Governos da UE chegam a acordo sobre Lei de Restauro da Natureza. Mas nova versão do texto motiva críticas
Na manhã desta terça-feira, os ministros do ambiente da União Europeia chegaram a um acordo sobre a uma abordagem geral à proposta de Lei de Restauro da Natureza, que pretende recuperar e proteger os ecossistemas terrestres e marinhos degradados da região.
A proposta inicial foi apresentada 22 de junho do ano passado pela Comissão Europeia, e previa metas vinculativas para, por exemplo, o restauro de pelo menos 20% das áreas marinhas e 20% das terrestres degradadas da UE até 2030, estendendo-se a todas a que precisariam dessas intervenções até 2050.
O objetivo central, em linha com a Estratégia da UE para a Biodiversidade, é que até ao final desta década, pelo menos 30% do total conjunto dos habitats terrestres, costeiros, marinhos e de água doce atualmente com algum nível de degradação passem a estar em boas condições.
Contudo, algumas vozes têm demonstrado a sua oposição à diretiva europeia, tendo na semana passada o Partido Popular Europeu (PPE), grupo do Parlamento Europeu, ter apresentado uma moção para a retirada do texto, que acabou por ser rejeitada pelos eurodeputados.
A proposta agora aprovada pelos ministros do ambiente no Conselho da UE é uma versão aligeirada da que tinha sido avançada à quase exatamente um ano. Por exemplo, ao nível dos ecossistemas urbanos, o texto inicial previa metas quantitativas para a criação de espaços verdes, estabelecendo um aumento mínimo de 3% face à área urbana total até 2040 e de 5% até 2050. Agora é apenas exigida aos Estados-membros “uma tendência de aumento dos espaços verdes até que seja alcançado um nível satisfatório”.
Outra alteração introduzida pelo Conselho tem a ver com a recuperação das turfeiras, área de grande importância não apenas para a biodiversidade, mas também para o sequestro de carbono. O texto inicial propunha o restauro de, no mínimo, 30% das turfeiras drenadas até 2030, 50% até 2050 e 70% até 2050, mas, depois das negociações, a meta de 50% foi adiada para 2050.
Quanto às obrigações de restauro, a primeira proposta previa a obrigação de recuperação de pelo menos 30% da área total degradada de cada tipo de habitat (costeiro, marinho, de água doce e terrestre), mas a nova versão do texto prevê agora que essa percentagem seja referente à área total do conjunto desses habitats. Ou seja, em vez de os Estados-membros serem obrigados a recuperar um mínimo de 30% de cada um desses tipos de habitats, são obrigados agora a recuperarem 30% do conjunto até 2030.
Ainda assim, os países, diz o Conselho, devem implementar medidas que visem o restauro até 2040 de pelo menos 60% das áreas degradadas de cada um dos tipos de habitat, e de 90% até 2050.
Outra modificação prende-se com as energias renováveis e infraestruturas associadas. O Conselho da UE decidiu incluir um novo artigo na proposta legislativa que declara que “o planeamento, construção e operação de centrais para produção de energia de fontes renováveis”, bem como as suas ligações à rede e estruturas de armazenamento estão dotadas de um “interesse público” que se deve sobrepor a quaisquer medidas de restauro dos ecossistemas e habitats, explica comunicado do Conselho.
Dessa forma, esses projetos estariam isentos, nas áreas da sua implementação, das “obrigações de contínua melhoria e não-deterioração”, e o texto agora em cima da mesa desobrigaria os Estados-membros de exigirem aos promotores desses projetos que “demonstrem que estão disponíveis alternativas menos prejudiciais” para a natureza.
Sobre as questões do financiamento destas medidas de restauro, o Conselho optou por incluir uma nova provisão que requer que a Comissão Europeia elabora e divulgue, um ano após a entrada em vigor desta lei, um relatório no qual mostre os recursos financeiros disponíveis ao nível comunitário para apoiar os Estados-membros da implementação das obrigações.
Um bom começo mas aquém do desejado
Romina Pourmokhtari, ministra do ambiente e clima da Suécia, atualmente na presidência rotativa do Conselho da UE, acredita que “hoje é um bom dia para a natureza” e que o compromisso alcançado é o “equilíbrio certo” entre as preocupações e interesses dos Estados-membros e os objetivos europeus para a conservação dos ecossistemas e da biodiversidade.
A BirdLife International, em comunicado, salienta que, embora os Estados-membros tenham reconhecido a necessidade de restaurar a natureza e a importância do financiamento para se alcançarem os objetivos pretendidos, “eles também enfraquecerem significativamente o nível de ambição da proposta”.
A organização remete agora para a presidência espanhola do Conselho da UE, que começará no próximo dia 1 de julho, a tarefa de “defender um resultado ambicioso para a Lei de Restauro da Natureza”, devendo tomar o acordo hoje alcançado como “um mínimo” que deve ser cumprido e evitando ainda mais alterações que retirem força à proposta.
Numa publicação publicada na rede social Twitter, a Greenpeace EU, por seu lado, apesar de saudar o acordo, alerta que os ministros do ambiente do Conselho da UE inseriram “exceções prejudiciais” à proposta, destacando os setores da agricultura, da indústria florestal e da produção de energia renovável.
📢 BREAKING: EU #RestoreNature law gets through #ENVI @EUCouncil
But ministers carve out damaging exemptions for:
🐄 Agriculture
🪚 Forest industry
⚡️ Even renewable energyWe should be tackling nature & climate crises hand in hand
👀 Next, all eyes on @EP_Environment pic.twitter.com/LPTCGxwOxo
— Greenpeace EU (@GreenpeaceEU) June 20, 2023
Também Ioannis Agapakis, da ClientEarth, uma instituição dedicada ao direito ambiental, lamenta que “a posição do Conselho enfraquece a proposta inicial de tal forma que desintegra algumas das principais obrigações e subjuga o restauro a outros usos do solo e do mar”.
A especialista considera que a decisão hoje alcançada “desintegra o papel indispensável da biodiversidade no combate a multiplicas crises, incluindo a climática, que a União Europeia está atualmente a enfrentar”.
Sergiy Moroz, da rede europeia de organizações ambientalistas European Environmental Bureau, pede que a presidência espanhola do Conselho da UE ouça as exigências dos cidadãos, dos cientistas, das organizações da sociedade civil e “de um grande número de empresas” e que não permita um ainda maior enfraquecimento da proposta legislativa.
Esta mais recente versão do texto será apresentada ao Parlamento Europeu, servindo de base às negociações entre os órgãos da UE. Eamon Ryan, ministro irlandês do ambiente espera que a lei possa ser oficialmente aprovada até ao final deste ano.
Good news, a general approach to the Nature Restoration Law has just been agreed at the Environment Council. If it can now be supported in the European Parliament we can enter into further negotiations and get the law in place before the end of the year. #RestoreNature pic.twitter.com/6Hmxm67xpT
— Eamon Ryan (@EamonRyan) June 20, 2023