Um ano de presidência de Lula: Analistas apontam avanços e contradições nas políticas ambientais no Brasil



Especialistas ouvidos pela Lusa consideraram que a política para o meio ambiente avançou no primeiro ano de Governo no terceiro mandato do Presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, mas ainda enfrenta grandes desafios e contradições.

Beto Mesquita, membro do Grupo Estratégico da Coalizão Brasil e diretor de Florestas e Políticas Públicas da BVRio destacou que a política ambiental no Brasil caminha para uma direção melhor e citou três aspetos.

O primeiro deles é o reconhecimento de um esforço do Governo que já trouxe alguns resultados para tentar recompor o sistema de gestão ambiental federal e a sua articulação com os estados no que se refere a fiscalização, controlo e planeamento de estratégias para a implementação da legislação e da gestão ambiental, que foram bastante afetadas no Governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022).

“Houve principalmente ao longo do primeiro semestre um esforço de recompor essas estruturas, de rearticular esses sistemas e os órgãos públicos de gestão ambiental. Eu acho que o Governo atual tem sido bem-sucedido nesse esforço”, avaliou o especialista.

“Um exemplo do que está a ser obtido é a redução da desflorestação da Amazónia”, acrescentou, referindo-se à queda de 50,5% na destruição da floresta entre janeiro a novembro, segundo dados preliminares do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

O segundo aspeto mencionado por Beto Mesquita é a participação da sociedade na gestão ambiental brasileira.

O analista explicou que o terceiro ponto da política ambiental no primeiro ano da gestão de Lula da Silva, que se assinala em 01 de janeiro de 2024, é o mais incerto já que ainda não se sabe “para que lado vai exatamente este Governo no que se refere à agenda de investimentos e ao condicionamento dos investimentos na área climática e ambiental e social”.

Já Rodolfo Salm, professor de Ecologia na Faculdade de Biologia na Universidade Federal do Pará, entende que o Brasil saiu de uma situação em que havia “um Governo [do ex-Presidente Bolsonaro] que estava deliberadamente a quer desflorestar, substituir a floresta pelo pasto e pela mineração” para o Governo Lula da Silva, que não tem a desflorestação como um projeto, mas considerou que “existe uma distância muito grande entre o discurso e as ações”.

“Se olharmos os números de incêndios florestais e desflorestação percebemos que houve uma queda que nos levou à situação pré-Bolsonaro (…) No entanto, para enfrentar essas questões é necessário confrontar o agronegócio, o que o atual Governo aparentemente não faz. O Governo de Lula da Silva está a contentar-se com a redução da desflorestação na Amazónia e apresenta isso como uma grande vitória, quando na verdade, não é”, salientou.

Outro problema mencionado por Palm é o avanço de políticas como o Marco Temporal, uma tese jurídica que limita a demarcação de terras indígenas aprovada no Parlamento brasileiro, que foi vetada por Lula da Silva e reestabelecida novamente pelos parlamentares que contrariaram o veto do Presidente brasileiro.

“A questão do Marco temporal foi resolvida de uma forma muito perigosa. O Governo parece estar sempre a ceder nesta questão, permitindo o desenvolvimento de atividades económicas que têm um potencial muito perigoso, muito destrutivo nas terras indígenas que são os grandes pilares da conservação da biodiversidade”, avaliou Palm.

O professor da Universidade Federal do Pará referiu, porém, que também há coisas positivas na gestão ambiental citando o regresso de uma atuação mais rigorosa do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a participação de indígenas em postos de destaque no Governo.

Os dois especialistas manifestaram preocupação em relação à execução de um plano de conservação do cerrado, um bioma que ocupa o centro-oeste brasileiro onde nascem oito das doze principais bacias hidrográficas do país, que teve os níveis de destruição acelerados em 2023.

Mesquita, por sua vez, também reconheceu problemas no que se refere à política externa do Brasil que tenta colocar-se como um dos líderes da discussão ambiental internacionalmente ao mesmo tempo em que considera abrir novas frentes de exploração de combustíveis fósseis, inclusive em regiões extremamente sensíveis e vulneráveis do ponto de vista ambiental e social como a foz do rio Amazonas e o arquipélago de Fernando de Noronha.

“Isso é uma inconsistência (…) Não acho que o Brasil deva interromper a sua estratégia de produção de petróleo e gás nesse momento, mas se quer liderar pelo exemplo a agenda climática precisa escolher de maneira muito criteriosa e condicionar a sua operação de petróleo e gás a uma agenda claramente de transição”, referiu o investigador.

“Parece-me uma estratégia muito acertada este foco no debate climático, pelas condições que o Brasil tem (…) Acho que o Brasil está no caminho certo em tentar esse protagonismo, mas tem de ter elementos de substância para isso porque vai ser cobrado por eventuais incoerências internas”, concluiu.

Este é o primeiro ano do terceiro mandato de Lula da Silva, que esteve antes no poder entre 2003 e 2011.





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