Projeto Eyven quer provar que o futuro da moda se faz com o que sobra



O projeto Eyven marca um novo capítulo na Ambitious. A marca portuguesa de calçado decidiu olhar para dentro e transformar sobras de produção em matéria-prima para o futuro. A ideia é simples, mas ambiciosa: “produzir melhor, não mais.”

“O principal desafio é estrutural: a indústria do calçado trabalha com cadeias de valor complexas, múltiplos materiais e processos intensivos em energia”, explica André Ribeiro, Diretor de Marketing da Ambitious em entrevista à Green Savers. É nesse contexto que nasce o Eyven, um projeto que, nas palavras do responsável, “obriga-nos a repensar decisões, envolver equipas e testar soluções que podem depois ser integradas em toda a empresa.”

A iniciativa dá nova vida a peles, têxteis técnicos, solas de borracha e outros materiais em fim de linha. “O Eyven nasce de uma convicção: o que sobra não deve ser deixado para trás”, sublinha. Cada par de sapatos resulta assim de matérias já existentes — “em vez de produzir novos materiais, usamos os que ficaram para trás” — reduzindo emissões, poupando recursos e evitando desperdício, esclarece.

“O Eyven não é uma campanha; é um projeto transversal que impacta gestão, produto, produção, comunicação e cultura interna”, afirma André Ribeiro. Com metas definidas até 2027, o projeto inclui a apresentação do primeiro Relatório ESG da Ambitious, consolidando métricas reais de redução de impacto. “Estamos a trabalhar para reduzir o número de referências, privilegiar materiais de ciclo longo e criar modelos de negócio que promovam reparação, reuso e revalorização de produto”, acrescenta. Para o diretor, sustentabilidade e estilo são plenamente compatíveis: “O Eyven provará que o design pode ser bonito, funcional e consciente”, refere.

A indústria do calçado é conhecida pelo seu impacto ambiental e social. Que desafios específicos enfrenta a Ambitious neste contexto?
O principal desafio é estrutural: a indústria do calçado trabalha com cadeias de valor complexas, múltiplos materiais e processos intensivos em energia. Na Ambitious, reconhecemos esse impacto — desde o consumo de matérias-primas à geração de desperdício em produção — e é precisamente por isso que assumimos a responsabilidade de agir. O desafio é equilibrar inovação, design e performance com práticas que reduzam a pegada global e promovam transparência em toda a cadeia.

Quando afirmam que fazem parte do problema, mas também da solução, que tipo de reflexão interna e transformação de processos isso implicou?
Implica olhar de frente para os nossos próprios processos e reconhecer que a mudança começa dentro de portas. Desde 2023, implementámos melhorias na eficiência energética, na gestão de resíduos e na seleção de materiais. Criámos o projeto Eyven precisamente como uma ferramenta de transformação: ele obriga-nos a repensar decisões, envolver equipas e testar soluções que podem depois ser integradas em toda a empresa.

O que motivou a criação do projeto Eyven e de que forma ele representa um ponto de viragem na abordagem da marca à sustentabilidade?
O Eyven nasce de uma convicção: o que sobra não deve ser deixado para trás. Ao longo dos anos, acumulámos matérias-primas em bom estado — peles, têxteis, solas e acessórios — que simplesmente não eram aproveitadas. O projeto surge para lhes dar uma nova vida, mas também para simbolizar uma mudança de mentalidade. Representa a passagem de uma abordagem pontual para uma estratégia contínua de circularidade e responsabilidade.

O Eyven baseia-se em princípios de economia circular. Que tipo de materiais estão a ser reaproveitados e transformados neste projeto?
Trabalhamos com materiais provenientes de sobras de produção e deadstock, tanto da Ambitious como de parceiros do setor têxtil. Reaproveitamos peles, camurças, têxteis técnicos, solas de borracha e outros componentes. Alguns são reintegrados diretamente nos nossos modelos (processo principal) e outros passarão por processos de reciclagem e reconversão, em parceria com empresas especializadas, como a Rubber Link.

