Corrente do Golfo atinge nível mais fraco dos últimos 1.000 anos. Consequências extremas no clima na Europa, alertam cientistas



A corrente do Golfo atingiu o seu nível mais fraco em cerca de 1.000 anos, concluiu um estudo científico hoje divulgado, que alerta para as consequências extremas para o clima na Europa desta alteração no Atlântico.

“Nunca, em mais de 1.000 anos a circulação meridional do Atlântico (AMOC), também conhecida como sistema da corrente do Golfo, esteve tão fraca como nas últimas décadas”, indicam as conclusões da pesquisa desenvolvida por cientistas da Irlanda, da Grã-Bretanha e da Alemanha publicadas na revista Nature Geoscience.

O estudo analisou os chamados `dados proxy´ de sedimentos oceânicos, da temperatura da água e de núcleos de gelo com várias centenas de anos e, a partir desta informação, reconstruiu a evolução do fluxo da corrente, chegando a “provas consistentes” de que a sua desaceleração no século XX não tem precedentes no último milénio.

Os investigadores admitem que esta situação esteja ligada às alterações climáticas, refere ainda o estudo, ao salientar que a circulação atlântica é relevante para os padrões climáticos no continente europeu.

“O sistema da corrente do Golfo funciona como uma correia de transmissão gigante, transportando água quente da superfície do Equador para o norte e enviando águas profundas e frias de baixa salinidade para o sul. Move quase 20 milhões de metros cúbicos de água por segundo, quase cem vezes o fluxo do Amazonas”, explica Stefan Rahmstorf, do Instituto de Pesquisa do Impacto Climático de Potsdam, na Alemanha.

Segundo o investigador, as conclusões do estudo sugerem que a corrente tenha sido relativamente estável até final do século XIX, mas terá começado a perder intensidade de uma forma mais drástica a partir de meados do século XX.

O relatório especial de 2019 sobre os oceanos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) “já tinha identificado que a AMOC enfraqueceu em relação a 1850-1900″, lembra Stefan Rahmstorf, ao salientar que esta nova investigação “fornece mais provas independentes para essa conclusão e coloca-a num contexto paleoclimático de longo prazo”.

“Usamos uma combinação de três tipos diferentes de dados para obter informações sobre as correntes oceânicas: padrões de temperatura no Oceano Atlântico, propriedades de massa de água subterrânea e tamanhos de grãos de sedimentos do fundo do mar, datando de 100 a cerca de 1.600 anos”, explicou Levke Caesar, do departamento de pesquisa climática da Universidade de Maynooth, na Irlanda.

A desaceleração da AMOC já tinha sido prevista em modelos climáticos como uma resposta ao aquecimento global causado pelos gases de efeito estufa, que perturba as diferentes densidades da água que estão na origem da corrente.

Na prática, o aumento dos níveis de pluviosidade e o derretimento das camadas de gelo da Groenlândia adicionam água doce à superfície do oceano, o que reduz a sua salinidade e, consequentemente, a densidade da água, enfraquecendo o fluxo da AMOC.

Segundo Levke Caesar, para a Europa, uma desaceleração adicional poderá implicar eventos climáticos mais extremos, como uma mudança nas rotas das tempestades de inverno, que poderão ser mais intensas, assim como o surgimento de ondas de calor extremas ou uma diminuição do nível da chuva no verão.

“Se continuarmos a impulsionar o aquecimento global, o sistema da corrente do Golfo enfraquecerá ainda mais – 34% a 45% até 2100 -, de acordo com a última geração de modelos climáticos”, conclui Rahmstorf.





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