Microplásticos no aparelho urinário suscitam preocupações quanto à segurança da água



Um novo estudo põe em causa um relatório da Organização Mundial de Saúde de 2019, segundo o qual os microplásticos na água potável são inofensivos, depois de confirmar a sua presença em amostras de rim, urina e cancro da bexiga.

A investigação liderada por especialistas da Universidade de Bond analisou 18 estudos anteriores para avaliar a presença de microplásticos e nanoplásticos ainda mais pequenos no trato urinário.

Os investigadores descobriram que os contaminantes se encontravam em 54% das amostras de urina, 70% das amostras de rins e 68% dos casos de cancro da bexiga.

A revisão concluiu que os detritos plásticos prejudicavam as células do aparelho urinário humano ao causarem toxicidade e inflamação, reduzindo a sobrevivência das células. Também perturbam a sinalização MAPK (proteína quinase ativada por mitogénio), um processo que ajuda as células a responder aos sinais de crescimento e ao stress.

“Esta revisão de escopo destaca a ameaça rapidamente emergente da contaminação por microplásticos no trato urinário humano, desafiando a afirmação da Organização Mundial da Saúde de que os microplásticos não representam risco para a saúde pública”, escrevem os autores.

“Os efeitos citotóxicos documentados dos microplásticos, juntamente com a sua capacidade de induzir inflamação, reduzir a viabilidade celular e interromper as vias de sinalização, levantam preocupações significativas de saúde pública relacionadas com o cancro da bexiga, doença renal crónica, infeções crónicas do trato urinário e incontinência”, alerta.

“Consequentemente, este estudo sublinha a necessidade premente de mais investigação e de desenvolvimento de políticas para enfrentar os desafios relacionados com a contaminação por microplásticos”, acrescenta.

Os plásticos impregnaram todos os aspetos da sociedade desde a sua adoção generalizada em meados do século XX.

Em 2019, foram produzidas cerca de 368 milhões de toneladas de plástico, prevendo-se que esse número duplique até 2039.

Este facto resultou na acumulação de fragmentos minúsculos que encontraram o seu caminho em todos os aspetos do ambiente.

Para além dos impactos ambientais bem documentados dos microplásticos, há provas emergentes de que a sua presença nos sistemas orgânicos humanos está a provocar doenças e problemas de saúde.

404,61 milhões de infeções do trato urinário em 2019

Os investigadores estavam particularmente interessados nos efeitos dos microplásticos no trato urinário porque se estima que 404,61 milhões de infeções do trato urinário ocorreram só em 2019, resultando em mais de 236.000 mortes.

Um dos investigadores, o candidato a doutoramento Liam O’Callaghan, disse que era impossível evitar os microplásticos.

“Estamos a bebê-los, estamos a comê-los, estamos a respirá-los. Podem ser absorvidos através da pele”, afirma O’Callaghan, explicando que “quando aquecemos recipientes de plástico, podem existir milhões destes microplásticos minúsculos que se infiltram nos alimentos”.

“Podemos filtrar a água, mas se o filtro for feito de plástico, com o tempo vai começar a degradar-se e a poluir a água que bebemos”, revela.

“Até os sacos de chá são revestidos de plástico para que o papel não se desintegre quando se deita água a ferver, e estes sacos podem libertar milhares de milhões de partículas de plástico no chá”, acrescenta.

Para O’Callaghan, utilizar recipientes de vidro e evitar embalagens de alimentos são formas de minimizar a exposição aos microplásticos.

“Porque é que estamos a embrulhar tudo em plástico nas lojas?”, questiona.

“Será que os produtos frescos precisam mesmo de ser embrulhados em plástico, ou será que podemos vender tudo sem as embalagens desnecessárias?”, indaga.

Os investigadores da Bond esperam realizar mais investigações sobre os efeitos dos microplásticos no corpo humano.

“Pensámos começar pelo trato urinário porque os rins são o sistema de filtragem do corpo”, diz O’Callaghan.

“Sabemos que os microplásticos se encontram nos cancros, mas será que têm alguma coisa a ver com a formação dos cancros? Ainda não sabemos”, acrescenta.

“Sabemos que estão a entrar na corrente sanguínea e alguns trabalhos relacionados com o coração descobriram que estas partículas podem rebentar os glóbulos vermelhos”, revela.

O estudo, publicado no Journal of Exposure Science & Environmental Epidemiology, é considerado o primeiro a resumir a investigação sobre a presença e os efeitos dos microplásticos no trato urinário humano.

O Professor Associado Lotti Tajouri, o Professor Associado Adjunto Rashed Alghafri, Davinia Beaver e o Professor Simon McKirdy também participaram na investigação.

Recentemente, tem-se registado um aumento do número de estudos sobre microplásticos.

Um estudo da Universidade de Campania Luigi Vanvitelli, em Itália, concluiu que, de 200 pessoas submetidas a cirurgia, quase 60% tinham microplásticos ou nanoplásticos numa artéria principal.

Entretanto, uma equipa da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo encontrou-os no cérebro de 8 de 15 pessoas falecidas. Os pedaços de plástico foram encontrados no bulbo olfativo, parte do cérebro que processa o olfato.





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