European Rivers Summit: as alternativas à construção de barragens



No último dia do European Rivers Summit 2021, a maior cimeira europeia sobre os rios, vários especialistas debateram as alternativas que existem à construção de barragens para produção de energia hidroelétrica, bem como é possível restaurar e proteger os rios. Existem vários exemplos de sucesso que comprovam os benefícios deste percurso, a nível nacional e internacional.

O painel “The Rise of Alternatives” teve como oradores Pao Fernández Garrido, da World Fish Migration Foundation e do movimento Dam Removal Europe, Dragana Mileusnic, da The Nature Conservancy, João Joanaz de Melo, professor da Universidade NOVA de Lisboa, Pedro Teiga da Universidade do Porto, e Mathias Kondolf da Berkeley University, em emissão online.

Pao Fernández Garrido da World Fish Migration Foundation, iniciou a sessão alertando para a existência de 1.2 milhões de barreiras ecológicas na Europa, que obstruem os rios e o seu natural decurso. Através de vários projetos, a organização tem vindo a lutar pela sobrevivência dos peixes migratórios nos rios de todo o mundo – sendo que mais de mil espécies precisam de proteção. Para que estes animais possam viver, é necessário que os rios sejam livres. A especialista dá a conhecer projetos como o “Amber”, que consiste num programa de ciência cidadã no qual as comunidades podem mapear as barreiras dos rios europeus através da app “Barrier Tracker”, ou como o movimento “Dam Removal Europe”, que já permitiu que fossem retiradas quase 5 mil barragens na Europa. São ainda dados alguns exemplos de países que atuam eficazmente neste sentido, inclusive através da legislação, como a Finlândia, a Espanha e a França. Para terminar, Pao Fernández Garrido sublinha que o problema da remoção de barragens não é a falta de investimento, porque esse existe, é exclusivamente a vontade política.

Em direito via emissão online, Mathias Kondolf, professor da Berkeley University, deu a conhecer vários projetos de sucesso onde rios presentes em áreas urbanas sofreram processos de renaturalização, idealmente projetados, a fim de os tornar livres e locais repletos de biodiversidade. O primeiro exemplo foi o rio Isar, em Munique, no qual foram retiradas rochas que o dividiam, o canal foi alargado para 90 metros e foi adicionado cascalho – o rio tornou-se dinâmico, com formas naturais, e ganhou alguns bancos de cascalho onde a população e a vida selvagem podem usufruir. Seguiu-se o exemplo do rio Sacramento, na Califórnia, e o do rio Aire, no qual se baseia a ideia pioneira de criar vários canais com terra, em formato de losango, e de o rio escolher qual o percurso que deve percorrer. O profissional termina sublinhando sempre que for possível, dê espaço ao rio e deixe-o em paz”, garantindo que desde que este seja fluído, sedimentos e espaço para se movimentar, é o ‘melhor designer de restauração’.

Por sua vez, Dragana Mileusnic, da The Nature Conservancy, deu a conhecer o trabalho da organização, que defende a proteção das terras e dos rios em mais de 70 países, envolvendo 400 cientistas e 3.600 conservacionistas. Na Europa, a prioridade da ONG está na região dos Balcãs Ocidentais. A sua ação passa pela Prevenção, para impedir impactos adversos, Proteção através de projetos nos locais, e Restauração, através da remoção de barreiras nos rios. No caso da prevenção, é dado o exemplo da Croácia, onde estão a promover o potencial de desenvolver energias renováveis como a solar e a do vento, que são ainda pouco utilizadas. Relativamente à remoção de barragens, conseguiram, em parceria com a WWF Adri, remover a primeira barreira na região no rio Vezišnica, em Montenegro. Alguns dos planos futuros para 2022 e 2023 passam pelo lançamento de um Kit de Ferramentas para a proteção dos ecossistemas de água doce, uma campanha para a proteção dos rios, e o apoio da remoção das primeiras barreiras nos Balcãs.

Na sua apresentação, o professor e investigador João Joanaz de Melo, referiu que existem sim alternativas às barragens hidroelétricas. Rios como o do Baixo Sabor e o Tua, que foram impactados pela construção deste tipo de construções, eram espaços de lazer, ecoturismo e de grande valor económico. No caso da Barragem do Baixo Sabor, foi necessário cortar várias árvores para que estas não emitissem posteriormente, ao decompor-se, metano. Outros dos efeitos negativos foi a perda de campos agrícolas e o desaparecimento do solo – que leva séculos a recuperar, alerta o especialista. Como tal, os maiores impactos resultantes destas barragens passam pela destruição dos ecossistemas, pela mudança profunda da paisagem e da identidade da região, e pelas perdas económicas dos habitantes locais. As alternativas passam assim, pelo uso mais eficiente da energia, pela substituição energética por fontes como a solar, a eólica e a geotermal, a criação de novos conceitos e de uma sociedade mais sustentável, e pela mudança dos hábitos da população, para um estilo de vida mais ecológico.

Para terminar, o especialista na recuperação dos rios Pedro Teiga, alertou para a necessidade das populações compreenderam a linguagem dos rios. “Existem 429 mil quilómetros de linhas de água em Portugal e todas elas têm uma linguagem própria”, explicou. No caso de Portugal, é preciso reformular a lesgilação e adicionar novas leis, no entanto, é também necessário cumprir primeiro as leis que existem para os rios. Um dos problemas no país é que os rios são privados, ou por proprietários ou pelos próprios Municípios em áreas urbanas. Pedro Teiga mostrou ainda que a E.RIO desde 2010 que tem desenvolvido vários projetos de reabilitação de rios no país, através de técnicas de engenharia natural e com a participação das comunidades. Já interviram em 90 Municípios de Portugal, envolvendo mais de 10 mil participantes, numa extensão de mais de 700 quilómetros. Destaca ainda a criação do PERLA – Planos Estratégicos de Reabilitação de Linhas de Água, à escala municipal, onde estão inseridos a Lei da Água, o Plano Nacional da Água e os Planos de Gestão de Região Hidrográfica. Por fim, destaca a importância dos laboratórios, onde toda a comunidade se envolve para proteger os rios livres.

O grande ponto assente entre todos os convidados é de que as barragens hidroelétricas são um mecanismo que impacta gravemente os ecossistemas de água doce, e que têm um benefício mínimo, comparativamente aos efeitos negativos que provocam.





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