Alterações climáticas e o olhar distópico do escritor Cynan Jones deram em “Estilicídio”



“Estilicídio”, o novo romance de Cynan Jones, publicado este mês, passa-se num futuro próximo, em que mudanças climáticas extremas mergulham o Reino Unido em ciclos alternados de cheias e secas, antevendo um cenário mais provável do que imaginário.

“Situada num futuro talvez mais provável do que imaginário, ‘Estilicídio’ é uma história de amor e perda, assim como a história de sobrevivência do nosso próprio mundo”, destaca a editora Elsinore, que já publicou do mesmo autor os romances “Aquilo que encontrei na praia” e “A baía”.

Esta nova obra do autor galês interliga 12 histórias escritas originalmente para a BBC Rádio 4, cada uma com a duração máxima de 15 minutos de tempo de leitura.

Cynan descreve, com uma prosa minimalista, poética e dramática, um mundo distópico em que alterações climáticas são um facto, e onde, neste futuro cada vez mais presente, há lugar para o ódio, o conflito, a sobrevivência, o desespero e o amor.

No centro das histórias está a água, cada vez mais escassa, ao ponto de se tornar um produto de luxo.

Tudo acontece num futuro próximo, quando alterações climáticas extremas mergulharam o Reino Unido num ciclo alternado de cheias e secas. Como as temperaturas continuam a subir, as comunidades rurais mais pequenas tornam-se insustentáveis, enquanto a logística de alimentação e rega, da crescente população da cidade, passou a dominar a agenda económica.

As antigas condutas de fornecimento foram destruídas e o risco de assalto ao comboio da água que serve a cidade é cada vez maior. As ruas enchem-se de protestos depois de anunciada a construção de uma doca de gelo gigantesca, obra que desalojará um maior número de pessoas do que o inicialmente previsto.

Estes são os acontecimentos que, de um modo ou de outro, acabam por ligar a vida de vários estranhos: uma enfermeira prestes a ter um caso amoroso; um rapaz em busca do seu irmão, por sua vez à procura de um cão vadio fora dos limites da cidade; uma mulher moribunda e o seu marido, um segurança do Comboio, dividido entre viver ou desistir, perseguido pelo passado e receoso do futuro.

“Situada num futuro talvez mais provável do que imaginário, ‘Estilicídio’ é uma história de amor e perda, assim como a história de sobrevivência do nosso próprio mundo”, descreve a editora.

A génese de “Estilicídio” foi invulgar. Num posfácio, o autor conta como há muito o universo imaginado para estas histórias lhe vinha ocupando a mente, para um livro a escrever, mas foi o convite da Rádio 4 que finalmente deu vida ao projeto.

“Sempre que pensava em ‘Estilicídio’, imaginava-o sob a forma de um conjunto de narrativas interligadas que se reunissem num fundo comum à medida que as histórias fossem vertidas para o papel”.

Por isso, pareceu-lhe “apropriado” para aquilo que era a proposta da rádio: criar uma sequência de 12 contos, cada um exigindo exatamente 15 minutos de tempo de antena, com a série a ser transmitida na sua totalidade antes da publicação impressa.

Foi assim que o livro teve início, num processo que foi acompanhado pela Granta desde o primeiro momento.

No entanto, havia parâmetros que o autor tinha de seguir, desde logo a necessidade de as historias funcionarem enquanto unidades autónomas, mas que traduzissem um todo maior, obedecer às restrições que uma leitura de 15 minutos impõe, e serem dotadas de um tom que se adequasse a um programa radiofónico de domingo à tarde.

“Porque se destinava à rádio e os ouvintes não tinham maneira de voltar atrás na leitura, o universo e as suas personagens tinham de ser imediatos e claros à primeira audição”, explica Cynan Jones na nota final do livro.

No entanto, a experiência de ler e ouvir estes contos pode ser bem distinta. Segundo o jornal The Guardian, na sua forma escrita, “Estilicídio” tem uma qualidade polida e minimalista que se deve, pelo menos em parte, à forma como o texto é apresentado na página, com parágrafos curtos e um espaçamento de linhas que induzem a leitura do romance como uma série de poemas em prosa, tornando a narrativa secundária à forma, e os efeitos estéticos maiores do que os dramáticos”.

Já a série de leituras na Rádio 4 revela um lado diferente do romance: mais duro, mas mais imediato e orientado para a narrativa, com as vozes das personagens a assumirem maior peso e personalidade, acrescenta o jornal.

“Estilicídio” pode ser acrescentado à lista crescente de meditações poderosas e urgentes sobre o futuro”, escreve o The Guardian que considera esta obra “uma poderosa e urgente visão do futuro”.

Cynan Jones nasceu no País de Gales, em 1975. Em português tem ainda publicado “A Cova”, pela Cavalo de Ferro, outra chancela do grupo editorial 2020, que detém a Elsinore.

Considerado pela crítica como um dos mais talentosos escritores de língua inglesa da atualidade, as suas obras estão publicadas em vários países.





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