Investigadores criam gel que se pode auto-regenerar como a pele humana

Todos nós encontramos géis na vida quotidiana – desde as substâncias macias e pegajosas que colocamos no cabelo até aos componentes gelatinosos de vários alimentos. Embora a pele humana partilhe caraterísticas semelhantes às do gel, tem qualidades únicas que são muito difíceis de reproduzir. Combina uma elevada rigidez com flexibilidade e tem uma capacidade de auto-cura notável, muitas vezes cicatrizando completamente no espaço de 24 horas após uma lesão.
Até à data, os géis artificiais conseguiram reproduzir esta elevada rigidez ou as propriedades de auto-regeneração da pele natural, mas não ambas. Agora, uma equipa de investigadores da Universidade de Aalto e da Universidade de Bayreuth é a primeira a desenvolver um hidrogel com uma estrutura única que ultrapassa as limitações anteriores, abrindo a porta a aplicações como a administração de medicamentos, a cicatrização de feridas, sensores robóticos macios e pele artificial.
No estudo inovador, os investigadores adicionaram nanofolhas de argila específicas, excecionalmente grandes e ultrafinas, aos hidrogéis, que são normalmente macios e moles. O resultado é uma estrutura altamente ordenada com polímeros densamente emaranhados entre as nanofolhas, não só melhorando as propriedades mecânicas do hidrogel, mas também permitindo que o material se auto-regenere.
A investigação foi publicada na prestigiada revista Nature Materials.
Cura através de ‘emaranhamento’
O segredo do material reside não só na disposição organizada das nanofolhas, mas também nos polímeros que estão emaranhados entre elas – e num processo que é tão simples como cozer. O investigador de pós-doutoramento Chen Liang misturou um pó de monómeros com água que contém nanofolhas. “A mistura foi depois colocada sob uma lâmpada UV – semelhante à utilizada para fixar verniz de unhas em gel. A radiação UV da lâmpada faz com que as moléculas individuais se unam de modo a que tudo se torne um sólido elástico – um gel”, explica Liang.
O emaranhamento significa que as finas camadas de polímero começam a torcer-se umas às outras como pequenos fios de lã, mas numa ordem aleatória”, acrescenta Hang Zhang, da Universidade de Aalto. “Quando os polímeros estão completamente emaranhados, são indistinguíveis uns dos outros. São muito dinâmicos e móveis a nível molecular e, quando os cortamos, começam a entrelaçar-se novamente”.
Quatro horas após o corte com uma faca, o material já está 80 ou 90 por cento auto-reparado. Ao fim de 24 horas, está normalmente completamente reparado. Além disso, um hidrogel com um milímetro de espessura contém 10.000 camadas de nanofolhas, o que torna o material tão rígido como a pele humana e lhe confere um grau comparável de elasticidade e flexibilidade.
Há muito que os hidrogéis rígidos, fortes e auto-regeneráveis constituem um desafio. Descobrimos um mecanismo para reforçar os hidrogéis convencionalmente moles. Isto poderá revolucionar o desenvolvimento de novos materiais com propriedades bio-inspiradas”, afirma Zhang.
Inspirar-se na natureza
Este trabalho é um exemplo interessante de como os materiais biológicos nos inspiram a procurar novas combinações de propriedades para materiais sintéticos. Imaginemos robôs com peles robustas e auto-reparadoras ou tecidos sintéticos que se reparam autonomamente”, afirma Olli Ikkala, da Universidade de Aalto. E mesmo que ainda haja algum caminho a percorrer até à aplicação no mundo real, os resultados atuais representam um salto fundamental. É o tipo de descoberta fundamental que pode renovar as regras da conceção de materiais”.