Cientistas desvendam segredos da evolução de críptica toupeira marsupial
Conhecidas como “itjaritjari” pelo povo aborígene australiano Anangu, as toupeiras marsupiais estão entre os animais mais peculiares e misteriosos da fauna da Austrália, o que, só por si, é digno de nota.
Pertencentes ao género Notoryctes e descritos cientificamente pela primeira vez em 1888, esses pequenos mamíferos vivem nos desertos australianos, passando grande parte das suas vidas no subsolo, caminhando por baixo da areia escaldante. Mas ao contrário de outras toupeiras, estas não escavam redes de túneis, até porque tal seria muito difícil no areal desértico e seco. Ao invés, “nadam” pela areia, graças a adaptações anatómicas, como patas anteriores especialmente desenvolvidas para empurrar a areia e impulsionar o seu corpo para a frente.
Inicialmente pensava-se que não eram realmente animais marsupiais, mas sim antepassados dos marsupiais e dos placentários modernos da Austrália. Contudo, estudos posteriores de espécimes em melhor estado de conservação permitiram confirmar que essas toupeiras são, realmente, marsupiais.
Apesar de todas as peculiaridades, têm, como outras toupeiras, uma visão muito fraca, sendo praticamente cegas, marca do seu estilo de vida subterrâneo. Sendo animais que vivem em ambientes tórridos, não têm escroto, pelo que os testículos estão protegidos das altas temperaturas no abdómen.
As fêmeas, por seu lado, têm bolsas marsupiais, onde as crias terminam o seu desenvolvimento antes de se aventurarem no mundo exterior, mas a abertura está virada para trás, para impedir a entrada de areia enquanto a progenitora se desloca de um lado para o outro.
Agora, uma investigação liderada pela Universidade de Melbourne, na Austrália, divulgada na revista ‘Science Advances’, está a desvendar os segredos da evolução destas toupeiras marsupiais, através do estudo do seu material genético, obtido de tecido muscular bem preservado de um indivíduo capturado em janeiro de 2015.
Os resultados mostraram que a perda de visão das toupeiras marsupiais não aconteceu da noite para o dia, mas foi um processo gradual. Descobriram também que esses animais têm mais genes do que outros mamíferos para a produção hemoglobina, importantes estruturas proteicas que transportam o oxigénio ao longo do corpo. Sendo animais que vivem no subsolo, onde o oxigénio existe em menor abundância do que há superfície, trata-se de uma adaptação ao meio no qual evoluíram.
Os cientistas verificaram também alterações nos genes que causariam a descida dos testículos para o saco escrotal, razão pela qual os machos dessas toupeiras têm-nos bem guardados no abdómen.
Apesar de serem consideradas toupeiras, estes animais estão mais próximos de marsupiais australianos da ordem Peramelemorphia, como os bilbies (Macrotis lagotis), e até dos infames diabos-da-tasmânia (Sarcophilus harrisii).
Com base na história evolutiva reconstruída das toupeiras marsupiais, os investigadores sugerem que a diversidade genética dessas espécies começou a declinar cerca de cinco mil anos antes de os humanos terem alcançado a Austrália, pelo que, argumentam, tivemos pouca responsabilidade nessa perda. Ao invés, atribuem-na a alterações climáticas num passado distante, com temperaturas mais baixas.
Por viver debaixo da areia, a toupeira marsupial não tem merecido a atenção científica que estes investigadores acreditam que merece. Por isso, consideram que é preciso estudá-las com mais afinco para descortinar os mistérios que ainda envolvem este pequeno mamífero esquivo.