ameaças a estilos de vida.
Por outras palavras, estas organizações promovem a ideia de que o combate às alterações climáticas, sobretudo às suas causas, põe em risco a identidade das populações e ameaça a sua forma de vida.
“Já não se trata apenas do clima”, aponta Bromley, em nota, acrescentando que “em alguns casos, estes movimentos estão alinhados com outros movimentos culturais reacionários, como aqueles que se opõem às vacinas ou defendem papéis de género tradicionais”.
Os investigadores acreditam que um maior envolvimento das populações nos esforços de combate às alterações climáticas poderá ajudar a atenuar a influência dessas organizações anti-clima. Mas Furuta alerta que a polarização política é terreno fértil para esses movimentos.
“O que começou como uma pequeno grupo marginal pode crescer ao longo do tempo, explorando ansiedades mais gerais sobre mudança, perda de identidade cultural ou excessiva interferência governamental”, salienta o autor.