Mineração em mar profundo: Impactos podem não limitar-se ao leito marinho e estender-se pela coluna de água



A exploração de minerais escondidos no leito oceânico é vista por alguns como a próxima grande batalha ambiental. À medida que muitos países avançam velozmente em direção a sociedades e economias livres de combustíveis fósseis, cresce a necessidade de materiais para produzir as tecnologias que permitam gerar energia renovável, como painéis fotovoltaicos e turbinas eólicas, e para fabricar carros elétricos.

Ainda que a mineração em mar profundo não seja autorizada em águas internacionais, estando atualmente a ser discutido se tal deverá mudar, essa atividade já acontece nos espaços marítimos territoriais de alguns países.

Nódulos de manganês no leito sedimentoso da Zona de Clarion-Clipperton, Oceano Pacífico.
Foto: Geomar Bilddatenbank

Frente à possibilidade de a mineração poder vir a receber ‘luz verde’ por parte da Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA), a comunidade científica tem emitido vários alertas sobre os potenciais impactos que poderá ter sobre a vida marinha. Isto, porque conhece-se muito pouco sobre os habitats e ecossistemas das profundezas oceânicas e, como tal, é muito difícil prever que consequências poderão daí resultar. Por isso, os cientistas, bem como organizações ambientalistas, apelam a uma postura preventiva, ou seja, na dúvida, o melhor é não arriscar.

Quando se fala em mineração em mar profundo, o foco tende a recair sobre os possíveis impactos na vida que ocorre no leito marinho. Contudo, uma recente investigação mostra que os efeitos negativos podem não limitar-se às profundezas e atingir zonas mais luminosas da coluna de água.

Liderada por cientistas do GEOMAR, centro alemão de investigação oceânica, a equipa revela que quando os minerais são extraídos do leito marinho, os sedimentos excedentários, depois de separados dos minerais procurados, são devolvidos ao mar, podendo estender-se por centenas de quilómetros ao longo da coluna de água, afetando os animais que vivem nessas zonas mesofóticas.

Por isso, os investigadores consideram que, como normalmente existem poucos sedimentos nessas regiões marinhas, as comunidades de animais que aí ocorrem estarão também altamente vulneráveis aos efeitos da mineração.

Helena Hauss, uma das coautoras do artigo publicado esta semana na revista ‘Nature Communications’, explica, em comunicado, que os habitantes da zona mesofótica “são a principal fonte de alimento de muitos peixes, lulas e espécies de mamíferos marinhos”, e que, por isso, são “um elo fundamental da rede trófica marinha”.

Tendo evoluído em condições relativamente estáveis, entre a camada mais iluminada à superfície e a zona abissal mais escura e gélida, esses organismos estão “potencialmente mais suscetíveis a alterações das condições no seu ambiente”, afirma a investigadora.

Para testarem os potenciais impactos da mineração oceânica em animais da zona mesofótica, sobretudo seres com corpos gelatinosos, a equipa focou as suas atenções numa espécie de medusa, a Periphylla periphylla, que assumem como sendo um modelo representativo das comunidades de animais que vivem nessas regiões do mar.

Através de experiências em laboratório, percebeu-se que, quando expostas a um aumento da quantidade de sedimentos em suspensão esses animais aumentam a produção de muco nos seus corpos, como forma de se ‘limparem’. Esse é um processo que gasta cerca de 40% da energia diária consumida pela medusa, redirecionando energia que seria usada, por exemplo, pelo seu sistema imunitário e para cicatrizar feridas.

Vivendo em ambientes onde a comida não abunda, esse gasto acrescido de energia poderá ter impactos bastante negativos nas populações de Periphylla periphylla.

“Embora o muco ajude a medusa a manter um microbioma estável, a contínua produção de muco é uma resposta que requer muita energia e pode exigir uma porção substancial do orçamento energético total de um animal”, esclarece Vanessa Stenvers, primeira autora do artigo.

Impactos da mineração podem ser piores do que o aquecimento marinho

Os cientistas quiseram também perceber a reação dessa espécie ao aumento da temperatura da água, um efeito das alterações climáticas que já é visível em muitos oceanos do mundo. Com um aumento de quatro graus, os cientistas notaram um aceleramento da atividade metabólica da medusa, mas dizem que não se compara à resposta gerada pela exposição a sedimentos.

Por isso, concluem que as medusas serão mais forte e negativamente afetadas pela mineração do que pela subida da temperatura do oceano, mesmo no cenário mais negro de aquecimento global.

“Com a possibilidade de a mineração em mar profundo começar na próxima década (…) compreender os efeitos combinados da mineração e do aquecimento dos oceanos é essencial”, argumenta Andrew Sweetman, outro dos autores.





Notícias relacionadas



Comentários
Loading...