Como explicariam aos consumidores o impacto real de um par de sapatos produzido com esta abordagem?
Economia circular significa que cada par nasce do que já existe. Ou seja, em vez de produzir novos materiais, usamos os que ficaram para trás. Isso reduz emissões, poupa recursos e evita desperdício. No caso do Eyven, cada produto é uma peça única, feita com quantidades limitadas de materiais reaproveitados, e isso dá-lhe não só valor ambiental, mas também uma identidade distinta. Quanto a métricas, temos uma equipa a trabalhar para num futuro breve disponibilizar todos os dados, live, ao público.

A inovação tecnológica tem um papel importante neste processo?
Sem dúvida. A inovação tecnológica é o motor que permite transformar ideias em processos operacionais. Como exemplo, investimentos em maquinaria de produção de alta eficiência (uma fábrica verdadeiramente 4.0), onde já começamos a ter os primeiros dados de eficiência com redução de até 15% em desperdícios de materiais — como o couro. Estes são dados provisórios, que iremos aprofundar e partilhar em 2026.

Como garantem que os produtos resultantes continuam a cumprir os padrões de qualidade e design pelos quais a Ambitious é reconhecida?
A Ambitious tem mais de 30 anos de know-how e um compromisso inegociável com qualidade e conforto. Todos os produtos Eyven passam pelos mesmos testes de durabilidade, acabamento e ergonomia dos restantes modelos. O desafio foi unir a estética contemporânea da marca com o uso de materiais reaproveitados, e o resultado mostra que é possível fazer bem, com bom design.

Como garantem que o projeto Eyven não é apenas uma ação de greenwashing, mas sim uma mudança estrutural real?
Transparência e governance. O Eyven não é uma campanha; é um projeto transversal que impacta gestão, produto, produção, comunicação e cultura interna. Temos uma equipa especializada a trabalhar na estratégia e metodologias de gestão, que irá alterar a forma como a empresa e os vários departamentos são geridos, permitindo também durante 2027 e nos anos seguintes estabelecer métricas anuais de redução de impacto efetivas e realistas.

A Ambitious está preparada para repensar o modelo de negócio?
Sim. Acreditamos que o futuro das marcas passa por produzir melhor, não mais. Estamos a trabalhar para reduzir o número de referências, privilegiar materiais de ciclo longo e criar modelos de negócio que promovam reparação, reuso e revalorização de produto. A inovação de produto deve andar lado a lado com inovação de mentalidade.

Sustentabilidade e estilo são mesmo compatíveis?
Absolutamente. O Eyven provará que o design pode ser bonito, funcional e consciente. O desafio está em repensar materiais e processos. Temos de ser realistas — a moda é e sempre será um ex-líbris de criatividade. Por isso, o nosso objetivo é unir a criatividade e a arte da moda a um produto mais reciclável, circular e consciente.

Como procuram envolver os consumidores nesta mudança de mentalidades?
Através da transparência e da partilha de bastidores. Mostramos processos, materiais, pessoas e decisões. O consumidor de hoje quer ver autenticidade e propósito — e o Eyven convidá-lo a fazer parte dessa narrativa, não apenas como comprador, mas como participante ativo na mudança.

Como conciliam o lançamento de novas coleções com o discurso de consumo consciente?
A resposta está na intenção e na durabilidade. Criar novas coleções não significa promover o descartável; significa evoluir, comunicar ideias e testar novos materiais. Queremos que cada coleção tenha uma razão de existir e que cada produto dure, tanto física como emocionalmente.

Que outras iniciativas estão a ser preparadas a curto e médio prazo?
Em 2025, lançaremos novas linhas Eyven, incluindo calçado e acessórios criados exclusivamente com sobras de produção. Em paralelo, em 2026 o programa Play Green vai ampliar a recolha e reciclagem de materiais com parceiros locais. Ainda em 2026/27, apresentaremos o primeiro Report ESG da Ambitious (Celita), consolidando métricas e compromissos de impacto real.

Qual é a visão da Ambitious para o futuro da moda e do calçado?
Acreditamos num futuro onde a estética e a ética coexistem. O calçado será cada vez mais circular, tecnológico e colaborativo, feito para durar e para ser reimaginado. Na Ambitious, queremos continuar a provar que a indústria portuguesa pode liderar pelo exemplo: com visão, qualidade e consciência.






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