As florestas protegidas em terras indígenas são as mais saudáveis, aponta estudo

Um grupo de cientistas da Universidade de Sheffield, no Reino Unido, e da Universidade Nacional de Singapura, num artigo publicado na revista ‘Current Biology’, argumentam que as florestas em áreas protegidas localizadas em terras indígenas demonstram um grande nível de integridade e que os impactos das ações humanas são muito menores, comparativamente a outras florestas.
Os especialistas indicam que 56,4% das áreas de floresta tropical estão localizadas nas Américas, sendo que 26,8% estão na Ásia e 16,7% em África. Contudo, é na região americana que se regista a maior articulação e sobreposição entre áreas florestais protegidas e terras indígenas, pelo que é nessa região do planeta que as florestas são comparativamente mais saudáveis.
Dessa forma, salientam que a implementação de medidas legais que permitam proteger áreas florestais inseridas em terras reconhecidas como pertencendo a grupos indígenas aumenta a saúde dessa floresta, bem como permite fortalecer os esforços de conservação que são aplicados.
No entanto, reconhecendo que a interferência de instituições governamentais em áreas indígenas em muitos casos tem estado na origem de conflitos, na degradação de culturas nativas e na deterioração de sociedades, os autores sublinham que “embora os nossos resultados apontem para o valor da proteção legal, a natureza e a forma como a proteção legal de áreas e como elas se articulam e interagem com os povos indígenas e comunidades locais que já aí vivem terão de ser cuidadosamente negociadas”.
Neste estudo, os cientistas olharam para quatro categorias de território: terras não protegidas, terras indígenas, áreas protegidas que se sobrepõem a terras indígenas, e florestas protegidas fora de terras indígenas.
Para poderem perceber as diferenças nas florestas nas várias áreas os especialistas calcularam a sua qualidade em termos de estrutura, composição e funções, que permitem perceber quão resiliente e saudável uma floresta realmente é.
Por exemplo, os cientistas descobriram que, na Amazónia, os territórios indígenas reconhecidos legalmente apresentam níveis reduzidos de desflorestação, talvez pelo facto de os povos indígenas se terem “mobilizado para protegerem as suas terras de indústrias extrativas”, como foi o caso dos grupos amazónicos Munduruku que resistiram ao desenvolvimento de projetos hidroelétricos.
Algo que surpreendeu os cientistas foi a constatação de que, nas Américas e na Ásia, a integridade das florestas era menor em áreas indígenas, portanto que não estavam legalmente protegidas, do que em áreas não-protegidas. Jocelyn Sze, principal autora do artigo, especula que isso se possa dever ao facto de “a maioria dos depósitos de petróleo e de gás estarem localizados em terras indígenas” ou então deve-se à “falta de proteção legal dos direitos” desses povos, “uma vez que a proteção de áreas indígenas parece ter resultados ambientalmente positivos”.
2/ We found that the overlapping areas of PAs on ILs have most effect maintaining high forest integrity, & surprisingly, that ILs in Asia & Americas have poorer protective effect than unprotected areas. Overlapping protected-Indigenous areas also have lowest land-use intensity.
— Jocelyne Sze (@jocelynesze) October 27, 2022
Para que as interações entre terras indígenas e áreas protegidas possam acontecer sem lesar qualquer um dos lados, escrevem que “o reconhecimento legal de povos indígenas e dos seus territórios poderá alcançar melhores resultados sócio-ecológicos”. E adiantam que “procurar alcançar objetivos globais sem ter em conta os desequilíbrios de poder entre atores locais frequentemente resulta em desigualdade social e no insucesso dos objetivos ambientais”.